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Claudio Lottenberg

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Mestre e doutor em Oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp), é presidente institucional do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein

Para ir do tratar ao cuidar, é preciso mudar mentalidade e cultura

A cultura geral é esperar que médicos tratem das pessoas, mas o que é necessário é que eles cuidem delas

Por Claudio Lottenberg
Atualizado em 13 Maio 2024, 21h19 - Publicado em 6 set 2023, 17h10

São muitos os ângulos pelos quais se podem observar as maneiras como as pessoas pensam e se comportam. Dois desses ângulos são a mentalidade e a cultura. Ambas, inclusive, se misturam, se complementam, se suplementam, no mesmo indivíduo – a consideração em separado tem caráter meramente didático. Mas cada uma delas se presta a muitas e ricas análises.

Podemos, em linhas gerais, dizer que “mentalidade” é de alcance mais “micro”: nessa chave estão as crenças e as atitudes de cada um. O modo como cada pessoa processa uma informação, por quais caminhos conduz chega a uma ideia, com que outras a associa, com quais emoções encara informações e ideias – esses e outros modos de ser e de ver nos dão noção do que chamamos de mentalidade. Duas grandes classificações para mentalidade, por sua vez, são as categorias “fixa” (ou “estática”) e “de crescimento” (ou “dinâmica”).

A primeira tende a encarar habilidades como estáticas: as capacidades que temos são como são, e lidamos com os acontecimentos e com a vida da forma como podemos, com o instrumental de que já dispomos. A base dessa ideia inclui uma crença na capacidade do talento: se tivermos, vamos conseguir superar um desafio (o corolário seria que, se não tivermos, não haverá alternativa ao fracasso). A mentalidade “de crescimento”, por sua vez, propõe que, sim, habilidades podem ser aprendidas e desenvolvidas. Essa divisão ecoa uma disputa entre “inatistas” (que defendem que nascemos com certas ideias) e “empiristas” (que propõem que “nada está no intelecto que antes não tenha estado nos sentidos”), tão bem ilustrada pelo “Ensaio Acerca do Entendimento Humano”, do inglês John Locke.

A cultura, por sua vez, é “macro” – na verdade, é um tema dos mais vastos, e não se vai aqui propor uma definição. Mas seria justo dizer que nela estão englobados valores, normas e comportamentos compartilhados por grupos de tamanhos que vão de empresas e comunidades a sociedades inteiras.

Mentalidade e cultura têm papel fundamental na moldagem do nosso caráter, das interações com o mundo ao nosso redor, de cada pensamento que temos.

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Mas a esta altura o leitor pode estar se perguntando: “E qual relação essas considerações guardam com o tema da saúde?”.

Médicos são profissionais que têm sua prática pautada por um marco lógico assentado na ciência e em evidências – e a pandemia suscitou debates acalorados que só fizeram deixar isso muito claro. Mas seria negar o fato deixar de lado a consideração de que a medicina atualmente segue centrada no modelo hospitalar – e, portanto, atua sobre o caso agudo (ou na agudização do caso crônico), com foco em alta complexidade mesmo naquilo que é simples.

A “cultura” em nossa sociedade nos prepara mal para dar protagonismo ao cuidado – entenda-se aqui o cuidado continuado, a observância na manutenção da boa saúde, em embutir na prática do dia a dia rotinas, hábitos que preservem o corpo. O resultado disso é uma medicina cara, inacessível, repleta de inconformidades, utilizada de forma errada e pouco estruturada. E o pior: há uma disposição geral, permeando as mentalidades de todos, de achar que a tecnologia resolverá tudo por si: basta aplicá-la e pronto.

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Essa mentalidade precisa mudar. A forma como se exerce a medicina e como os profissionais da saúde engajam os pacientes enquanto cidadãos, também. A prevenção hoje não é marca característica da cultura nem das mentalidades. Não se pode tratar um indivíduo dentro de médias móveis e outras ferramentas estatísticas, para tratar individualmente o indivíduo apenas no que ele se desviar dessas médias.

Médicos juram, como o fez Hipócrates há mais de dois milênios, não causar dano algum. Mas medo e falta de ousadia também matam. Mudar as mentalidades, para daí promover uma mudança de cultura, é algo em que o médico pode se envolver, na medida de fazer com que o paciente deixe de se portar quase como um observador externo e desinteressado da própria saúde e assuma seu papel de coparticipação no gerenciamento diário.

O cenário é adverso: médicos se formam para atuar em hospitais. A cultura geral é esperar que tratem das pessoas, mas o que é necessário é que eles cuidem delas. A mentalidade, no campo da saúde, se já foi fixa, precisa deixar de ser. Mais do que nunca tratamentos e tecnologias recém-desenvolvidos põem à prova diariamente a capacidade de cada um aprender com a inovação. São todos muito bem-vindos, mundo digital, personalização apoiada na genética, foco na atenção primária e na formação profissional. Isso tudo está consagrado. Mas a grande mudança tem que acontecer na cultura – e, para que essa chegue a acontecer, é preciso mudar a mentalidade.

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