Publicado no Estadão
ELIANE CANTANHÊDE
Henrique Pizzolato vem aí, trazendo com ele doloridas lembranças do mensalão e reavivando a certeza de que, na era PT, a política desenfreada de ocupação de estatais e bancos públicos não se resumiu à Petrobras. O Banco do Brasil foi uma das vítimas, mas se defendeu.
Petrobras e BB viraram o paraíso de petistas e sindicalistas, mas com uma diferença: os funcionários da petroleira não viram, não ouviram e não falaram nada nesses anos todos, enquanto os do banco souberam botar a boca no trombone na hora certa, já em 2003, meses depois da posse de Lula. Foi assim que o BB resvalou nos escândalos, mas – pelo que se sabe até agora – não afundou neles, como a Petrobras.
Ao tomar posse, Lula até que tentou emplacar um sindicalista do PT na presidência do Banco do Brasil, assim como fizera na da Petrobras, mas os escolhidos não tinham diploma de nível superior, uma exigência do estatuto da instituição. Pensou-se inclusive em mudar o estatuto, mas seria um pouco demais. Os funcionários puseram-se em alerta.
Fora da presidência, os petistas jogaram-se com unhas e dentes nas demais instâncias do BB. Cinco dos sete vice-presidentes eram vinculados ao PT e só escaparam dois, o de Agronegócio e o de Negócios Internacionais. À época, o então presidente da Associação Nacional dos Funcionários do BB (Anabb), Valmir Camilo, me deu sua versão, um tanto preconceituosa, para essas duas exceções: os sindicalistas do PT não entendiam de agronegócio, só de MST, e não podiam assumir a vice internacional porque não falavam uma palavra de inglês.
Além das vices, os “companheiros” abocanharam oito das 15 diretorias, sete das dez gerências gerais e as três joias da coroa: Previ (fundo de pensão), Cassi (plano de saúde) e Fundação BB (programas sociais e culturais). Além do presidente, cinco dos seis diretores do Conselho Diretor da Previ, maior fundo de pensão da América Latina, com patrimônio de R$ 38 bilhões em 2003, passaram às mãos de petistas a partir da posse de Lula.
Voltemos pois a Pizzolato, funcionário de carreira do Banco do Brasil, militante do PT, sindicalista atuante e ex-presidente da CUT no Paraná. Em 2002, ele trabalhou diretamente com o tesoureiro da candidatura Lula, o agora famoso Delúbio Soares, e apresentava-se por aí com sua curiosa gravatinha borboleta e um cartão de visitas poderoso: “Henrique Pizzolato – do Comitê Financeiro”.
Eleito Lula, Pizzolato voltou por cima ao BB, como diretor de Marketing (um dos oito diretores petistas), e não demorou muito para aprontar das suas. Já em 2004, foi pego com a boca na botija quando o BB comprou R$ 73,5 mil em ingressos de um show de Zezé di Camargo e Luciano para arrecadar fundos para… a nova sede do PT.
Depois, Pizzolato foi flagrado levando para casa a bagatela de R$ 356 mil em dinheiro vivo, numa dessas confusões nunca bem explicadas, e foi condenado a 12 anos e sete meses de cadeia no escândalo do mensalão. Diferentemente dos demais réus, fugiu. Usando o nome de um irmão morto, foi curtir sua dupla cidadania na Itália, até acabar preso.
Os excessos de Pizzolato, aliados à coragem de funcionários de carreira, alertaram a imprensa desde o início para o aparelhamento e o tsunami que estava se armando. Foi assim que o Banco do Brasil, aparentemente, escapou da tragédia que assolou a nossa Petrobrás e, quem sabe, outros bancos e empresas públicas do País. E é por isso que uma Lei de Responsabilidade das Estatais, desde que bem discutida e com objetivos claros, é muito bem-vinda.
Quando se enrolou com o show pró-PT, Pizzolato me deu uma entrevista em que foi irônico, às vezes até sarcástico, apostando que nada iria lhe acontecer: “Já comemos [ELE E O PT]torresmo com muito mais cabelo”. Agora, é saber se tem torresmo na Penitenciária da Papuda, com ou sem cabelo.