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Pesquisa brasileira usa nanotecnologia para tratar artrose em cães idosos

Novo formato do medicamento aumenta a eficácia contra dor e inflamação, proporcionando alívio mais rápido e qualidade de vida aos cachorros

Por Roseli Andrion | Agência Fapesp
19 ago 2025, 13h00

Cães idosos podem mancar, ter dificuldade para se levantar ou relutar para passear. Essas características são próprias de animais com artrite e afetam a qualidade de vida dos pets. Agora, um medicamento aprimorado por uma cientista brasileira pode trazer alívio para esses sintomas e mudar a realidade de milhões de cães.

Luiza de Oliveira Macedo dedicou-se a estudar uma forma de melhorar a ação do anti-inflamatório firocoxibe, já utilizado no tratamento de artrose em cães. A fórmula está disponível no Brasil em forma de comprimidos, mas tem baixa solubilidade — ou seja, não se dissolve bem no organismo dos animais, o que atrapalha a sua absorção e, consequentemente, o seu efeito terapêutico.

O desafio, então, era fazer o medicamento funcionar melhor. A resposta veio da nanotecnologia: ao transformar o firocoxibe em nanocristais — partículas muito pequenas, quase invisíveis a olho nu —, ele passa a se dissolver com muito mais facilidade no organismo. “Para ser absorvido e ter efeito, ele precisa se dissolver. A nanotecnologia é um recurso para aumentar a solubilidade do fármaco e permitir o combate à dor e à inflamação causadas pela artrose”, explica ela.

Enquanto uma fórmula convencional tem partículas em torno de 20 a 30 micrômetros (μm), uma substância submetida a uma moagem de alta energia pode ter as partículas reduzidas para 250 a 270 nanômetros (nm). “O medicamento que obtivemos tem partículas de 200 nm.” Soluções com nanocristais já existem para medicamentos humanos, mas o firocoxibe veterinário desenvolvido por Macedo é pioneiro no segmento. “Até onde sabemos, não há nada parecido na literatura científica nem no mercado.”

União de vontades

A proposta nasceu do desejo de Macedo de se aprofundar em tecnologia farmacêutica. Para isso, ela procurou a professora Nádia Araci Bou-Chacra, orientadora de sua pesquisa de doutorado na Universidade de São Paulo (USP), e se envolveu com o projeto em parceria com o Laboratório Duprat, que queria explorar o uso da nanotecnologia na veterinária. “Foi uma união de vontades: eles queriam inovar e eu queria aprender mais sobre essa área.”

No decorrer da pesquisa, Macedo desenvolveu o protótipo do novo medicamento. Os testes iniciais, feitos em laboratório, permitiram entender as características do produto. Depois, o experimento foi ampliado para testes em cães saudáveis, e os resultados surpreenderam. “A concentração do fármaco no sangue desses pets foi o dobro da obtida com o produto convencional. Isso mostra que o novo formato é muito mais eficiente.”

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Como o firocoxibe é usado para tratar dores e inflamações, esse ganho de eficácia pode fazer uma enorme diferença na qualidade de vida de animais doentes. “Isso representa um potencial para aliviar a dor desses cães muito mais rapidamente”, detalha ela.

Formada em farmácia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Macedo sempre teve foco na área humana. “Quando surgiu a chance de trabalhar com fármacos para cães, eu vi uma oportunidade de aprender algo novo e desafiador”, destaca. “Existem várias particularidades que exigem soluções específicas: cada detalhe precisa ser estudado especificamente para cães, desde como o medicamento é absorvido até como ele é eliminado do organismo. Isso me encantou.”

A descoberta chega em um momento em que a expectativa de vida dos pets tem aumentado e os tutores cuidam cada vez melhor desses animais. Segundo o Instituto Pet Brasil, existem mais de 54 milhões de cães no país. Com o envelhecimento, algumas doenças, como a artrite, tornam-se mais comuns — e medicamentos mais eficazes são necessários para melhorar a vida de milhões de famílias. “As pessoas têm cuidado mais dos animais. Como eles vivem mais, essas doenças podem aparecer no processo de envelhecimento”, observa.

Até o mercado

O protótipo foi sintetizado em pequenas quantidades, com cerca de 7 gramas por vez. A próxima etapa é avançar para a escala industrial. “Fiz testes preliminares em um moinho maior e consegui produzir 3 quilos de medicamento com as mesmas características”, conta. “Isso mostra que o processo tem potencial para ser escalonado.”

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Apesar dos bons resultados obtidos, o desenvolvimento do medicamento ainda tem algumas etapas a percorrer antes de chegar às prateleiras. “Estimo que sejam necessários de três a quatro anos para chegar ao mercado. É preciso cumprir várias etapas regulatórias determinadas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento [Mapa]”, avalia. “Já enviamos o pedido de patente ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial [INPI] para proteger a inovação.”

Segundo Macedo, a patente era uma preocupação constante durante o desenvolvimento. “A todo momento surgem novos artigos e novas patentes que envolvem nanocristais. Durante o processo, havia muita apreensão de que pudéssemos ser ultrapassados por outros pesquisadores.” A patente garante que a inovação desenvolvida no Brasil fique protegida por 20 anos, tempo suficiente para a empresa recuperar o investimento e lucrar com a descoberta.

Fomento

Um dos grandes trunfos do projeto foi o apoio recebido do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. Isso foi fundamental para dar confiança à empresa parceira. “Como a nanotecnologia é nova na área veterinária, eles ficaram um pouco receosos”, lembra.

Além disso, o programa incentivou a pesquisadora a sair do laboratório e conversar com veterinários e donos de pets para entender o que eles realmente precisavam. “A FAPESP foi essencial: além do apoio financeiro, eles nos levaram a conversar com o mercado e entender o que o cliente buscava”, explica. “Tivemos de determinar o que eles esperavam de um produto veterinário, e as respostas foram surpreendentes. Descobrimos que eles se preocupam não só com a eficácia, mas também com a forma de administração, o sabor e até a embalagem.”

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Macedo conta que se orgulha de ajudar a aproximar a ciência do mercado. “Muitas vezes, o que a gente desenvolve na universidade fica parado. Ver esse projeto com chance real de chegar aos animais é, de fato, muito gratificante”, comenta.

Versatilidade e possibilidades

Embora ainda não saiba quanto o medicamento deve custar, Macedo avalia que o preço possa ser similar ao que já existe no mercado. “Os aparatos usados para preparar os nanocristais não são muito caros”, explica. “Mesmo assim, um produto com nanotecnologia tem mais valor agregado.”

Ela aponta que a nanotecnologia é muito versátil. “Se o fármaco não for muito solúvel, a gente pode tentar melhorá-lo.” Com isso, essa descoberta pode ser útil no aprimoramento de outras fórmulas com dificuldades similares de absorção. “Existe uma tendência de otimizar fármacos com diminuição de dose ou melhoria na eficácia, por exemplo. Há espaço para crescer tanto na medicina humana quanto na veterinária”, avalia.

O projeto mostra como a ciência brasileira pode criar inovações que beneficiam diretamente a população. “A gente fez o desenvolvimento, caracterizou o material, fez testes de toxicidade e testes em animais”, resume Macedo. Tudo isso no Brasil, com recursos nacionais e conhecimento desenvolvido em universidades públicas. “E o mais legal é saber que, no fim das contas, quem se beneficia são as pessoas — e seus pets.”

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