Publicado na Coluna de Carlos Brickmann
Tudo o que se discute sobre a divulgação da troca de mensagens entre os procuradores da Lava Jato e o então juiz Sergio Moro, hoje ministro, é fácil de entender: quem é a favor de anular os julgamentos de Lula e libertá-lo imediatamente acha que juiz e procuradores manifestaram sua parcialidade e, portanto, se deve anular os processos; quem é a favor de manter Lula preso acha que os diálogos publicados pelo The Intercept ou são falsos ou estão dentro da lei, e que se deve, isso sim, descobrir quem violou ilegalmente o sigilo do juiz e dos procuradores, processar os responsáveis e botá-los na cadeia.
É como pênalti no futebol: se é contra nosso time, é claramente uma má interpretação da jogada. Se é a favor, foi flagrante, indecente, bem marcado. E, como no caso do pênalti, há uma ínfima minoria que procura analisar os fatos à luz da lei. E que dizem os especialistas neutros? Há quem diga que sim, há quem diga que não. Depende do caro leitor: em quem confia mais?
Isso quer dizer que a questão será resolvida politicamente. Como Moro se mostrou capaz de resistir ao The Intercept e até de ser aplaudido num estádio — embora usasse camiseta do Flamengo em que aparecia por baixo sua gravata (estava também de paletó), embora seja razoável supor que não tivesse a menor ideia de quem era a bola — tudo acabe em pizza. No dia 30 haverá grandes passeatas bolsonaristas e ele estará blindado, ao menos até que Carluxo, o filho 02, implique com ele. Mas segurança total é uma ilusão.
Vida agitada
Moro, quem diria, já esteve no Programa do Ratinho, o que ninguém iria imaginar. Hoje vai ao Senado, diante de uma plateia majoritariamente hostil, para defender a Lava Jato e o Projeto Anticrime. O projeto anticrime já ficou para o segundo semestre. No caso Lava Jato, terá o apoio dos evangélicos, mas de novo as bancadas governistas permitiram que a oposição ocupasse a maior parte das posições entre os debatedores. Apesar disso, Moro só tem de se manter sereno para sair-se bem. Se perder a calma, entrar em bate-bocas, jogará contra seu próprio time. O que neste Governo, aliás, não é novidade.
A linha de defesa
Moro deve adotar, no debate, algumas posições do tipo “meu time é que tem razão”. Tentará deixar de lado o conteúdo das mensagens, dando grande importância à maneira como foram obtidas, que classificará de inaceitável, ilegal. Pode desmentir uma ou outra transcrição, certamente pedirá que seja publicada a íntegra da interceptação, talvez diga que, mesmo verdadeiras, as mensagens não indicam nenhuma violação da lei. Moro tem uma situação privilegiada: com ou sem transcrições, mantém alto nível de popularidade.
Pesquisa favorável…
Na véspera do comparecimento de Moro ao Senado, saiu a pesquisa Ibope encomendada pela CLP — Liderança Pública, grupo sem fins lucrativos cujo objetivo declarado é contribuir para melhorar a vida dos brasileiros. Ao lado da CLP, há 77 entidades apartidárias, entre elas federações do Comércio e da Indústria, e think-tanks do pensamento econômico liberal, como o Instituto Millenium e o Instituto Mises. CLP e a rede de entidades têm como objetivo divulgar, sob o nome Apoie a Reforma, a reforma da Previdência; e estimular movimentos de cidadãos em favor de reformas estruturais.
Agora, a pesquisa: 82% são favoráveis a que a atual geração se esforce para garantir a aposentadoria às gerações futuras. E 45% defendem o sistema de capitalização, onde cada trabalhador forma um fundo individual que possa complementar, com seus rendimentos, o salário do aposentado. A proposta de reforma apresentada pelo Governo (e que pode ser mudada no Congresso, o que deve acontecer) tem o apoio de 44% dos pesquisados.
…mas cuidado
A pesquisa é favorável, mas é preciso levar em conta que os pesquisados não têm como fazer a conta para saber se vão ou não ganhar mais. Há ótimos economistas que fizeram a conta e concluíram que não há como reformar a Previdência, ao menos agora, incluindo a capitalização. Falta dinheiro.
O tamanho do rombo
A multibilionária Odebrecht, do grupo que mais vezes foi denunciado em delações premiadas, cujo principal diretor (e herdeiro) foi preso por um longo período, é multibilionária também em dívidas: quer recuperação judicial (a antiga concordata) para negociar R$ 65 bilhões com seus credores. A Odebrecht resistiu o quanto pôde a essa solução, mas teve de recorrer a ela quando a Caixa Econômica Federal passou a executar as garantias de suas dívidas. O problema não é apenas o montante dos débitos: é a resistência de possíveis clientes futuros, impressionados com o volume de más notícias que atingiu a empresa desde o início da Operação Lava Jato.
Quem compra?
Simultaneamente, a Odebrecht perdeu clientes como Cuba, Venezuela, Angola; esses clientes também já não chegam ao BNDES. Tempos difíceis.