O uso de trecho da música O Bêbado e a Equilibrista pela Polícia Federal para batizar a Operação Esperança Equilibrista, que investiga irregularidades na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), revoltou um dos autores da canção, o cantor e compositor João Bosco – o outro autor é Aldir Blanc. Em nota divulgada na tarde desta quinta-feira, o músico criticou a ação policial na universidade e se disse indignado com o uso da obra para nomear a operação.
“A operação da PF me toca de modo mais direto, pois foi batizada de Esperança Equilibrista, em alusão à canção que Aldir Blanc e eu fizemos em honra a todos os que lutaram contra a ditadura brasileira. Essa canção foi e permanece sendo, na memória coletiva do país, um hino à liberdade e à luta pela retomada do processo democrático. Não autorizo, politicamente, o uso dessa canção por quem trai seu desejo fundamental”, afirmou.
João Bosco criticou a operação na UFMG, que envolveu a condução coercitiva do reitor, Jaime Arturo Ramirez, da vice-reitora, Sandra Almeida, e de outros três professores. O caso envolve suspeitas de desvios de cerca de 4 milhões de reais destinados à construção do Memorial da Anistia Política na instituição.
Veja a letra de “O Bêbado e o Equilibrista”:
Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto me lembrou Carlitos
A lua, tal qual a dona de um bordel
Pedia a cada estrela fria um brilho de aluguel
E nuvens, lá no mata-borrão do céu
Chupavam manchas torturadas, que sufoco
Louco, o bêbado com chapéu-côco
Fazia irreverências mil pra noite do Brasil, meu Brasil
Que sonha com a volta do irmão do Henfil
Com tanta gente que partiu num rabo-de-foguete
Chora a nossa pátria, mãe gentil
Choram Marias e Clarices no solo do Brasil
Mas sei, que uma dor assim pungente
Não há de ser inutilmente, a esperança
Dança na corda bamba de sombrinha
E em cada passo dessa linha pode se machucar
Azar, a esperança equilibrista
Sabe que o show de todo artista tem que continuar
O músico disse ter informações de que os docentes não foram intimados previamente a depor, pré-condição para uma condução coercitiva, e que tiveram restringidos seus direitos de acesso a informações e ao próprio processo . “O conjunto dessas medidas fere os princípios elementares do devido processo legal. É uma violência à cidadania”, criticou.
João Bosco também aproveitou para fazer uma defesa das universidades públicas, afirmando que “há indícios” que fazem com que ele acredite que a operação da PF é “um ato de ataque” ao ensino. Ele comparou o que ocorreu na UFMG com a situação de calamidade financeira da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que ficou longos períodos sem aulas e com atrasos no pagamento de salários e bolsas de pesquisa, para atestar a necessidade de “defesa veemente” das universidades. “É essa a esperança equilibrista que tem que continuar”, concluiu.