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Muito além da JBS: outras delações que implicam Temer

Antes de Joesley, pelo menos outros 8 delatores citaram o presidente, entre eles Marcelo Odebrecht e Sérgio Machado. E novos colaboradores vêm a caminho

Por Da redação
Atualizado em 4 jun 2024, 20h40 - Publicado em 24 jun 2017, 18h03

O presidente Michel Temer só se tornou alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) após a delação do dono da JBS, Joesley Batista, mas pelo menos outros oito colaboradores já o haviam envolvido em casos investigados na Operação Lava Jato. Só na megadelação da Odebrecht, o presidente é citado por quatro executivos — Márcio Faria, Rogério Araújo, Cláudio Melo Filho e Marcelo Odebrecht. Seu nome também aparece nos depoimentos dos lobistas Júlio Camargo e Fernando Baiano, do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado e do senador cassado Delcídio do Amaral. Os relatos o retratam como um intermediador de repasses a campanhas do PMDB, incluindo a dele próprio em 2014, e como padrinho de dirigentes da Petrobras presos e condenados por corrupção. Ele sempre negou as acusações.

Na última semana, surgiu mais um nome de peso que pode comprometer o presidente — o operador financeiro e potencial delator Lúcio Bolonha Funaro. Em depoimento à Polícia Federal no último dia 14,  ele relatou que o presidente sabia do esquema de propina na área de internacional da estatal e que atuou na arrecadação de cerca de 100 milhões de reais para as campanhas do PMDB, em 2010, 2012 e 2014. Parte desses recursos teria sido gerada em operações do Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Ele não se aprofundou em detalhes, mas especificou que Temer “pediu ou orientou” “comissões expressivas” para a campanha de Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo, em 2012, e para sua própria à vice-presidência, em 2014. De quebra, ainda confirmou o conteúdo da delação da Odebrecht. As acusações já são vistas como uma prévia do que ele pode entregar à Procuradoria-Geral da República (PGR) em troca da redução de pena. Logo no início do interrogatório, Funaro fez questão de manifestar “sua inteira disposição em celebrar acordo de colaboração” — ele está preso há onze meses e tem uma filha de um ano.

Outro candidato a delator que pode atingir em cheio o presidente é o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que foi condenado a 15 de reclusão e está preso desde novembro de 2016 pela Lava Jato. No início deste ano, Cunha arrolou Temer como testemunha de defesa em um processo a que responde na Justiça Federal de Brasília. Via tribunal, enviou-lhe dezenove perguntas por escrito, uma delas sobre o esquema de propina no FI-FGTS, o mesmo lembrado por Funaro. No mesmo período, o presidente viria a se encontrar na calada da noite no Palácio do Jaburu com Joesley, que o gravou comentando sobre as questões. “O Eduardo tentou me fustigar, né? Você viu”, disse ele, na ocasião.

Nenhuma dessas delações se converteram em inquéritos, pois tratavam de episódios anteriores à chegada de Temer à Presidência — um dispositivo da Constituição prevê que presidentes não podem ser investigados por atos estranhos ao exercício da função, o que não o impede de virar alvo de processo após o fim do mandato no fim de 2018. A delação de Joesley, no entanto, traz fatos suspeitos do período em que ele já ocupava o posto mais alto do Executivo.

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Odebrecht

Responsáveis por pagar propinas a ex-diretores da Petrobras por facilidades à Odebrecht na estatal, os ex-diretores da empreiteira Márcio Faria e Rogério Araújo relataram em suas delações premiadas uma reunião no dia 15 de julho de 2010 no escritório político de Michel Temer, em São Paulo. Os dois disseram que Temer se sentou à cabeceira da mesa no encontro, que terminou com o acerto de um repasse de 40 milhões de dólares ao PMDB pelo departamento de propinas da Odebrecht. O dinheiro correspondia a 5% de um contrato de 825 milhões de dólares da empreiteira com a diretoria Internacional da Petrobras, comandada à época por Jorge Zelada, apadrinhado no cargo pelo PMDB.

Apesar da presença do anfitrião, foi o então deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) quem teria conduzido as tratativas da propina. Também participaram do encontro o ex-deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e o lobista João Augusto Henriques. Dos participantes da reunião, estão fora da cadeia atualmente apenas Márcio Faria e Rogério Araújo, ambos delatores premiados, e Michel Temer.

Outra reunião com a ilustre participação do presidente foi rememorada nas delações do empreiteiro Marcelo Odebrecht e do ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht em Brasília, Cláudio Melo Filho. Em uma noite de maio de 2014, segundo Odebrecht e Melo Filho, os dois foram ao Palácio do Jaburu e lá jantaram com o Temer e o atual ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha. A ocasião serviu como “shake hands”, nas palavras do empreiteiro, para o acerto de um pagamento de 10 milhões de reais ilícitos ao grupo político de Temer, pedido com antecedência por Padilha.

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Marcelo Odebrecht contou que Temer deixou a mesa “entre o cafezinho e a sobremesa”, momento em que o acordo foi selado com o ministro. Ficou acertado que seis milhões de reais iriam à campanha de Paulo Skaf ao governo de São Paulo e os outros quatro milhões aos demais integrantes do núcleo duro do presidente. “Temer nunca mencionou para mim os 10 milhões, mas obviamente que no jantar ele sabia”, disse Odebrecht.

