Nos dois meses de atuação da intervenção federal no Rio de Janeiro, o número de chacinas dobrou na comparação com o mesmo período de 2017. No ano passado, foram seis episódios que resultaram na morte de 22 pessoas. De 16 de fevereiro, quando a intervenção foi decretada, a 15 de abril de 2018, foram registadas 12 chacinas, com a morte de 52 pessoas.
Os dados estão em relatório do Observatório da Intervenção, que reúne várias entidades da sociedade civil e faz o acompanhamento diário dos trabalhos na segurança pública desde fevereiro. Segundo a coordenadora do Observatório, Sílvia Ramos, no período da intervenção ocorreram episódios graves de descontrole policial.
“Quando a gente compara o Rio sob intervenção com o que havia antes, a gente percebe que as condições de segurança e de criminalidade ou se mantiveram num nível tão alto como havia antes ou então pioraram, como é o caso dos crimes contra o patrimônio, os roubos e roubos de rua”, avaliou a especialista.
O Observatório monitorou 70 operações desde o início da intervenção, que tiveram o emprego de 40 mil agentes, resultaram na morte de 25 pessoas e na apreensão de 140 armas, sendo 42 fuzis. Os dados do aplicativo Fogo Cruzado mostram que o número de tiroteios aumentou no período. Nos dois meses antes da intervenção, foram registrados 1.299 tiroteios no estado, enquanto nos dois meses seguintes ao decreto, o número foi para 1.502, um aumento de 15,6%. Esses tiroteios deixaram 294 mortos e 193 feridos.
Os pesquisadores apresentaram a evolução dos indicadores de segurança no estado nos últimos anos. Os dados revelam que não houve um aumento significativo da taxa de letalidade violenta de 2016 para 2017. Em fevereiro e março deste ano foram 940 homicídios, 209 homicídios decorrentes de intervenção policial e 19 policiais mortos.
Sobre a sensação de insegurança, o levantamento aponta que 92% da população do Rio de Janeiro têm medo de ser atingida por bala perdida, de morrer ou ser ferido em assalto e de ficar no meio de tiroteio entre polícia e bandidos. E 70% disseram ter medo de sofrer violência por parte da Polícia Militar.
Para a coordenadora de pesquisa da Anistia Internacional no Brasil, Renata Neder, a intervenção federal aprofunda um modelo de política de segurança pública que não funciona. “É o modelo da militarização, baseado na lógica do confronto, da guerra, da guerra às drogas. Esse modelo a gente já sabe que não dá certo, que se traduz em operações policiais de enfrentamento cotidiano em favelas e periferias”, avalia.
O coronel Ibis Pereira, ex-comandante-geral da Polícia Militar do Rio de Janeiro, destacou que os dados divulgados no relatório são muito ruins e indicam que a intervenção encontra dificuldades no seu rumo. Para ele, é uma oportunidade para os gestores corrigirem a rota. O coronel também aponta que é preciso reestruturar as polícias e fazer um melhor controle do uso da força.
Em nota, o Gabinete de Intervenção Federal informou que “está dedicado aos objetivos estabelecidos de diminuir progressivamente os índices de criminalidade e fortalecer as instituições da área de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro”. “Medidas emergenciais e estruturantes estão sendo tomadas e serão observadas ao longo do período previsto de intervenção federal”, diz a nota.
Perguntado sobre o aumento dos tiroteios, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, disse, após cerimônia de premiação do Selo Resgata, no Palácio do Planalto, que isso sempre ocorre quando se inicia um processo de mudança como o proporcionado pela intervenção no Rio de Janeiro. “Há uma mudança que inclusive rompe os laços entre aqueles dentro do sistema de segurança pública que estão ligados”, disse.
(com Agência Brasil)