Nem tudo são flores: o impacto do aquecimento global em polinizadores
Pesquisadores simularam condições de mudanças climáticas para analisar os efeitos nas relações entre insetos e flores silvestres
As mudanças do clima vão gerar impactos nas relações ambientais de todas as proporções: desde o derretimento de geleiras até a sobrevivência de insetos. De acordo com estimativas do IPCC, órgão da ONU que analisa centenas de estudos científicos e elabora relatórios sobre mudanças climáticas, a temperatura média global vai aumentar entre 0,9ºC e 2,0ºC até a metade deste século. Consequentemente, muitas espécies, principalmente aquelas com necessidades específicas com relação a alimentos, habitat e reprodução, não vão conseguir se adaptar.
Atualmente, cerca de 35% das plantações dependem de insetos para a polinização. Em um cenário de mudança do clima, é preciso compreender melhor quais serão os impactos nos insetos e nas flores silvestres das quais eles dependem para se alimentar. O objetivo é ter cada vez mais informações qualificadas para desenvolver estratégias de mitigação para os efeitos negativos do aquecimento global nas produções agrícolas.
Pesquisadores da Universidade Newcastle, no Reino Unido, conduziram o primeiro estudo que mostra, de forma experimental, os efeitos imediatos da mudança do clima no processo reprodutivo de flores silvestres e na cadeia alimentar de plantas e polinizadores. De acordo com a autora principal do estudo, a cientista Ellen D. Moss, “o aumento de 1,5ºC na temperatura pode reduzir drasticamente os recursos alimentares para insetos polinizadores, o que os levará a buscar uma gama maior de plantas em busca de comida e a reduzir a produção de sementes para algumas flores”.
Para fazer o experimento, os autores simularam o aquecimento global em uma estação de pesquisa agrícola no Reino Unido e compararam os dados de 2014 e 2015. A temperatura ambiente ficou, constantemente, 1,5ºC acima da média. Em algumas regiões da Europa, a previsão é que a mudança do clima irá aumentar os índices de chuvas. Por isso, os locais do estudo foram irrigados com mais água para comparar os resultados.
Os pesquisadores observaram 25 espécies de plantas e 80 espécies de insetos em 2014, e 19 espécies de plantas e 69 espécies de insetos em 2015. Os efeitos imediatos do experimento foram sutis – a maioria das espécies de plantas foram consideradas “perdedoras” com relação à reprodução no contexto de aumento da temperatura, pois houve redução no número de flores e de sementes.
De acordo com os cientistas, o experimento mostrou que no cenário de aumento de 1,5ºC, houve perda de quase 40% nas unidades de flores, o que representa redução significativa na disponibilidade de alimentos para os polinizadores. “Nossos resultados demonstram que o aquecimento do planeta pode ter consequências severas para algumas espécies de flores silvestres e seus polinizadores nos sistemas agrícolas. Isso mostra que a composição da comunidade provavelmente mudará no futuro”, disse Moss.
Segundo o co-autor e professor de ecologia e conservação da Universidade Newcastle, Darren Evans, os resultados mostram como o aquecimento global afeta plantas que não são cultivadas e como espécies consideradas como ervas daninhas sustentam importantes comunidades de insetos polinizadores. “Além disso, ter uma melhor compreensão sobre como o aquecimento global afeta as ações diretas e indiretas de uma rede mais completa de interações de espécies nos permitirá adaptar melhor os sistemas agrícolas em um mundo em transformação”.