Em depoimento, Valeixo não aponta interferência direta de Bolsonaro na PF
Ex-diretor-geral confirmou investidas do presidente para trocar superintendentes; Bolsonaro queria diretor com 'maior afinidade' com ele, disse Valeixo
Ex-diretor da Polícia Federal, o delegado Maurício Valeixo prestou um longo depoimento, que encheu 12 páginas, na Polícia Federal nesta segunda, 11. Foi perguntado sobre quase todos os casos explosivos que envolvem amigos, aliados e integrantes do clã presidencial, mas não apontou nenhuma interferência direta de Jair Bolsonaro na corporação.
O delegado confirmou ter deixado o cargo por desgastes, citou as investidas do presidente para trocar o superintendente da PF no Rio e confirmou a informação revelada pelo Radar de que o presidente desejava trocar a superintendente de Pernambuco, Carla Patrícia, por ela ter sido secretária do governo do PSB no estado.
Em determinado momento do interrogatório, o delegado foi provocado a explicar o que seria, na visão dele, a definição de interferência na Polícia Federal.
Valeixo disse que, em sua visão, “a partir do momento em que há uma indicação com interesse sobre uma investigação específica, estaria caracteriza uma interferência política, o que não ocorreu em nenhum momento sob o ponto de vista do depoente”.
“Em duas oportunidades, uma presencialmente, outra pelo telefone, o presidente da República teria dito ao depoente que gostaria de nomear ao cargo de diretor-geral alguém que tivesse maior afinidade, não apresentando nenhum tipo de problema contra a pessoa do depoente; que o depoente registra que o presidente nunca tratou diretamente com ele sobre troca de superintendentes nem nunca lhe pediu relatórios de inteligência ou informações sobre investigações ou inquéritos policiais”, registra Valeixo.
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Clique e AssineEm um ponto do depoimento, ao falar do desejo de Bolsonaro de trocar o superintendente do Rio, Valeixo defende o desempenho do delegado que comandava a corporação no estado, mas nega que Bolsonaro tenha pedido qualquer informação sobre investigações. “Não lhe foi solicitada nenhuma informação por parte da Presidência da República sobre investigações ou inquéritos em tramitação na superintendência do Rio”, registra o depoimento.
Em outro trecho, o delegado perguntou a Valeixo: “A Presidência da República solicitou ao depoente algum dado sobre investigação policial em curso, seja pelo nome de relatório de inteligência ou informação policial?”. A resposta de Valeixo: “Não”.
Em algum momento a Presidência da República reclamou com Valeixo o não envio de relatórios de inteligência, questionou o interrogador. “Não”, disse Valeixo.
No interrogatório, Valeixo deixa evidente a decisão de não avançar nas declarações prestadas por Sergio Moro no depoimento. As conversas sobre sua substituição, diz, eram tratadas sem sua presença, entre Moro e Bolsonaro.
Valeixo confirma a versão de que desejava sair do cargo por considerar que “o melhor para a Polícia Federal seria sua substituição”. Valeixo também disse que “entendia que havia encerrado seu ciclo no comando da PF”.
O ex-diretor da PF também fala de Alexandre Ramagem, o amigo de Carlos Bolsonaro, que o presidente tentou nomear no seu lugar. Valeixo é questionado se o fato de Ramagem ser amigo do presidente seria impeditivo para assumir o cargo de diretor-geral da PF. O ex-diretor responde apenas que “o ato de nomeação e exoneração são privativos do presidente da República”.
Sobre um dos pontos sensíveis do caso, o inquérito das fake news, usado por Sergio Moro para demonstrar a tentativa de interferência de Jair Bolsonaro na corporação, Valeixo diz que ficou sabendo da frase do presidente, de que “seria mais um motivo para trocar o comando da PF” por Moro, que lhe mostrou a mensagem de WhatsApp do presidente. Valeixo descartou interferência de Bolsonaro no caso. “Nunca havia sido solicitado ao depoente qualquer informação, seja pelo ex-ministro ou pelo presidente da República, sobre o inquérito”, disse Valeixo.
“A troca de diretor na PF poderia impactar no acesso a informações do inquérito mencionado”, perguntou o interrogador a Valeixo. “Não, pois seria necessária uma troca na rotina de trabalho estabelecida na Polícia Federal já há muitos anos”, disse Valeixo.