Em seu acordo de delação premiada, cujo conteúdo foi divulgado nesta quinta-feira, o marqueteiro João Santana relatou à Procuradoria-Geral da República como foi chamado para trabalhar para a campanha à reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006 — ali começaria a próspera relação entre o publicitário e o partido que durou até o início do ano passado, quando entrou na mira da Operação Lava Jato.
Segundo Santana, ele foi contratado inicialmente para resolver a crise que o PT enfrentava pela descoberta do escândalo do mensalão. As primeiras tratativas teriam sido feitas com o ex-ministro Antonio Palocci, que lhe disse, num encontro em agosto de 2005, em Brasília, que, se Lula se saísse bem da crise, seria candidato no ano seguinte. Santana substituiria, assim, o seu ex-sócio e publicitário Duda Mendonça, que fez a campanha vitoriosa de Lula em 2002 e fora atingido pelas investigações do mensalão.
À procuradoria, João Santana afirmou que Lula tinha conhecimento dos pagamentos por fora efetuados à sua empresa, a Pólis. E que ouviu diversas vezes de Palocci que as decisões dependiam da “palavra final do chefe” — no caso, Lula.
“Apesar de nunca ter participado de discussões finais de preços ou contratos, tarefa de Mônica Moura, João Santana participou dos encaminhamentos iniciais e decisivos com Antonio Palocci. Nestes encontros, ficou claro que Lula sabia de todos os detalhes, de todos os pagamentos por fora recebidos pela Pólis, porque Antonio Palocci, então ministro da Fazenda, sempre alegava que as decisões definitivas dependiam da ‘palavra final do chefe'”, diz trecho da delação premiada do publicitário, que já foi homologada pelo Supremo Tribunal Federal.
Santana também descreveu um diálogo que teve com Palocci durante os acertos dos pagamentos. Segundo ele, o ex-ministro lhe perguntou se ele tinha alguma conta no exterior. Santana respondeu que sim porque já havia feito campanhas na Argentina. O ministro, então, afirmou que, “para segurança de todos”, as transferências de dinheiro não oficial seriam feitas pela Odebrecht, empresa que tinha “o respaldo do chefe”.
‘Alerta vermelho’
Na Pólis, quem cuidava da parte financeira era a sua mulher e sócia, Mônica Moura, que também fechou delação premiada. No entanto, quando o PT deixava de pagar a conta “em momentos críticos de inadimplência”, era João Santana quem avisava pessoalmente Lula — e depois, Dilma Rousseff — sobre as dívidas.
Segundo ele, em duas ocasiões, emitiu a Lula o chamado “alerta vermelho” — ameaça de interromper os trabalhos. Na oportunidade, conforme o marqueteiro, o ex-presidente pressionou Palocci para resolver o problema, que, por sua vez, “colocou a Odebrecht no circuito”. Posteriormente, ele viria a descobrir que o ex-ministro da Fazenda “tinha poder quase que absoluto” sobre o fundo de caixa dois abastecido pela empreiteira.
Em nota assinado por seus advogados, o ex-presidente Lula afirmou categoricamente que as declarações de João Santana são “mentirosas” e que os delatores se basearam em “supostas conversas com terceiras pessoas, ao ouvir dizer ou a conclusões subjetivas”.
Confira a nota na íntegra publicada pela defesa de Lula:
O ex-presidente Lula nunca tratou direta ou indiretamente do financiamento das campanhas eleitorais em que foi candidato ou apoiador. Lula sempre considerou este assunto de competência dos tesoureiros do partido e das campanhas, que prestam contas à Justiça Eleitoral. São mentirosas, portanto, as afirmações atribuídas ao Sr. João Santana e à Sra. Monica Moura, claramente vinculadas à negociação de benefícios penais na Operação Lava Jato. Hoje está muito claro que citar o nome de Lula tornou-se condição obrigatória para que réus e até condenados obtenham os favores na promotoria no âmbito da Operação Lava Jato. Há pedido formal de investigação protocolado na Procuradoria Geral da República com base em denúncia veiculada por órgãos de imprensa. Nenhum dos delatores, no entanto, apresentou qualquer prova das menções feitas a Lula. Todas as menções se referem a supostas conversas com terceiras pessoas, ao ouvir dizer ou a conclusões subjetivas. Uma ação penal se decide na base de provas. E provas contra Lula não há, porque ele sempre atuou dentro da lei.