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Editorial do Estadão: O caso Battisti

O avião que levou Cesare diretamente da Bolívia para a Itália levou junto a vergonha internacional causada ao País pelo governo do PT

Por Augusto Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 20h02 - Publicado em 15 jan 2019, 13h40

“Agora eu sei que vou para a prisão”. A resignação contida na declaração do italiano Cesare Battisti, ao desembarcar em Roma, na manhã de ontem, diz muito sobre seu longo passado de fugas e disfarces. Diz especialmente sobre os anos que se seguiram a 2005, quando o Conselho de Estado da França, onde estava foragido, confirmou sua extradição para a Itália e Battisti veio dar nestas terras.

Aqui, Battisti viu a cadeia de longe durante a maior parte do tempo. Sentia-se tão confortável no País que decidiu até escolher um time de futebol para torcer. Deu entrevistas para jornais e emissoras de TV e foi cortejado por políticos e ativistas da esquerda. O criminoso tinha motivos para estar tranquilo até há bem pouco.

Condenado à prisão perpétua pela Justiça italiana pelos assassinatos de quatro pessoas entre 1977 e 1979, Cesare Battisti contou com o beneplácito do ex-presidente Lula da Silva e de outros próceres petistas, que sempre estiveram mais interessados em fazer propaganda política ─ comprando e revendendo barato a versão segundo a qual Battisti seria um “perseguido político” ─ do que em respeitar uma decisão judicial inapelável, dada pelo Poder Judiciário de uma nação soberana ao fim de um processo em que foi garantido o mais amplo direito de defesa ao réu.

O avião que levou Battisti diretamente da Bolívia para a Itália levou junto a vergonha internacional causada ao País pelo governo do PT ─ mais uma ─ e seus prosélitos. Encerra-se um imbróglio político e judicial que já deveria ter sido resolvido há muito tempo caso as relações internacionais e o respeito aos princípios do Estado Democrático de Direito tivessem prevalecido sobre as paixões ideológicas que animam as hostes petistas.

Em 2009, o então ministro da Justiça, Tarso Genro, concedeu status de “refugiado político” para Battisti, contrariando parecer fundamentado do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) do Ministério das Relações Exteriores. Em fevereiro do mesmo ano, o Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão esdrúxula, considerou que o pedido de extradição feito pelo governo italiano era procedente, mas a decisão de extraditar ou não Battisti cabia ao então presidente da República. No último dia de mandato, 31 de dezembro de 2010, Lula da Silva não decepcionou e chancelou a farsa da “perseguição política”, e negou a extradição, como se a Itália fosse uma republiqueta qualquer.

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A situação de Battisti só começou a mudar no final do governo do presidente Michel Temer, que atendeu a um pedido de reconsideração feito pelo governo italiano e determinou a extradição de Battisti após o ministro Luiz Fux, do STF, revogar uma liminar que ele mesmo havia concedido em 2017 proibindo a entrega do italiano à Justiça de seu país.

A prisão de Cesare Battisti na Bolívia e o imediato envio do criminoso às autoridades italianas, sem passar pelo Brasil, frustrou a expectativa do presidente Jair Bolsonaro de explorar politicamente sua captura. A própria revisão do pedido de extradição, uma das promessas de campanha de Bolsonaro, já havia sido feita pelo governo de seu antecessor.

Agiu bem o presidente Evo Morales, que de pronto fez o que o governo brasileiro deveria ter feito há anos. Especula-se sobre as razões de ordem prática que o teriam levado a tomar a decisão que tomou. Isso agora pouco importa. Fato é que a Bolívia agiu neste episódio como um Estado que respeita as normas do direito internacional.

Ao fim e ao cabo, não interessa quem irá obter dividendos políticos com a extradição de Cesare Battisti. O que importa é que, a partir de agora, um criminoso condenado em última instância pelas mortes de quatro pessoas inocentes, em nome de seu ativismo político, irá cumprir sua pena após o fim de um longo processo em que lhe foram dadas todas as garantias de defesa. Para o Brasil, fica a lição: quando relações de amizade e de afinidade ideológica orientam decisões de Estado, o prestígio e a reputação internacional do País se esvaem em irrisão e opróbrio.

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