Sérgio Machado

Em seu acordo de delação, o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado relatou pagamentos de propina a mais de 20 políticos — o número hoje até parece pequeno se comparado aos da Odebrecht e da JBS. O dinheiro sujo vinha de contratos celebrados entre empreiteiras e a subsidiária de transportes da Petrobras, a qual ele comandou por 11 anos, de 2003 a 2014. Entre os políticos, estava o ex-pupilo de Temer Gabriel Chalita (ex-PMDB, hoje no PDT)

De acordo com Machado, o presidente chegou a lhe pedir pessoalmente, em um encontro na base Aérea de Brasília, que ele conseguisse doações para a campanha de Chalita à prefeitura da capital paulista, em 2012, que estava com problemas de financiamento. O ex-presidente da Transpetro, então, o informou que levantaria 1,5 milhão de reais da Queiroz Galvão. A verba foi repassada via caixa 1 pelo construtora ao diretório nacional do PMDB.

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“O contexto da conversa deixava claro que o que Michel Temer estava ajustando com o depoente [Machado] era que este solicitasse recursos ilícitos das empresas que tinham contratos com a Transpetro na forma de doação oficial para a campanha de Chalita”, diz trecho da delação de Machado. Temer e Chalita sempre negaram as acusações.

Júlio Camargo

O primeiro delator a citar Temer na Lava Jato foi o lobista Júlio Camargo, o mesmo que relatou repasses de 5 milhões de dólares de propina a Eduardo Cunha, que na época ainda era o todo poderoso presidente da Câmara. Em depoimento datado de março de 2015, ele revelou as relações de Fernando Soares, mais conhecido como Fernando Baiano, com Temer, Cunha e o senador Renan Calheiros (PMDB-AL)  — Baiano já foi condenado na Lava Jato como um dos operadores do PMDB no esquema.

“Havia comentários de que Fernando Soares era representante do PMDB, principalmente de Renan, Eduardo Cunha e Michel Temer. E que tinha contato com essas pessoas de ‘irmandade’”, diz relatório da PGR com base nas declarações de Camargo.  As revelações do lobista originaram a primeira denúncia de Janot contra Eduardo Cunha.

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Em depoimento, no entanto, Baiano negou ter tido qualquer contato com Renan.

Fernando Baiano

O operador do PMDB, por sua vez, relatou à PGR que Temer atuou nos bastidores da ascensão e queda de dois diretores da Petrobras — Nestor Cerveró, indicado do PT; e Jorge Zelada, do PMDB. Segundo ele, entre 2007 e 2008, Temer foi procurado por Cerveró e pelo pecuarista José Carlos Bumlai, por orientação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para resolver um impasse — a bancada do PMDB de Minas Gerais queria tirar Cerveró do cargo e colocar no lugar João Henriques, que já estava enrolado em casos investigados no Tribunal de Contas ligados à BR Distribuidora. O imbróglio foi resolvido com a escolha de Zelada para o posto. Cerveró, Henriques e Zelada foram presos e condenados na Operação Lava Jato.

Delcídio do Amaral

Em seu acordo de colaboração, o ex-senador Delcídio do Amaral afirmou que Michel Temer foi o padrinho político do lobista João Augusto Henriques no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Entre 1999 e 2000, Henriques foi diretor da BR Distribuidora sob as asas do então presidente da Câmara Temer e, segundo Delcídio, operava ilicitamente a compra de etanol de usinas de álcool pela subsidiária da Petrobras. O ex-senador contou que Temer e a bancada do PMDB na Câmara tentaram emplacar o lobista na diretoria Internacional da estatal em 2008, depois que Nestor Cerveró deixou a cadeira. Como o nome de Henriques foi barrado, ele mesmo indicou Jorge Zelada ao cargo, conforme Delcídio.

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Castelo de Areia e Porto de Santos

Para além da Lava Jato, o presidente já foi citado em outras duas investigações — uma que apurou um esquema de corrupção no Porto de Santos, no litoral de São Paulo; e outra conhecida como Castelo de Areia que investigou a construtora Camargo Corrêa, investigada hoje no petrolão.

A primeira surgiu a partir de um processo de separação litigiosa na Vara da Família em São Paulo revelado por VEJA em 2001. A então estudante Erika Santos alegava que o seu ex-companheiro Marcelo de Azeredo, ex-presidente da Companhia de Docas do Estado de São Paulo (Codesp), tinha plenas condições de lhe pagar uma pensão de 10.000 reais mensais por receber, dentre outras fontes de renda, “caixinhas e propinas” de um esquema de corrupção no Porto de Santos. Erika apontou como parceiros do seu ex-namorado no esquema Michel Temer, na época presidente do PMDB, e um “homem de sobrenome Lima”. A Procuradoria-Geral da República não viu indícios suficientes para continuar investigando o presidente e o inquérito foi arquivado, em 2011.

A segunda reunia 54 planilhas apreendidas pela Polícia Federal na residência de um executivo da Camargo Corrêa, cujo conteúdo associava o nome de diversos políticos a valores. Um deles era Temer, que foi citado 21 vezes ao lado de quantias que totalizavam 345.000 dólares, segundo revelou reportagem do jornal O Estado de S. Paulo em 2009. Dois anos depois, o Superior Tribunal de Justiça (STF) considerou a operação ilegal por se basear em denúncias anônimas.

O presidente sempre negou veemente ter participado desses esquemas.

 

 

 

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