Fortaleça o jornalismo: Assine a partir de R$5,99
Imagem Blog

Augusto Nunes

Por Coluna Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Com palavras e imagens, esta página tenta apressar a chegada do futuro que o Brasil espera deitado em berço esplêndido. E lembrar aos sem-memória o que não pode ser esquecido. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

‘O Palácio e os ‘movimentos sociais”, um artigo de Demétrio Magnoli

Publicado no Globo desta quinta-feira DEMÉTRIO MAGNOLI “É um absurdo vender isso. A sociedade não participou do debate sobre o tema. Nossa tentativa é sensibilizar o governo para negociar e discutir.” As sentenças, de Francisco José de Oliveira, diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), referiam-se ao leilão de Libra, na faixa do pré-sal. Mas […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 05h07 - Publicado em 24 out 2013, 16h57

Publicado no Globo desta quinta-feira

DEMÉTRIO MAGNOLI

“É um absurdo vender isso. A sociedade não participou do debate sobre o tema. Nossa tentativa é sensibilizar o governo para negociar e discutir.” As sentenças, de Francisco José de Oliveira, diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), referiam-se ao leilão de Libra, na faixa do pré-sal. Mas a lógica subjacente a elas, expressa na segunda frase, nada tem de singular. Nas duas últimas décadas, os “movimentos sociais” repetem aborrecidamente a ladainha sobre “a sociedade” excluída do “debate”, enquanto invadem órgãos públicos em nome da “participação”. Vivemos nos tempos do supercorporativismo, um ácido corrosivo derramado sobre o material de nossa democracia.

Continua após a publicidade

O Brasil moderno nasceu, pelo fórceps de Getúlio Vargas, sob o signo do corporativismo. A “democracia social” do Estado Novo cerceava os direitos do indivíduos, subordinando-os a direitos coletivos. Na definição do historiador Francisco Martinho, “o cidadão nesse novo modelo de organização do Estado era identificado através de seu trabalho e da posse de direitos sociais e não mais por sua condição de indivíduo e posse de direitos civis ou políticos” (O corporativismo em português, Civilização Brasileira, 2007, p. 56). Inspirado no salazarismo português e no fascismo italiano, o corporativismo varguista organizou a sociedade como uma família tripartida: governo, sindicatos patronais e sindicatos de trabalhadores. O supercorporativismo, uma obra do lulopetismo, infla o balão do corporativismo original até limites extremos.

Um traço forte, comum a ambos, é o desprezo pelos direitos civis e políticos, que são direitos individuais associados à ordem da democracia representativa. A principal diferença encontra-se no atributo nuclear da cidadania: o cidadão varguista definia-se pelo trabalho; o cidadão lulopetista define-se pela militância organizada. No Estado Novo, a carteira de trabalho funcionava como atestado de inserção na ordem política nacional. Sob o lulopetismo, o documento relevante é a prova de filiação a um “movimento social”. Na invasão do Ministério das Minas e Energia, junto com a FUP, estavam líderes do Movimento dos Sem Terra (MST) e do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) — que, em tese, não têm interesse no tema da exploração do pré-sal. A sociedade, segundo o supercorporativismo, é a soma das entidades sindicais e dos “movimentos sociais”. É por isso que, sem o consenso dessas corporações da nova ordem, nenhum assunto jamais estará suficientemente “debatido”.

Lula nasceu no berço do sindicalismo. O PT estabeleceu, na origem, íntimas relações com os “movimentos sociais”. Nas democracias, a sociedade civil organiza-se para exercer pressão legítima sobre os poderes de Estado. O lulopetismo, porém, borrou a fronteira entre sociedade civil e Estado assim que chegou ao governo: sua reforma da CLT estendeu a partilha do imposto sindical varguista às centrais sindicais, enquanto os “movimentos sociais” passaram a receber financiamento público direto ou indireto. O cordão umbilical que liga o poder de Estado aos “movimentos sociais” é a Secretaria Geral da Presidência, um ministério estratégico chefiado por Luiz Dulci, no governo Lula, e por Gilberto Carvalho, no governo Dilma Rousseff. Os dois engenheiros do edifício do supercorporativismo pertencem ao círculo de fiéis incondicionais de Lula.

Continua após a publicidade

O PT sempre enxergou os “movimentos sociais” como tentáculos partidários. Os líderes mais destacados desses movimentos são militantes petistas. O financiamento público elevou a conexão a um novo patamar: na última década, eles se converteram em satélites do Palácio. Os dirigentes do MST, do MAB e de inúmeros movimentos similares ajustam suas agendas políticas às do Partido e cerram fileiras com o lulopetismo nos embates eleitorais. Durante a odisseia do mensalão, eles desceram às trincheiras enlameadas para proteger José Dirceu et caterva. Contudo, na dialética do supercorporativismo, os “movimentos sociais” também precisam promover mobilizações contra o governo, sob pena de se condenarem à irrelevância.

O corporativismo varguista almejava a harmonia social. No mecanismo de regulação do lulopetismo, a desordem é um componente da ordem. Os “movimentos sociais” palacianos produzem fricções cíclicas, que são reabsorvidas pelo recurso a negociações simbólicas e compensações materiais. A extensão inevitável do “direito à desordem” a movimentos controlados por facções dissidentes (PSOL, PSTU) provoca perturbações suplementares, mas, paradoxalmente, robustece os alicerces lógicos do supercorporativismo. Os invasores do Ministério de Minas e Energia são obrigados a confirmar periodicamente seu estatuto de interlocutores privilegiados do poder por meio de ações de contestação limitada da ordem.

A democracia representativa ancora-se no princípio da soberania popular, que é exercida por meio da delegação de poder, em eleições gerais. O sistema político-partidário brasileiro desmoraliza a representação para assegurar privilégios especiais a uma elite política de natureza patrimonialista. O lulopetismo, um sócio majoritário desse sistema, aproveita-se de seus desvios para erguer o edifício do supercorporativismo como esfera paralela de negociação política. Na dinâmica extraparlamentar do supercorporativismo, o Partido pode ignorar as demandas dos cidadãos comuns, dialogando exclusivamente com a casta mais ou menos amestrada de dirigentes dos “movimentos sociais”. Sabe com quem está falando? Você só é alguém se possuir a carteirinha de um “movimento social” ─ eis a mensagem veiculada pelo Palácio.

Continua após a publicidade

Nas “jornadas de junho”, manifestações multitudinárias falaram em “saúde” e “educação”, reivindicando direitos universais estranhos à lógica do supercorporativismo. Por isso, nervoso e assustado, o Partido as rotulou como uma “reação da direita”. Ah, bom…

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.