Um ano depois da partida de Erenice, o primeiro escalão do governo atinge a altíssima rotatividade dos motéis baratos
Sugerida por Lula e encampada por Dilma Rousseff, a instalação de Antonio Palocci na chefia da Casa Civil foi mais uma ideia de jerico da dupla que inaugurou o Brasil Maravilha do cartório. Não é pouca coisa entregar o cargo de primeiro-ministro a um estuprador de sigilo bancário que virou traficante de influência. Pois poderia […]
Sugerida por Lula e encampada por Dilma Rousseff, a instalação de Antonio Palocci na chefia da Casa Civil foi mais uma ideia de jerico da dupla que inaugurou o Brasil Maravilha do cartório. Não é pouca coisa entregar o cargo de primeiro-ministro a um estuprador de sigilo bancário que virou traficante de influência. Pois poderia ter sido pior: se as denúncias de VEJA não tivessem desmontado a quadrilha em ação no 4° andar do Palácio do Planalto, formada por filhos, parentes e agregados de Erenice Guerra, a melhor amiga de Dilma Rousseff continuaria acampada no gabinete que teve de abandonar em 16 de setembro de 2010.
Faz exatamente um ano que a chefe do bando aceitou deixar a chefia da Casa Civil em troca da mudez premiada ─ uma brasileirice que livra da demissão por justa causa, de temporadas na cadeia e da devolução do dinheiro criminosamente tungado quem não revela os nomes dos mandantes, comparsas ou padrinhos. Erenice, por exemplo, topou esquecer a montagem do dossiê cafajeste sobre Fernando Henrique e Ruth Cardoso, o teor da conversa semiclandestina entre Dilma e Lina Vieira e outras bandalheiras que produziu em parceria com a atual presidente. Em contrapartida, pôde fingir que pediu demissão, voltar para casa sem escalas em delegacias ou tribunais e gastar sem sobressaltos a fortuna arrecadada com taxas de sucesso e outros codinomes da velha negociata. Na festa da posse, voltou ao local do crime como convidada especial.
Passados 12 meses, o grande viveiro de desmemoriados de nascença e amnésicos por vigarice faz de conta que nunca existiu uma Erenice, muito menos a terna amizade que desqualifica Dilma Rousseff para o papel de defensora da moral e dos bons costumes. A mãe de Israel Guerra deve achar divertida a fantasia da presidente com uma vassoura na mão. E decerto considerou tão previsível quanto a mudança das estações a anexação do Ministério do Turismo à capitania hereditária do Maranhão. Erenice sabe que Dilma faz o que José Sarney deseja desde os tempos da Casa Civil. Foi ela quem articulou a audiência em que a chefe recomendou a Lina Vieira que a Receita Federal tratasse com muita gentileza as trapaças fiscais da Famiglia.
Os que veem as coisas como as coisas são, esses só enxergaram a saída de um protegido de Sarney e a entrada de outro protegido de Sarney. Como boa parte da imprensa não costuma contentar-se com fatos, muitos jornalistas voltaram a vislumbrar a faxineira que nunca houve, agora exigindo do PMDB a indicação de um deputado sem prontuário por sofrer de alergia a gatunos. Os laços que prendem Dilma a Erenice e Sarney implodem a falácia. Quem engole sem engasgos afilhados ou exigências de Madre Superiora engole o que vier. Quem conviveu tão docemente com uma meliante juramentada é capaz de achar que Fernandinho Beira-Mar não seria um mau genro.
Dilma pediu ao PMDB que escolhesse a menos constrangedora das folhas corridas não por critérios éticos, mas por motivos práticos: é preciso fazer com que os nomeados durem mais tempo no cargo. Neste 16 de setembro, nem teve tempo para chorar a partida de Erenice, consumada um ano atrás: precisava aplaudir e explicar a chegada de Gastão Vieira. Com o despejo de Pedro Novais, foi atingida a marca extraordinária: a cada 25 dias, um ministro desocupa seus aposentos. A altíssima rotatividade pode ter produzido uma reforma administrativa vergonhosa até para os padrões da Era da Mediocridade.
Em vez de uma presidente no comando do ministério, o Brasil tem uma gerente tentando descobrir como se administra um primeiro escalão que lembra o mais barato dos motéis.