Fortaleça o jornalismo: Assine a partir de R$5,99
Continua após publicidade

Novos estudos resgatam o papel crucial das plantas na preservação do planeta

Eles reforçam seu valor para a sobrevivência da espécie humana

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 18 ago 2024, 08h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • O escritor e filósofo alemão Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) escreveu romances consagrados como Fausto e ensaios sobre botânica. Em sua obra A Metamorfose das Plantas (1790), Goethe afirma que elas são a base da qual todas as outras formas de vida dependem. O naturalista ressalta o papel crítico desses seres como produtores primários, convertendo energia solar em química por meio da fotossíntese, um processo que dá origem a diversas cadeias alimentares e ecossistemas. Essa perspectiva não mudou, embora os humanos tenham, ao longo da história, menosprezado o efeito benéfico das plantas para o planeta. Mas isso começa a ganhar novos contornos.

    Estudos recentes mostram que as plantas representam cerca de 80% da biomassa da Terra (peso total de organismos vivos no planeta), enquanto os animais respondem por modesto 0,4%. “Paradoxalmente, a pesquisa científica inverte essa proporção: a maioria dos estudos foca em animais, negligenciando outras espécies”, disse a VEJA o biólogo italiano Stefano Mancuso, autoridade mundial em botânica e um dos principais responsáveis pelo resgate histórico das plantas. “Esse desequilíbrio nos impede de compreender como a vida funciona e nos cega para as extraordinárias soluções que as plantas oferecem.”

    A cegueira se estende por outros campos da vida. Segundo Mancuso, as sociedades foram concebidas a partir da estrutura animal. O modelo hierárquico e piramidal das organizações humanas reflete a lógica dos animais, sempre com um líder no topo. A estrutura das plantas, por outro lado, é mais moderna e democrática, com funções descentralizadas e distribuídas. “É um vício do ser humano ignorar as leis naturais”, diz Mancuso. “Estamos seguindo um caminho que nos afasta das práticas comunitárias estabelecidas ao longo de milhares de anos de história humana e das leis fundamentais da natureza.”

    As plantas têm uma extraordinária capacidade de criar comunidades. Quando entramos em florestas como a Amazônica ou a Mata Atlântica, o que vemos não são bilhões de árvores individuais, mas uma sociedade interligada por sublimes conexões. Quando uma planta não tem o que precisa para viver, as outras fornecem os recursos necessários. Essas comunidades são o aspecto mais eficiente que a evolução produziu na natureza para garantir a sobrevivência das espécies, permitindo que resistam por dezenas ou centenas de milhares de anos.

    Nesse sentido, a riqueza vegetal brasileira tem papel preponderante no combate às mudanças climáticas e ao aquecimento global, talvez mais do que qualquer outra nação. O Brasil abriga a maior floresta do planeta, um dos últimos lugares capazes de absorver grandes quantidades de dióxido de carbono. “A preservação da Floresta Amazônica é crucial para o clima de todo o planeta”, afirma o biólogo italiano. “Se a Amazônia mudar, o planeta inteiro mudará.”

    Continua após a publicidade

    As plantas são vitais porque, afinal, tornam a vida possível. “A fotossíntese, embora fundamental, ainda não é totalmente compreendida pela ciência”, afirma Mancuso. “Se pudéssemos replicar sua eficiência, teríamos assegurado uma fonte de energia limpa e praticamente infinita.” Por isso, aumentar o estudo sobre a extraordinária riqueza das plantas não apenas ampliará o conhecimento humano, mas contribuirá para a preservação de nossa própria existência.

    O futuro das cidades é verde

    ATIVISTA - Mancuso: urbanização trouxe benefícios, mas muitos reveses
    ATIVISTA - Mancuso: urbanização trouxe benefícios, mas muitos reveses (Leonardo Cendamo/Getty Images)

    O biólogo italiano Stefano Mancuso, 59 anos, é conhecido por desafiar as visões tradicionais sobre as plantas e promover uma compreensão mais profunda de suas capacidades de manter vivo o planeta Terra. Autor de Revolução das Plantas (2017) e de Nação das Plantas (2020), o professor da Universidade de Florença e fundador do Laboratório Internacional de Neurobiologia Vegetal tem um novo livro no prelo, Fitopolis, la Città Vivente, (Fitópolis, a cidade viva), ainda sem edição brasileira. Na obra, Mancuso defende cidades mais integradas com a natureza e as espécies vegetais.

    O que pode falar sobre sua nova obra, Fitopolis, la Città Vivente? O livro imagina o futuro das cidades do ponto de vista do que as plantas poderiam oferecer. Como a maioria da população mundial vive em centros urbanos que são insustentáveis, ele explora como podemos integrar melhor a vegetação nas cidades para torná-las mais habitáveis e sustentáveis. As plantas têm inteligência e capacidades que muitas vezes subestimamos, e podemos aprender muito com elas para aprimorar a vida urbana. Há no mundo exemplos de iniciativas inovadoras, como as realizadas na cidade de Curitiba pelo ex-prefeito Jaime Lerner.

    Continua após a publicidade

    Por que é importante repensar as cidades do ponto de vista da sustentabilidade? A urbanização é uma das grandes revoluções da humanidade que passou despercebida. Hoje em dia, mais de 80% da população nas Américas e na União Europeia vive em cidades, que representam menos de 2% do território do planeta. As cidades são responsáveis por 75% das emissões de dióxido de carbono, 70% dos poluentes e consomem 80% dos recursos. Portanto, é crucial transformá-­las em algo diferente e mais sustentável, integrando, de uma forma mais equilibrada, a natureza e as plantas ao ambiente urbano.

    Como o senhor vê o futuro da relação entre seres humanos e plantas? Tenho visto uma mudança positiva nas últimas duas ou três décadas. Atualmente, há um número cada vez maior de pessoas que entendem que a perda de conexão com a natureza é uma das questões mais perigosas para a nossa própria sobrevivência. Felizmente, a relação entre humanos e plantas está mudando. Conceitos como a capacidade das plantas de sentir estão se tornando mais comuns. Acredito que, no futuro próximo, haverá direitos para as plantas, pois tudo que é vivo merece isso.

    Publicado em VEJA de 16 de agosto de 2024, edição nº 2906

    Publicidade
    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo
    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

    a partir de 39,96/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.