Imagine que, depois de algum estranho fenômeno climático, começam a chover brinquedos e roupas pelo Brasil. Uma ou duas vezes por semana, nós acordamos e descobrimos que a chuva da madrugada distribuiu, entre todos os brasileiros, calças, camisas, bonecas que falam, carrinhos Hot Wheels e muitos outros produtos.
Um fenômeno como esses intrigaria climatologistas, mas as pessoas o comemorariam como um evento sagrado, uma benção divina. “Agora não precisamos trabalhar tanto, pois as coisas que precisamos simplesmente caem no céu!”, diríamos em festa. Melhor ainda, os pobres poderiam economizar uma parte maior do salário, pois não precisariam gastar com roupas e brinquedos.
Mas nem todos ficariam contentes. Confecções, lojas e fabricantes de brinquedos reclamariam que a chuva impôs sobre eles uma concorrência desleal. Como as coisas simplesmente chovem, ninguém mais compra o que eles produzem. Indústrias fechariam, centros industriais se tornariam cidades fantasmas como Detroit, nos Estados Unidos. “A chuva roubou nossos empregos”, diria a faixa de protesto dos trabalhadores desses ramos. “Contra a precipitação!”
Apesar dos protestos, haveria um consenso que o prejuízo concentrado naquele pequeno grupo é muito menor que o imenso benefício causado pela chuva de produtos. Não faria sentido que alguém continuasse gastando tempo e esforço produzindo coisas que caem do céu. O melhor a fazer seria ajudar empresários e trabalhadores desses ramos a se adaptarem e se especializarem em produzir coisas que a chuva não fornece.
Agora substitua “chuva” por “China”. Um belo dia os brasileiros acordam e descobrem que podem comprar roupas e brinquedos chineses não de graça, mas por um décimo do que costumam pagar. É uma excelente notícia. Não precisam mais trabalhar tanto para adquirir essas coisas. Melhor ainda, os pobres podem economizar uma parte maior do salário, pois têm acesso a roupas e brinquedos baratos.
Da mesma forma, haveria um grupo de descontentes. Confecções e fabricantes de brinquedos reclamariam que a China impôs sobre eles uma concorrência desleal. Ninguém mais compra o que eles produzem, preferem comprar da China. Indústrias fechariam, centros industriais se tornariam cidades fantasmas como Detroit. “A China roubou nossos empregos”, diria a faixa de protesto dos operários desses ramos. “Contra a globalização!”
Apesar dos protestos, há um consenso entre economistas que o prejuízo concentrado em pequenos grupos é menor que o imenso benefício criado pelo comércio internacional. No topo da lista de consensos entre economistas, com 93% de aprovação entre eles, está a afirmação “Tarifas e cotas de importação geralmente reduzem o bem-estar econômico geral”.
Não faz sentido que trabalhadores e empresários brasileiros ou americanos gastem tempo e esforço produzindo coisas que a China vende tão barato. O melhor a fazer é ajudar empresários e trabalhadores desses ramos a se adaptarem e se especializarem em produzir coisas que o Brasil faz melhor que a China.
David Ricardo explicou há 200 anos que o comércio internacional torna a vida mais fácil porque nos faz ter mais com menos trabalho (e com menos empregos). Escoceses trabalhariam demais para produzir vinhos ruins – melhor se especializarem nas destilarias e trocar algumas garrafas de uísque por vinhos dos franceses. Da mesma forma, a forma mais fácil dos franceses obterem uísque é produzindo vinhos para trocá-los com os escoceses.
O fato de o comércio internacional ou a tecnologia roubar empregos não é uma má notícia. É simplesmente a raiz da prosperidade humana. Que pena que o novo presidente da maior democracia capitalista do mundo não se entusiasme com essa ideia.
@lnarloch