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Balanço Social

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Um olhar diferente para as desigualdades do Brasil
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Tratamento de esgoto ainda está muito longe da universalização nas cidades

Em 2024, Brasil já despejou mais de 738 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento na natureza

Por Andréia Peres 21 Maio 2024, 09h15

Com perdão do trocadilho, saneamento básico é básico, uma das principais medidas do desenvolvimento de um país. Infelizmente, o Brasil ainda não tomou consciência disso, especialmente no que diz respeito ao tratamento de esgoto.

“Esse é o indicador que está mais distante da universalização nas cidades”, analisa Luana Siewert Pretto, presidente-executiva do Instituto Trata Brasil, OSC da área de saneamento básico, em entrevista a esta coluna.

Segundo ela, o exemplo de Belém, que trata apenas 2,4% do volume de esgoto gerado, é emblemático. A cidade que, em novembro de 2025, vai sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP30), o mais importante evento ambiental do planeta, é um dos 20 piores municípios do Ranking do Saneamento 2024, do Instituto Trata Brasil, feito em parceria com a GO Associados, com foco nas 100 cidades mais populosas do país.

Sancionado em 2020, o Novo Marco Legal do Saneamento (Lei Federal nº 14.026/2020) definiu uma meta única para todos os municípios do país. Considerado um avanço pelos especialistas, ele prevê que, até 2033, o Brasil deve fornecer coleta e tratamento de esgoto para 90% da população.

Se continuar no mesmo ritmo, o país vai levar 38 anos para chegar em 90% do esgoto tratado e 170 anos para universalizar a coleta, calcula Pretto. Comparando os dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) dos anos-base de 2021 e 2022 (o mais recente), publicados pelo Ministério das Cidades, os avanços são mínimos. A coleta de esgoto subiu de 55,8% para 56%, um aumento de 0,2 ponto percentual. Já o tratamento foi de 51,2% para 52,2%, um incremento de 1 ponto percentual.

Em relação à coleta total de esgoto, apenas oito capitais têm índices de mais de 90% de atendimento, segundo o Ranking do Saneamento 2024. “Temos menos de 10 anos para cumprir o compromisso da universalização do saneamento que o país assumiu. Ainda assim, cinco capitais da região Norte e três da região Nordeste não tratam sequer 35% do esgoto gerado”, lamenta a especialista.

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DENGUE E POLUIÇÃO DOS RIOS

O saldo disso é dramático. De acordo com o “Esgotômetro”, do Instituto Trata Brasil, só neste ano 738.513 piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento já foram despejadas na natureza.

A falta de tratamento de esgoto está associada à poluição dos rios, com impactos em todo o meio ambiente, e a diversas doenças, como a dengue – que até 17/5 contabilizava 4,9 milhões de casos (prováveis e confirmados), com recorde de mortes deste século (2,7 mil confirmadas e 2,6 mil em investigação), segundo dados do Painel de Monitoramento das Arboviroses do Ministério da Saúde.

Apesar das dificuldades e do cenário negativo, Pretto é otimista. “Começamos a ver exemplos positivos”, comemora. Desde 2009, o Instituto Trata Brasil monitora os indicadores de saneamento dos maiores municípios brasileiros. Em 2023, pela primeira vez, um município — São José do Rio Preto (SP) — alcançou a universalização. Neste ano, mais dois municípios, Maringá (PR) e Campinas (SP), também chegaram nesse patamar. “Isso mostra que com um plano de saneamento bem estruturado, investimentos constantes e a priorização do tema é possível universalizar. Dá para fazer”, afirma.

É preciso, no entanto, vontade política. Segundo a especialista, entra ano, sai ano e o problema de saneamento continua concentrado nas regiões Norte e Nordeste. “É onde se tem o menor investimento”, explica. “Persiste a ideia de que obra enterrada não dá voto.”

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NO NORTE E NO NORDESTE, INVESTIMENTO POR HABITANTE/ANO É DE MENOS DE UM CAFEZINHO POR DIA

Dos 20 piores municípios do Ranking do Saneamento 2024, 13 estão nas regiões Norte e Nordeste, em que a média de investimento é de R$ 73,85 por habitante/ano, o equivalente a menos de um cafezinho por dia e a um terço da meta prevista pelo Novo Marco Legal, que é de R$ 231.

O que torna tudo ainda mais trágico é que crianças e adolescentes são os mais impactados pela falta de saneamento, um dos fatores mais significativos para a pobreza multidimensional na infância e na adolescência no Brasil, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Em 2022 (último dado disponível), 37% das crianças e dos adolescentes brasileiros não tinham acesso adequado a banheiros e rede de esgoto, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC).

Presente e futuro das crianças – e do país – estão em jogo. Para ficar bem na foto da COP30, no ano que vem, o Brasil vai precisar mostrar mais do que os rios, as florestas e a fauna da Amazônia que, segundo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, vão deixar todos “maravilhados com a cidade de Belém”. “É preciso tratar o saneamento como uma política de Estado e não de governo”, diz Pretto, reforçando que também é importante que as prefeituras tenham planos com metas claras e objetivas e uma agência reguladora independente, que cobre eficiência na utilização dos recursos.

* Jornalista e diretora da Cross Content Comunicação. Há mais de três décadas escreve sobre temas como educação, direitos da infância e da adolescência, direitos da mulher e terceiro setor. Com mais de uma dezena de prêmios nacionais e internacionais, já publicou diversos livros sobre educação, trabalho infantil, violência contra a mulher e direitos humanos.

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