Outro dia, conversando com uma biomédica cujo filho sempre esteve um pouco acima do peso, ouvi que o menino havia engordado durante o confinamento na pandemia. Ele não tinha como frequentar academias. Mesmo que estivessem abertas, não dispunha de espaço na agenda, e o dinheiro estava curto. Obstinado, e ciente de que a necessidade é a mãe da invenção, virou-se com o que tinha à mão: as escadas do prédio onde mora. Passou a subir e a descer os degraus várias vezes por dia entre uma tarefa e outra. Resultado: em três meses o garoto secou. Perdeu o peso que ganhara com o sedentarismo forçado, e mais alguns quilos.
Longe de ser exceção, o caso mostra que não passa de um mito a ideia de que a falta de tempo e de recursos é fator impeditivo da transformação pessoal. O aproveitamento do tempo decorre da escolha individual de cada um. Ao optar por fazer uma coisa, estamos escolhendo não fazer outra. O tempo que levamos para preparar um sanduíche e comê-lo, por exemplo, é o mesmo tempo que usaríamos para dar uma volta rápida no quarteirão. Do mesmo modo que subestimamos o impacto negativo de um lanche ou guloseima no nosso organismo, sobretudo quando isso é uma rotina, também temos a tendência de não valorizar devidamente o efeito benéfico de um exercício ligeiro.
“Só há um exercício prejudicial à saúde: o que não fazemos. Lembre disso antes de apertar o botão do elevador”
A atividade física não precisa, necessariamente, consumir horas. Bastariam alguns minutos distribuídos ao longo do dia, hoje, para o nosso corpo nos agradecer amanhã. Pense nisso como snack fitness, conceito, aliás, que foi objeto de reportagem recente desta revista. O termo chama a atenção por justapor palavras que, no contexto original, remeteriam a ideias conflitantes. Mas aqui o que interessa é a sugestão de que o exercício diário pode, sim, ser saboreado como petiscos que consumimos sem perceber. Afinal, ninguém precisa parar tudo o que está fazendo para comer um punhado de castanhas, um pedaço de fruta ou uma fatia de pão torrado.
Essa é uma iniciativa que, em sua simplicidade, pode ser poderosa, pois põe por terra a desculpa da falta de tempo. Organizando bem as tarefas, sobra tempo para ler, assistir a algo na TV, até jogar conversa fora. A atividade física pode ser feita nos intervalos entre uma coisa e outra, sem exigir maiores preparativos. Quando eu era obesa, criei o hábito de me movimentar na esteira ainda que estivesse de camisola — só para quebrar a inércia. Deixava o tênis ao lado da esteira e, sempre que possível, me propunha a fazer caminhadas, mesmo que por alguns minutos. Por muito tempo fiz e prescrevi um treino intermitente de apenas vinte minutos. Consistia numa caminhada de aquecimento de três minutos, seguida de marcha de um minuto. Na sequência, mais um minuto de corrida e, por fim, um tiro de um minuto, forçando o limite, mas sem passar do ponto. Aí era repetir a série três vezes. Esse treino era suficiente para manter meu metabolismo acelerado o dia todo.
Não há receita universal. A melhor atividade física é aquela que podemos fazer. Só há um tipo de exercício que, comprovadamente, é prejudicial à saúde: aquele que nós não fazemos. Lembre-se disso antes de apertar o botão para chamar o elevador.
Publicado em VEJA de 24 de novembro de 2021, edição nº 2765