Assessor de Tarcísio, cunhado de Bolsonaro provoca ciúmes nos bastidores
Já causa visível incômodo o protagonismo de Diego Torres Dourado no governo de São Paulo
Na última quarta, 6, o governador paulista Tarcísio de Freitas (Republicanos) comemorou aquela que é de longe a grande vitória em seu primeiro ano de gestão à frente do estado mais poderoso da União. Em uma sessão quente e tumultuada por manifestantes de oposição, por 62 votos a 1, aprovou a maior promessa de campanha: o plano de privatização da Sabesp. O bem-sucedido esforço que garantiu esse triunfo na Assembleia Legislativa destoa do acidentado caminho que o ex-ministro de Jair Bolsonaro vem trilhando na tentativa de pavimentar um terreno seguro no campo da articulação política no estado. Opinião quase unânime entre aliados do círculo mais próximo — o que inclui deputados do PL e do Republicanos — é a de que esse se mostra o ponto mais fraco do governador.
Tarcísio, embora demonstre boa vontade e desejo de entregar resultados, não tem paciência para salamaleques com parlamentares e agendas com prefeitos do interior e fica sempre com um pé atrás em relação a indicações vindas da própria base para cargos. Seus dois principais auxiliares, os secretários Arthur Lima (Casa Civil), militar e amigo de longa data, e Gilberto Kassab (governo), embora neguem publicamente qualquer tipo de desavença e afirmem ter campos de atuação distintos, travam nos bastidores disputas para ver quem tem mais poder. “O resultado é que ninguém sabe quem manda por lá”, diz um prefeito paulista, sob condição de anonimato.
Em meio a esse cenário, um terceiro personagem vem tentando decolar como articulador político. Trata-se de Diego Torres Dourado, irmão da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Em janeiro, ele foi indicado por Tarcísio para o cargo de assessor especial (salário de 21 500 reais). Com uma sala a poucos metros de distância do gabinete do governador, passou a fazer o papel de leva e traz de demandas surgidas principalmente da base de apoio bolsonarista na Assembleia. Na semana passada, por exemplo, coube a Diego intermediar uma reunião entre Tarcísio e um pequeno — mas ruidoso — grupo de bolsonaristas descontentes com a falta de espaço. Foram horas de conversa e, após o encontro, a temperatura diminuiu entre os “dissidentes” com promessas como o apoio às escolas cívico-militares, uma das reivindicações da turma.
Diego, que se define como um “facilitador”, cuida ainda de tarefas como marcar reuniões entre parlamentares e secretários, receber e analisar indicações para cargos de segundo escalão em diante e até mesmo auxiliar na desburocratização de propostas. “A atuação dele tem sido positiva e mostra a importância da proximidade do governo com a Assembleia”, diz o deputado Jorge Wilson, líder do governo na Casa. As mais experientes raposas políticas do Palácio também são só elogios. “Ele tem tido uma atuação importante”, diz Kassab. Arthur Lima faz coro: “Diego faz o papel de agregar os parlamentares em torno do objetivo do governo”.
Nos bastidores, porém, já causa visível incômodo o protagonismo desse novo articulador. Há ressalvas sobre o real poder de Diego (ele não participou da negociação da Sabesp) e de sua capacidade para viabilizar pedidos de deputados da base — o próprio ameaçou jogar a toalha em agosto, ao deparar com dificuldades de o governo aceitar indicações. “Ele corre atrás, mas nem tudo depende dele. Até agora não foram pagas todas as emendas voluntárias, sendo que deputados da oposição estão com essas mesmas emendas pagas”, diz um parlamentar da base aliada. Em Guarulhos, um dos municípios mais importantes do estado, Diego provocou turbulência ao alardear que Jorge Wilson, do Republicanos, é o “candidato do Bolsonaro” à prefeitura. O movimento adicionou mais tensão a um cenário já bastante quente: o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, apoia Lucas Sanches (PL), mas tem sido alvo de críticas porque o candidato já criticou abertamente Bolsonaro.
Ex-soldado da Força Aérea, Diego acumulou passagens em cargos de assessoria no Ministério da Defesa e no Senado no governo Bolsonaro e aproximou-se de Tarcísio ao criar perfis na internet em homenagem ao então ministro: ‘Tarcisão do Asfalto’ e ‘Ministro Tarcísio de Freitas’. Mudou-se para São Paulo com o objetivo de participar da campanha e, desde então, atua diretamente com Tarcísio. Ele também acabou sendo envolvido no rastro de confusões deixado pelo clã Bolsonaro — mais precisamente, no célebre caso das joias presidenciais recebidas, vendidas e recompradas. Diego aparece em mensagens encontradas pela Polícia Federal no celular do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, em que um interlocutor pergunta sobre uma “mala que o irmão da dona Michelle teria falado”. Diego evita falar do assunto, por motivos óbvios — ele é a prova viva dos prós e contras de estar próximo ao clã Bolsonaro.
Publicado em VEJA de 8 de dezembro de 2023, edição nº 2871
Atualização às 19h30 de 9 de dezembro de 2023:
Em nota, o vereador Lucas Sanches, pré-candidato a prefeito de Guarulhos, afirma que não criticou, em nenhum momento, o ex-presidente Jair Bolsonaro, hoje presidente de honra do PL. “Nas eleições de 2022, durante uma entrevista a um podcast, o político foi questionado sobre uma situação específica de Guarulhos e, na oportunidade, disse que, o que não funcionava na cidade, quanto à gestão pública local, prejudicava tanto quem era de direita e quanto quem era de esquerda. Reitera-se: em sua trajetória política, Lucas Sanches jamais teceu críticas a Bolsonaro”, diz o comunicado enviado pelo vereador.