Bolsonaro demitiu três ministros, admitiu dois, promoveu uma dança das cadeiras e os comandantes das Forças Armadas foram embora. Um terremoto. Mas, terminado o furdunço, como fica? Para onde vai isso?
As Forças Armadas não vão se submeter à vontade do presidente: pelo contrário, os atos recentes do presidente reduziram ainda mais seu respaldo nos Altos-Comandos. O Congresso não vai se satisfazer com a demissão de Ernesto Araújo: como a política externa continuará sendo determinada por Eduardo Bolsonaro e Filipe Martins, e Ricardo Salles é um entrave no relacionamento com outros países, a pressão voltará.
O Centrão não vai se satisfazer com a nomeação de Flávia Arruda para a Secretaria de Governo. Ao contrário: Flávia é uma porta escancarada para o insaciável apetite do grupo, que fará uma exigência atrás da outra, comprometendo o (já inexistente) equilíbrio fiscal. Se Bolsonaro resistir, Arthur Lira lhe mostrará a carta do impeachment.
A pandemia só vai melhorar de verdade quando houver vacinação em massa, o que não ocorrerá nos próximos meses, e Bolsonaro vai continuar sabotando o isolamento social. Um cenário de 5 000 mortes por dia com um total de mais de 400 000 é perfeitamente plausível.
A economia continuará em crise, com desemprego alto, inflação, juros subindo, e se esse orçamento fora da realidade for mantido, há risco de shutdown do governo (caso em que não haveria dinheiro sequer para botar vacina em avião). A pressão internacional por causa da pandemia e do meio ambiente está se elevando, e sanções econômicas não estão descartadas.
“A média de Bolsonaro é de uma crise institucional a cada nove meses. Faltam 21 para o fim do mandato”
Há problemas por todos os lados, mas o maior de todos reside em um dilema irreconciliável na pessoa do próprio presidente. De um lado, a militância (que está no coração de sua propaganda e de sua popularidade) exige que ele rompa com o que ela chama de “sistema”; do outro, a governabilidade exige que se entenda com o “sistema”, senão não consegue governar e cai.
Uma pessoa normal daria prioridade a se manter no poder, mas não é por acaso que o presidente tem a militância que tem. Bolsonaro é naturalmente destrutivo e, como uma criança, não aceita ser contrariado: sempre que cede à governabilidade (na demissão de Araújo, por exemplo), sente a necessidade de fazer algo radical para demonstrar que é ele quem manda (daí a demissão do ministro da Defesa). Seu comportamento ciclotímico sabota a si mesmo, imobiliza e inviabiliza seu governo, gera crises institucionais.
Bolsonaro teve a primeira crise séria com o Congresso no início do governo e outra em maio passado, quando bateu de frente com o Supremo e quis dar um golpe militar, mas não conseguiu. Agora, brigou de novo com o Congresso, e teria dado um golpe se pudesse.
Bolsonaro não conta com o apoio da maior parte da sociedade, da imprensa, do Supremo, da maioria do Congresso, dos grandes empresários, dos banqueiros, dos militares ou de países estrangeiros. Só o Centrão ainda o sustenta — a um custo altíssimo, que tende a se tornar impagável. Não é certo que Bolsonaro sobreviva a uma nova crise institucional.
A média de Bolsonaro é de uma crise institucional a cada nove meses.
Faltam 21 meses para o fim do mandato.
Publicado em VEJA de 7 de abril de 2021, edição nº 2732