A chegada do novo coronavírus e todos os problemas por ele acarretados viraram assunto mundial e um dos reflexos imediatos foi a preocupação com a saúde mental da população. O Centro de Valorização da Vida, o CVV, já sentiu nas últimas duas semanas o impacto da Covid-19. Em pelo menos 50% das ligações o assunto tem surgido como um dos protagonistas das questões discutidas. O CVV recebe no Brasil 8.000 ligações por dia.
“Os medos acarretados pelo coronavírus atacam em frentes variadas, mas todas elas derivam da questão de privação de liberdade”, afirma Antônio Batista, de São Paulo, voluntário do CVV de São Paulo há mais de vinte anos. “Por amor, muitos não podem encontrar familiares mais velhos sob o risco de transmitir a contaminação. O fato de a pandemia não ter data para terminar deixa a angústia maior: não há previsão para o reencontro com a pessoa amada acontecer”, completa Batista. A população mais velha, muitas vezes, não tem tanta desenvoltura com aplicativos de vídeo, como Skype e WhatsApp, agravando ainda mais a solidão e sensação de impotência. “Há muita gente com medo de perder mãe e avós já doentes, sem ter a chance de poder se despedir”, diz o voluntário.
Outras queixas ligadas ao coronavírus: distanciamento da família, medo de ser contaminado pela doença, receio de perder o emprego e de empobrecer. A solidão, sempre ela, permeia boa parte das conversas. “Os problemas têm origens muito variadas, mas não podemos ignorar que a pandemia pode agravar o que já existe e trazer novos questões”, aponta Batista. O coronavírus pode ser um gatilho, para ficar no termo técnico mais usado no momento, para desencadear problemas psicológicos. “A pandemia despertou a fragilidade, a vulnerabilidade e a sensação de impotência das pessoas. Para manter a sanidade emocional, o primeiro passo é trabalhar a aceitação dos fatos. Devemos sempre estar atentos sobre qualidade dos nossos pensamentos no sentido de não entrar em uma espécie de negação do problema nem nos render ao pavor que gera a paranoia”, explica Douglas Maluf, diretor do Centro Nacional de Inteligência Emocional.
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Clique e AssineO CVV tem se adaptado aos novos tempos. Há medidas de higiene nos telefones e nas cabines dos centros nos quais os voluntários recebem as ligações. Muitos deles também estão trabalhando de forma remota, ajudando de suas casas quem quer uma palavra de conforto em alguma parte do Brasil. A Covid-19 interrompeu os cursos de capacitação de novos voluntários. “O país tem 120 postos de atendimento”, conta Antonio Batista. Desde 2018, a chamada para o número 188 do CVV passou a ser gratuita — o que permite ligações por quem está sem crédito no celular. “É mito de que apenas pessoas mais velhas ligam. Já atendi muitos adolescentes falando durante o recreio escolar.”