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Garotinho relata agressão e diz que negou injeção de ex-auxiliar de Cabral

Em entrevista a VEJA, o ex-governador do Rio remonta o episódio e relembra ter sido atendido por ex-secretário de Sérgio Cabral

Por Victor Irajá 22 ago 2021, 16h44

O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro denunciou, nesta quinta-feira, 20, o policial militar Sauler Campos de Faria Sakalem por prática de tortura contra o ex-governador Anthony Garotinho (Republicanos), quando o ex-mandatário esteve preso na Cadeia Pública José Frederico Marques, em Benfica, na região central. A respeito das agressões, Garotinho falou a VEJA e relembrou o episódio. O caso aconteceu em 24 de novembro de 2017, quando o ex-governador estava preso pela suspeita de recebimento de 3 milhões de reais em propina por meio de contratos fraudulentos com a empresa JBS. Ele conta que havia sido transferido para uma ala desativada do presídio, onde aconteceram as agressões, detalha os ataques e vincula o nome do ex-subsecretário penitenciário da gestão do ex-governador Sérgio Cabral (MDB), pai do acusado de agredi-lo. Ele ainda relata estranheza com o fato de haver discrepâncias de horário e operação do sistema interno de segurança do presídio.

Passei a primeira noite com quatro pessoas que não conhecia, na galeria A. No outro dia pela manhã, estávamos nos corredores conversando, em grupo, quando o chefe da segurança do presídio, chamado Rafael, se aproximou junto a dois agentes penitenciários falando para que eu arrumasse as minhas coisas, porque eu seria transferido para a galeria B. No grupo que estava ali, tinha gente que já estava presa há um tempão. Eles disseram que a galeria B estava interditada e não havia ninguém lá. O Rafael respondeu que apenas obedecia ordens”, afirma ele. “Perguntei a ele: ‘É ordem superior ou da Justiça?’. Ele respondeu: ‘Eu recebi ordem. O senhor foi governador, o senhor entende a situação. Tenho que cumprir’.

Garotinho relembra que o acusado é filho do ex-subsecretário Sauler Sakalen, subsecretário da Secretaria de Administração Penitenciária do ex-governador Sérgio Cabral. “Ele nem funcionário do presídio é, ele é policial militar. O pai dele era subsecretário da gestão penitenciária da gestão de Sérgio Cabral”. Garotinho, então, foi levado ao pavilhão, onde ficaria sozinho. Ele chegou a solicitar que levasse uma companhia. Segundo o ex-governador, as agressões ocorreram depois de ele pedir à merendeira para que ela o ajudasse. “No final da tarde, fui pegar comida e insisti com a menina que entregava as refeições sobre isso. Ela respondeu que não podia fazer nada ou se meter nisso”, afirma.

“Engoli, deitei cedo. Entre meia-noite e meia e uma hora da manhã, ouvi um chamado. Continuei com a cabeça virada e ouvi de novo: ‘psiu’. Aí eu olhei. Um homem me disse: ‘Desce daí’. Desci e ele disse: ‘Você gosta de falar muito, né?’. Respondi que era radialista. Aí ele foi com um porrete que estava na mão dele, parecia um pé de mesa ou um taco de basebol mais grosso na ponta. Mirou na minha rótula e bateu muito firme, era uma dor alucinante”, conta. Depois, segundo o ex-governador, o policial militar apontou uma arma para ele. “Ele meteu a mão na cintura, pegou uma pistola preta com uma lista prateada em cima, encostou na minha cabeça e disse: ‘Olha, você ia morrer hoje. Se não vai morrer hoje, agradeça ao pessoal aí do lado que eu não quero que suje para eles’, conta Garotinho, se referindo aos presos no âmbito da Operação Lava-Jato, que estavam na ala ao lado. “‘Mas vou deixar uma lembrancinha para você’, ele me disse. Ele, então, pisou no meu pé com o salto do sapato, eu estava de sandália. Chegou a fazer uma fissura no dedo”, relata.

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Garotinho afirma que a administração penitenciária deveria garantir a presença de dois agentes penitenciários nos portões do presídio, o que, segundo ele, não aconteceu. “Eles vieram quando eu comecei a bater com a mão do lado de fora. Me perguntaram o que tinha acontecido e contei. Me disseram que não era possível, que não tinha entrado ninguém. Perguntei se eles estavam na porta e eles me disseram que haviam saído para buscar um preso que tinha chegado de Madureira. Perguntei: ‘Meu irmão, como é que você pode, então, me garantir que não entrou ninguém?’. Disse que estava com muita dor e eles me disseram que chamariam um médico”, conta ele. O único médico disponível nas instalações seria Sérgio Côrtes, ex-secretário de Saúde de Sérgio Cabral, preso no âmbito da Lava-Jato.

Anos antes, em 2012, foi Garotinho quem havia divulgado as fotos da já famosa “farra dos guardanapos”, quando Cabral e a mulher dele, Adriana Ancelmo, receberam os então secretários Sérgio Côrtes, da Saúde; e Wilson Carlos, de governo; além de empresários como Fernando Cavendish, ex-proprietário da Delta Construções; Georges Sadala, sócio da Agiliza Rio; e o português João Pereira Coutinho em um hotel em Paris em um festejo com guardanapos na cabeça. “Me buscam o Sérgio Côrtes, um cara que eu tinha denunciado. Ele me atendeu, olhando para o meu joelho, disse que teria que me dar uma injeção porque, senão, eu não aguentaria de dor. Eu respondi a ele: ‘Olha, o senhor vai me desculpar, mas não vou tomar injeção sua’. Pô, imagina, eu tinha denunciado o cara, vou tomar injeção dele? Não ia tomar”, relembra.

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