As queimadas não dão trégua na Amazônia e se agravam em 37 municípios. Levantamento do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe) detectou mais de 100 focos nessas regiões em apenas uma semana. No Pará, a situação é mais alarmante, principalmente em São Félix e Altamira, com 1 443 e 1 102 pontos de fogo, respectivamente, de acordo com a Agência Brasil. E a situação pode piorar ainda mais devido às condições climáticas. A previsão é de setembro ser o mais quente da história do Brasil. As temperaturas máximas devem chegar a 45° em grande parte do território nacional. Com a baixa umidade prevista para a primeira quinzena, o ambiente fica ainda mais propício para as queimadas. Na última sexta-feira, Flávio Dino, ministro do Supremo Tribunal Federal, deu 15 dias para uma atuação mais efetiva no maior bioma brasileiro. “O governo federal sozinho não dá conta de conter o fogo, mesmo com os reforços autorizados”, disse Wendell Andrade, especialista em políticas públicas para a Amazônia do Instituto Talanoa à VEJA. “Os governos regionais não se empenham na contenção ao desmatamento, nem ao fogo.” Abaixo, o bate-papo com o especialista, que critica o alinhamento do norte do país com uma direita que comemora o fato de a mais importante vitrine da política ambiental do governo estar em chamas.
O que o senhor acha da atuação do governo para deter as queimadas? O governo federal tem feito o que pode, inclusive com a mobilização de recurso extra, nas últimas semanas. Já tínhamos percebido isso por causa da Amazônia e do Pantanal em maio e junho. Por outro lado, os governos locais, apesar de terem decretado estado de emergência, principalmente na Amazônia e mais recentemente no Pará, não mostram empenho na contenção do fogo, nem do desmatamento. Há um alinhamento desses governos com à direita. Muitas queimadas são motivadas por questão ideológica, de alinhamento dos governos regionais com uma visão retrógrada do meio ambiente, principalmente em Rondônia, Acre, Amazonas. Há governos e governos, com interesses bem diferentes.
O que o senhor achou da determinação do ministro Flavio Dino? No dia que o ministro Dino deu prazo para o governo federal agir, saiu uma portaria do Ibama no Diário Oficial que aumenta o quantitativo de brigadistas nos estados da Amazônia Legal. Isso já é uma resposta das intenções do governo federal. Esse governo tem feito um trabalho estruturante, que inclui o reconhecimento de território quilombola, a criação de unidades de conservação e a reorganização institucional para recuperar a reputação das entidades perdida no governo anterior.
Como entra o agronegócio nesse processo de destruição da Amazônia Legal? Pelo menos aqui, em Belém, eu tenho críticas à postura do agro, que não é um setor homogêneo. Sabemos que tem o agro sério, que realmente está preocupado com produtividade, com a reputação diante do mercado externo e do consumidor. Mas há também uma ala retrógrada, ironicamente chamada de “ogronegócio”. A ala moderna precisa se posicionar de maneira veemente em relação ao agro, que tem um movimento forte de destruição. O agro que quer trabalhar de forma sustentável tem que combater esse agro do passado.