Guilherme Fiúza (publicado na Gazeta do Povo)
Conversa entre dois guardiões da democracia:
— Viu que a reforma da Previdência foi aprovada na Comissão Especial?
— Vi. Que mer… Quer dizer, que ótimo.
— Pois é. O Brasil talvez consiga avançar apesar desse governo.
— Usina de crises…
— Nem fala. O Rogério Marinho, negociador da reforma, teve que dar nó em pingo d’água.
— O cara é bom.
— Nem parece que é do governo.
— Pra mim nem é.
— Bom, ele é secretário especial do Ministério da Economia.
— E daí? Qualquer um podia ter posto ele lá.
— Verdade. O Paulo Guedes também, qualquer um podia ter posto…
— Posto Ipiranga.
— Isso! Tava ali no caminho, cheio de combustível, burrice seria passar direto.
— Claro, era o óbvio. Mas o Paulo Guedes tá desanimado.
— Muito. Nem disfarça mais.
— Disse que o Bolsonaro é um cara de bons propósitos e foi aplaudido de pé quase cinco minutos por centenas de pessoas… Um teatro desses é o sinal claro do desespero.
— Não engana ninguém.
— E o Paulo Guedes também não é isso tudo não.
— Nada! Nervosinho, briga com todo mundo.
— Mimado. O Rodrigo Maia falou pra não dar bola pra ele…
— Aí você falou de um cara que faz a diferença. Rodrigo Maia detesta gente mimada.
— Ele é o grande responsável pela reforma da Previdência.
— Eu vi na Globo News. Acho até que ele já devia ter tocado essa reforma antes, aí a gente não tava aqui falando desses fascistas.
— É mesmo. Porque será que ele não fez isso antes?
— Porra, você também faz cada pergunta… Sei lá, acho que quando a equipe do Meirelles tentou pautar a reforma ele tava muito ocupado.
— Eu lembro. Dava entrevista o dia inteiro sobre a crise.
— Se tem um cara que sabe tudo de crise é ele.
— Inclusive quando fica tudo muito calmo ele fala logo uma merda qualquer contra o governo pra dar uma sacudida.
— Exato. Ele sabe que a calmaria é perigosa. Quase sempre é prenúncio de crise.
— Um puta pacificador. Prova viva de que sem intriga não se chega à paz.
— Ele sabe muito bem que o cumprimento de todas as metas de infraestrutura em seis meses é cortina de fumaça do bolsonarismo.
— Esse Tarcísio é um fanfarrão.
— Quem é Tarcísio?
— O ministro da Infraestrutura, ué.
— Ah, claro. Fanfarrão! Trabalha 24 por 24 pra encher os transportes de investimento e enganar esse gado fascista.
— Ê, povo burro.
— Mas até que num governo democrata ele seria útil.
— É, o cara é bom. Quem botou ele lá?
— Não sei, não quero saber e tenho raiva de quem fica fazendo pergunta sobre governo fascista.
— Desculpe, tem razão.
— Me desculpe você, me exaltei. Essa onda de ódio tá me tirando do sério.
— Imagina, tô num stress ferrado também. A única coisa que me acalmou nessa crise reacionária foi a entrevista do Tiririca na Folha.
— Entendo você. A sensatez é relaxante.
— Puta entrevista, puta análise. Ele captou com perfeição o lance da escalada autoritária.
— Tiririca me representa.
— Palhaço.
— Otário.
— Viva a democracia!
— Viva!