O futuro é um território virgem, não mapeado, de muitas incógnitas e possibilidades. Como seremos? Como serei? Como será? As perguntas no verso de Caetano Veloso resumem a ansiedade demasiadamente humana sobre o que a vida nos reserva. Procuram-se as respostas nos lugares mais improváveis. Nas linhas da palma da mão ou na tenda mística do oráculo. Também nas cartas tiradas no tarô, nos búzios jogados sobre o tabuleiro, na interpretação do mapa astral. Quiromantes, astrólogos e demais especialistas em previsões esotéricas continuam com a agenda cheia, checando o que está escrito nas estrelas, nas mãos ou em outra superfície qualquer.
A previsão do futuro tem apelo inegável porque mexe com um temor ancestral do ser humano: o medo do desconhecido. Parte da nossa vida é dedicada a tentar aplacá-lo. Há maneiras racionais de fazer isso, e quase todas passam por algum tipo de planejamento. Investimentos em estudos, cuidados com relações afetivas, escolhas de aposentadorias, empenho em ter uma vida saudável — tudo isso tende a diminuir o grau de incerteza a que estamos expostos.
Se você quiser realmente saber como será o seu futuro, no entanto, há um método mais simples e certeiro: basta levar em conta o que está fazendo hoje. É a nossa rotina atual — ou a falta dela — que determinará, ao menos em parte, o que seremos amanhã. Como exercício, proponho que projete um intervalo qualquer de tempo — dez anos, por exemplo. Como você gostaria de estar em 2030? Fazendo o quê? Dedicando-se prioritariamente a quais projetos pessoais? E a carreira profissional, em que ponto ela deveria estar? Um amor renovado? Talvez um novo amor?
“Em 2030 você será produto do que cria em 2020. Sua lista de atividades está de acordo com seus sonhos?”
Não é uma proposta totalmente nova. “Conta-me o teu passado e saberei o teu futuro”, teria dito Confúcio, o filósofo chinês que viveu séculos antes de Cristo e influenciou o pensamento oriental, pregando, entre outras lições, a importância da sinceridade. Minha fórmula deriva desse conceito: se você, honestamente, me disser o que fez hoje, eu lhe direi o futuro que o aguarda.
“Como assim, Lucilia?” É simples. Não se trata de vidência, mas de lógica. Nossas conquistas, na maioria das vezes, dependem menos do acaso do que da determinação. Se você quiser se aperfeiçoar na arte da culinária, por exemplo, deve cozinhar hoje. Se deseja um dia cantar sem espantar os amigos, cante hoje. Se almeja chegar firme e sacudido aos 80, malhe hoje. E assim por diante. Varia o objetivo, não o dia de começar a concretizá-lo — é sempre hoje. Portanto, incorpore à rotina tudo aquilo que fará você uma pessoa parecida com seus melhores anseios. Se preciso, saia de sua zona de conforto, mesmo que seja para criar outra, mais consciente.
Entregar o seu futuro ao eventual alinhamento dos astros não chega a ser uma estratégia de vida. Prefiro concordar com Peter Drucker, o pai da administração moderna: “A melhor forma de prever o futuro é criá-lo”. Talvez ele estivesse pensando principalmente em gestão de empresas, mas não vejo por que não aplicar a máxima à vida. Em 2030 você será produto do que está criando em 2020.
E, então, a sua lista de atividades está de acordo com seus sonhos?
Publicado em VEJA de 4 de novembro de 2020, edição nº 2711