Com Zema cotado como presidenciável, Novo abandona dogmas para sobreviver
Fundado com posturas originais como a recusa ao dinheiro público, partido decidiu que era a hora de flexibilizar algumas de suas bandeiras
![CORTEJADO - Zema: crítico antigo das limitações de sua sigla, ele entrou na mira de gigantes como PL e PP](https://gutenberg.veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2023/07/20230127111414316_53.jpg.jpg?quality=90&strip=info&w=1280&h=720&crop=1)
O Novo foi fundado em 2011 pretendendo levar para a política parte da cartilha empresarial: o partido seria mantido com recursos privados, com veto ao uso de dinheiro público, e a escolha de candidatos em processo seletivo. A largada foi promissora. Em 2018, sua primeira eleição geral após o registro, em 2015, elegeu Romeu Zema governador de Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país. Também emplacou oito deputados federais, e o seu fundador, o empresário João Amoêdo, ficou em um surpreendente quinto lugar na corrida presidencial, com 2,5% dos votos. Seguiu-se, no entanto, uma dura derrocada em 2020 (quando fez apenas um prefeito) e 2022, quando elegeu três deputados, insuficientes para superar a cláusula de barreira. Viu ainda o número de filiados murchar de 46 000, em 2019, para 33 000, hoje, enquanto ideologicamente ia se inclinando cada vez mais à direita. O flerte com o bolsonarismo foi decisivo para um racha que levou à saída de Amoêdo da sigla, em novembro de 2022. Em meio a esse quadro, e para sobreviver politicamente, o Novo decidiu que era a hora de flexibilizar alguns de seus dogmas.
![WhatsApp-Image-2023-07-18-at-17.08.48.jpeg CRÍTICA - Amoêdo: fundador diz que maior erro da sigla foi flerte com Bolsonaro](https://gutenberg.veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2023/07/WhatsApp-Image-2023-07-18-at-17.08.48.jpeg.jpg?quality=90&strip=info&w=1024&crop=1)
O primeiro a cair foi o veto ao uso de dinheiro público. A sigla aprovou o uso dos rendimentos dos cerca de 100 milhões de reais do Fundo Partidário que acumulou em sua conta — o montante rende cerca de 1 milhão de reais por mês. Agora, discute a utilização do Fundo Eleitoral nas disputas às prefeituras em 2024, vistas como decisivas ao futuro da agremiação. Já o processo seletivo passou a ser acompanhado de um processo mais voltado para a formação política de filiados. Os critérios para a abertura de diretórios municipais foram flexibilizados. Antes eram necessários 60 000 reais em arrecadação e 150 filiados — agora, só é preciso haver três dirigentes, uma lista mínima de nomes para disputar a eleição e capacidade para captar recursos. A sigla também aprovou a profissionalização dos dirigentes, com a remuneração de alguns. “O modelo de voluntariado é muito legal para uma ONG, mas não funciona para um partido. As pessoas, os filiados, os apoiadores querem profissionalização. Todos os outros partidos são profissionais e o Novo não”, justifica Eduardo Ribeiro, presidente da legenda.
As mudanças, indicam os dirigentes, são frutos de duro aprendizado. Para Ribeiro e outros políticos do Novo, elas são necessárias para que o partido seja competitivo frente aos concorrentes, que usam os recursos públicos à disposição. A retórica de ser uma sigla independente de dinheiro do contribuinte é avaliada agora como pouco atrativa ao eleitorado e um “erro de premissa”. Também se atribui o fraco desempenho em 2022 à polarização, que favoreceu o PL ante outros partidos de direita, e ao que é visto como erro de estratégia de não ter estimulado a expansão nacional após 2018. “O partido já sofreu muito com a dualidade PT-Bolsonaro. Não tínhamos como continuar sem usar esse dinheiro, sob pena de ver o Novo desaparecer”, diz o vice-governador de Minas, Mateus Simões. Para Amoêdo, porém, os diferenciais do Novo eram uma vantagem competitiva e o problema em 2022 foi a aproximação da sigla com o bolsonarismo — ele declarou voto em Lula no segundo turno. “O Novo se dizia independente, mas ficou independente só no discurso, com uma postura ligada ao bolsonarismo, um bolsonarismo genérico”, avalia.
![PROTESTO-NOVO—FUNDO-PARTIDARIO.jpg QUEM TE VIU... - Campanha: oposição ao subsídio público a partidos em 2018](https://gutenberg.veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2023/07/PROTESTO-NOVO-FUNDO-PARTIDARIO.jpg.jpg?quality=90&strip=info&w=1024&crop=1)
As flexibilizações também têm como pano de fundo um possível voo nacional de Zema. Após a inelegibilidade de Jair Bolsonaro, ele se tornou uma opção forte para a centro-direita por já estar no segundo mandato, ao contrário do governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos). O mineiro sempre teve reservas às limitações impostas pelo Novo. Costuma dizer que, com a proibição de doações empresariais em 2016, disputar eleições sem recursos públicos é como ir à guerra sem usar pólvora. Entre aliados, o discurso é o de que ele não vai sair do partido — é cortejado por siglas como PL e PP — e fala-se com muito cuidado sobre a disputa ao Planalto. “Qualquer projeto nacional passa por Minas dar certo. Se o nome do governador for o mais viável, ele não é homem de correr da raia”, diz o secretário da Casa Civil e articulador político de Zema, Marcelo Aro, que cita Ronaldo Caiado (GO), Eduardo Leite (RS), Ratinho Junior (PR) e Raquel Lyra (PE) como nomes fortes do mesmo espectro.
Políticos de outros partidos avaliam que, mineiramente, Zema adota a postura mais lógica porque a única explicação para admitir sair do Novo agora seria uma candidatura presidencial, e isso o colocaria na linha de tiro do PT três anos antes. Mas é preciso ver até onde o Novo poderá abrigar as pretensões de seu maior nome. Embora tenha feito ajustes, é um partido pequeno, com pouco dinheiro e sem direito a propaganda na TV e participação em debates, obstáculos expressivos em uma campanha nacional. E isso não é nenhuma novidade.
Publicado em VEJA de 26 de julho de 2023, edição nº 2851