Advogada de Jairinho, Flávia Fróes se prepara para disputar eleições
Figura controversa no meio jurídico, ela defende líderes das maiores quadrilhas do país e se tornou a criminalista mais enfronhada nesse universo
Há que reconhecer: a clientela da advogada Flávia Fróes, de 47 anos, é de cair o queixo. Figura para lá de controversa no meio jurídico, ela defende líderes das maiores quadrilhas do país e se tornou a criminalista mais enfronhada nesse universo, ostentando, sem um pingo de constrangimento, o duvidoso título de “advogada do tráfico”. Como se não bastasse, ampliou recentemente a lista de clientes — nomes como Márcio Nepomuceno, o Marcinho VP, Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, chefões do Comando Vermelho (CV) e Abel Pacheco de Andrade, o Vida Loka da cúpula do Primeiro Comando da Capital (PCC) — ao assumir a defesa do ex-vereador Jairinho, acusado de torturar e matar o enteado Henry Borel, de 4 anos. Ambiciosa, achou que era hora de voar mais alto e filiou-se ao União Brasil, pelo qual vai se lançar candidata a deputada federal. “Fui convidada por cinco partidos e escolhi o que me dará mais espaço. Vou aparecer em todas as inserções na TV que for possível”, afirma.
Com trânsito livre nas favelas do Rio e de São Paulo e batendo ponto com frequência em presídios de segurança máxima, a capixaba Flávia, que mora em Nova Friburgo, na Região Serrana, e também tem casa de praia em Maceió, gaba-se de ser um “defunto caro”. “Ninguém mexe comigo porque tenho respeito junto às lideranças de todos os grupos criminosos do Brasil”, esclarece. Situa sua base eleitoral justamente entre os moradores de locais dominados pelo tráfico e entre os familiares dos presos que defende, contando com seu voto para ser alçada ao Congresso. Conhecida pelos métodos agressivos, ao entrar para o time de defesa de Jairinho ela foi acusada de atropelar os colegas até ser catapultada a titular do caso. Também teria ido à cadeia onde estava Monique, a namorada do ex-vereador e mãe de Henry, igualmente implicada no crime — agora em regime de prisão domiciliar (leia em Imagem da Semana, na pág. 14) —, para pressioná-la a compactuar com a versão do seu cliente. “Flávia é famosa por se valer de métodos não ortodoxos. Todo mundo, inclusive os outros advogados, tem medo dela por causa da ligação com os traficantes”, diz um colega.
A entrada no caso Henry lhe rendeu duas representações ético-disciplinares na OAB-RJ. Uma foi feita pelo advogado Braz Sant’Anna, que respondia pela defesa de Jairinho antes dela, e outra por Monique, que disse ter ouvido de Flávia que seria transferida ou “pega” na cadeia caso não seguisse suas orientações (fato é que, quatro dias depois da visita da advogada, ela mudou de penitenciária). Flávia, por sua vez, entrou com queixas-crime e ações contra Sant’Anna e Monique, por calúnia. Entreveros com a Justiça fazem parte de sua carreira. Em 2010, chegou a ter a prisão decretada sob suspeita de atuar como “pombo-correio”, levando informações de chefões presos aos traficantes nos morros cariocas. O caso não foi adiante por falta de provas. Em outra ocasião, o Ministério Público de São Paulo investigou o suposto repasse de 700 000 reais do PCC para o Instituto Anjos da Liberdade, organização social presidida por Flávia que se diz defensora dos direitos humanos. A suspeita não foi comprovada. “A classe a vê com um pé atrás. Quando se intitula ‘advogada do tráfico’, está infringindo o nosso estatuto. É como falar: trafique que tem defesa aqui”, critica um membro da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim).
Muito ativa nas redes sociais, Flávia as usa não só para enaltecer seu currículo como para exibir os atributos físicos esculpidos com lipos, silicone, rinoplastia e os inevitáveis cílios postiços — além da malhação em academia, que também faz questão de postar. Divorciada, mãe de duas filhas e avó de cinco netos, a vaidosa advogada aparece no Instagram de biquíni rosa cavadíssimo e a legenda: “Barbie e Penélope Charmosa já passaram dos 50. A vó logo chega lá”. Em outra postagem, aparece de costas, exuberante, celebrando: “Aberta a temporada de fotos de maiô”. A doutora Flávia não assume uma causa por menos de 300 000 reais (“Se tem mídia, o preço dispara”). Quando questionada sobre o fato de os honorários virem quase sempre do tráfico de drogas, tem a justificativa na ponta da língua. “Ninguém pergunta a um médico que põe silicone na bunda da mulher do traficante de onde é o dinheiro. O meu não vem do crime, vem da advocacia”, argumenta. Fechando o rol de excentricidades, a pré-candidata do União Brasil, partido de Sergio Moro e de quadros alinhados ao bolsonarismo, não esconde sua posição no espectro político: é de extrema esquerda. Alguém tem alguma coisa contra?
Publicado em VEJA de 13 de abril de 2022, edição nº 2784