Depois de uma semana de chuvas intensas e muita destruição, o Rio Grande do Sul pode novamente ser alvo de uma grande tempestade, com direito a ventos de 100 km/h e granizo. O alerta dado pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), nesta segunda-feira, 6, traz uma ameaça de aumento da tragédia gaúcha. Já somam 336 cidades em estado de calamidade pública. O aeroporto de Porto Alegre está fechado, sem condições de operar. A rodoviária também ficou de baixo d’água e viagens foram canceladas. Até o momento 134 pessoas estão desaparecidas e pelo menos 85 morreram. Há 435 mil casas sem luz e 884 mil, sem água. Esse é o maior desastre ambiental já registrado na história do estado.
Mas por que as chuvas se concentram apenas no Rio Grande do Sul? “Essa temporada de chuvas extremas foi uma combinação do El Niño com mudanças climáticas”, diz Regina Rodrigues, professora de Oceanografia e Clima da Universidade Federal de Santa Catarina. Desde que surgiu, no meio do ano passado, o evento climático com nome de criança intensificou muito as condições do tempo no Brasil e no mundo. Em outubro, antes do El Niño atingir o ápice, o país viu os termômetros baterem os 40 graus, causando seca na Amazônia, com incêndios, rios sem profundidade para navegação, e morte de animais. Um mês antes, o Rio Grande do Sul também era castigado pelo excesso de chuva. Nos primeiros 19 dias, as precipitações chegaram a 450 milímetros. A média história para a época é de 70 a 150 milímetros.
Os especialistas sabem que é justamente início e no final do El Niño tem efeitos mais devastadores. “Normalmente os cientistas avisam à defesa civil, mas nem sempre isso resulta em políticas de prevenção”, diz Regina. Institutos internacionais do clima chegaram a anunciar o fim do El Niño. Ele pode até ter acabado no Oceano Pacífico – fato que causa controvérsia entre climatologistas –, mas os efeitos ainda são sentidos nos continentes.
Somada a isso, o estado é o ponto de onde partem as ondas frias que geralmente se espalham pelo território brasileiro. O Rio Grande do Sul está no meio do caminho da área tropical e o frio da área polar. Por este contraste térmico, ora está sob influência do ar muito quente, ora, muito frio. “Essa briga entre o ar frio e o ar quente forma os principais fenômenos, que modificam o tempo em toda América do Sul, como as frentes frias e os ciclones extratropicais”, diz Etael Sias, da Metsul. As ondas de frio que nascem ali impactam todo o Brasil. Nesse momento, um grande bloqueio de massa de ar quente e seco atua por semanas sobre o Centro-Oeste e Sudeste, desviando todo canal de umidade da Amazônia para o Rio Grande do Sul. O bloqueio também impede que as frentes frias que se formam no estado se espalhem pelo país. “A região está estrangulada entre a massa fria e quente. Daí as chuvas intensas.”