O fascínio pela astronomia me acompanha desde muito cedo. Era pequeno, e queria saber o porquê de tudo — o de o Sol me seguir, o de a Lua se transformar, e por aí vai. Minha mãe, professora de sociologia, e meu pai, garçom, não tinham conhecimento para desvendar tais mistérios. Mas a escola me trouxe respostas. As aulas de matemática e ciências me ajudavam a encontrar padrões e lógica nas coisas do dia a dia. Os professores perceberam meu interesse e me incentivavam a participar de olimpíadas na área de exatas, o que acabei fazendo em 2020, aos 14 anos. Fiquei confinado em casa, em Barueri, São Paulo, com a TV quebrada e sem dinheiro para o conserto. Aí me vi sem videogames, e comecei a estudar sem parar. Assim dei o primeiro passo em um universo completamente novo e vibrante, o das olimpíadas de astronomia. A primeira medalha veio na competição nacional e, desde então, já ganhei várias delas e virei um divulgador dessa ciência que sempre fez meu coração bater.
Quando você entra para um mundo tão incrível, quer ir o mais longe que puder. Em 2021, estreei no circuito internacional na Olimpíada Latino-Americana de Astronomia. Levei a medalha de ouro e um prêmio de melhor prova teórica. Aquilo me deu um gás, e decidi me testar na Olimpíada Asiática de Física, em que faturei uma menção honrosa. Até ali, com a pandemia de Covid-19 limitando as viagens, nos fechando em casa, havia feito as provas a distância. Quando enfim entrei num avião, rumo à Georgia, no Leste europeu, para tentar mais um pódio ao lado da comitiva brasileira, fui tomado de uma emoção imensa. E conquistei o ouro, o primeiro do Brasil em uma disputa presencial na astronomia. Topei então o próximo desafio: a Olimpíada Internacional de Física, no Japão. Foram as mais difíceis provas que eu fiz. Eles recebem lá todo tipo de incentivo para desbravar as constelações, como não costumamos ver no Brasil. Por isso, valorizei tanto a prata naquele torneio.
Competições dessa natureza demandam muito de quem participa, e me preparo para valer. Você precisa ter fôlego para encarar essa rotina que combina aprendizado e testes puxados em um ambiente de alta cobrança, lado a lado com os melhores estudantes do planeta. Em agosto, fui à Polônia para a Olimpíada de Astronomia e Astrofísica. Foram onze dias de avaliações intensas, tanto práticas como teóricas. Muita gente me pergunta se fico nervoso. Sim, fico, e muito. A espera dos resultados também é cercada de ansiedade. Sentado no salão polonês onde anunciariam os vencedores, ouvi chamarem os laureados com o bronze, a prata, e nada do meu nome. Ele estava na lista dos ouros. Subi ao palco e lembrei de todo o trabalho duro, do apoio dos meus pais, de amigos e mentores, e de como luto para avançar a cada dia.
A astronomia ainda é uma ciência pouco divulgada no Brasil. Sem o apoio da minha escola, um colégio particular, não teria conseguido arcar com tantos custos — os livros são caríssimos. Fico pensando que uma multidão de alunos não tem nem aulas básicas de ciências. Quero espalhar o saber que acumulei e contribuir, na medida do possível, para a melhora da educação. Tiro dúvidas de competidores em grupos on-line e pretendo participar das olimpíadas como mentor. Às vésperas de concluir o ensino médio, ando dedicado aos processos de admissão em universidades estrangeiras. Meu sonho é conseguir uma vaga no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT. Tomara que meus 21 prêmios em olimpíadas ajudem. O plano é me tornar engenheiro elétrico, para impulsionar o setor de energia solar. Assim, posso usar o que aprendi para trabalhar em prol do meio ambiente. A astronomia me ensinou muito sobre humildade, de como somos pequenos perto das galáxias, e também me mostrou que, em se tratando de conhecimento, o céu não é o limite.
Paulo Henrique Silva em depoimento dado a Paula Freitas
Publicado em VEJA de 15 de setembro de 2023, edição nº 2859