Nas últimas semanas tem sido recorrente perguntas vindas do mercado e alimentadas pelo noticiário sobre a eventual saída do ministro da Economia, Paulo Guedes, do governo. A razão da preocupação é óbvia: a adoção de políticas que desestabilizem as políticas fiscais, em especial a questão do teto de gastos. O mercado teme que a saída de Guedes signifique uma opção populista e heterodoxa de política econômica. Sem entrar no mérito e na consistência da preocupação do mercado, vamos analisar a situação do ministro no governo. Pessoalmente, PG, como é chamado pelo presidente Jair Bolsonaro, goza de excelente relação com o seu chefe, sedimentada na sinceridade do trato de questões políticas e econômicas.
Tal relação — por melhor que seja —, porém, tem alguns balizadores que devem ser considerados. O mais importante deles é o fato de que Bolsonaro tem certeza de que o maior problema que o país vai enfrentar no pós-pandemia está na retomada da economia. Bolsonaro também está convencido de que a previsibilidade fiscal é motor de crescimento, mas não seria suficiente para resolver o tamanho da recessão herdada da pandemia. O sucesso, tanto político quanto de imagem, do governo se deve ao pagamento do auxílio emergencial de 600 reais a trabalhadores informais. Tal fato mostrou que medidas proativas do Planalto podem surtir efeitos políticos importantes. A ponto de alguns considerarem que Bolsonaro estaria aprisionado na armadilha do auxilio emergencial.
Guedes e Bolsonaro, apesar do bom entendimento, estão em campos opostos em termos de prioridades: o presidente quer um plano de estímulo; Guedes quer mais reformas. Um quer um novo Bolsa Família (Renda Brasil) que seja maior e mais relevante do que o atual. O outro propôs fazer uma espécie de “mexidão”, empacotando tudo em uma nova embalagem. Como a economia é política disfarçada, a decisão final é política.
“Paulo Guedes não sai. Mas ele terá de atender, ao menos em parte, aos desejos do presidente”
As diferenças de opinião fazem parte do jogo de poder de Brasília. E o presidente, assim como outros, joga as peças do seu xadrez para pressionar seu time a fazer o que deseja. O mundo político acredita que sem um programa estruturado o país vai patinar na saída da pandemia. Dentro do governo há quem considere que, fora as reformas e o sucesso na condução da política monetária de antes da pandemia, pouco foi feito além do auxílio emergencial, maior oferta de crédito, retomada de algumas obras e o anúncio de um novo programa habitacional.
No limite, o que vai acontecer? Como o impasse será resolvido? Paulo Guedes cede e fica ou resiste e sai? O cenário básico é o da permanência de Paulo Guedes. Mas o conforto de sua permanência depende de Guedes encontrar meios de atender, pelo menos em parte, aos desejos do presidente. Nas palavras de Eduardo Braga, líder do MDB no Senado, não se pode fazer concessões fiscais irresponsáveis, mas temos de obter fontes saudáveis para financiar a retomada econômica. O desafio é encontrá-las. O governo deve se mobilizar para apresentar programas de investimento, melhorar o ambiente de negócios e mostrar iniciativas que apontem os caminhos da saída da recessão. Até agora o cardápio está muito limitado.
Publicado em VEJA de 9 de setembro de 2020, edição nº 2703