O roteiro é sempre o mesmo: toda vez que uma vaga de ministro é aberta no Supremo Tribunal Federal (STF), começa a temporada de discussões sobre a forma de indicações à Corte constitucional do país. Hoje, a assunção ao cargo mais importante do Poder Judiciário brasileiro é feita por indicação exclusiva do presidente da República e aprovação por dois terços do Senado Federal. Os critérios são poucos: idade entre 35 e 65 anos, notável saber jurídico e reputação ilibada. E só.
No Congresso Nacional, 33 propostas de emenda à Constituição (PECs) defendem, como alternativa, as mais diversas e criativas fórmulas para a escolha de um ministro. Na maioria das vezes, entretanto, as discussões logo arrefecem, mostra levantamento a partir de dados do InteliGov, plataforma de inteligência em relações governamentais.
Só o deputado federal Jaime Martins (PSD-MG), por exemplo, já apresentou duas PECs. Na primeira, pouco depois da posse de Alexandre de Moraes — então ministro de Michel Temer (MDB), que o indicou —, propôs uma quarentena de dez anos entre a saída de uma função política ou de confiança e a nomeação para a Corte. Não contente, no dia 15 de março levou aos colegas outra PEC, acrescentando uma exótica fórmula, com a adoção de prazos a depender do motivo da abertura da vaga (aposentadoria ou mudança inesperada) e com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Coincidência ou não, a apresentação de projetos ganhou força com as nomeações mais recentes, que também foram as mais polêmicas: a do próprio Moraes, em 2017, e a de Edson Fachin, indicado por Dilma Rousseff em 2015, contestada por suas posições favoráveis aos pleitos de movimentos sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Se surgiram quatro PECs desde a indicação de Moraes, foram nada menos que nove propostas nos dois anos anteriores.
As demais PECs foram distribuídas a partir de 2001 de forma mais homogênea, com uma exceção para o ano de 2012, com cinco propostas do tipo. O caráter meramente retórico de muitos dos projetos fica explicado quando se percebe que vários propõem as mesmas coisas e, por isso, acabam sendo incorporados a projetos já existentes.
Seja por falta de vontade política ou por receio de contrariar os ministros e o Judiciário, fato é que até a proposta com mais capilaridade, a de PEC 473/2001, que abriga outras nove, não tem nenhuma movimentação desde 2015. Os principais pontos que parlamentares gostariam de mudar são a diminuição do papel do presidente da República na escolha, o aumento do número de critérios para a seleção e a adoção de mandatos.
A última mudança que, se não alterou a forma de indicação, teve reflexos diretos nas prerrogativas presidenciais foi a aprovação da chamada PEC da Bengala, em maio de 2015, que aumentou a idade de aposentadoria compulsória dos ministros do STF (de 70 para 75 anos), tribunais superiores e Tribunal de Contas da União (TCU).
Com Dilma às turras com o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), os deputados aprovaram a mudança, que tirou da petista a chance de nomear os sucessores de Celso de Mello, Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Teori Zavascki, que sairiam entre novembro de 2015 e dezembro de 2018 — naquela ocasião, o impeachment ainda era uma hipótese remota.
Confira abaixo algumas das propostas que tramitam no Congresso, segundo o InteliGov:
1) Exigência de concurso público
Em abril deste ano, o deputado Rogério Peninha Mendonça (MDB-SC) defendeu que os ministros do Supremo fossem escolhidos a partir de concurso público, assumindo com mandatos de dez anos. Ele também propôs que ex-ministros fossem proibidos de disputar as eleições por cinco anos após a saída do cargo.
2) Cotas por regiões
Em dezembro de 2017, o deputado André Amaral (Pros-PB) propôs que fosse criada uma espécie de cota no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir a representação de todas as cinco regiões do país. Pela sugestão de Amaral, das onze vagas, cada região teria direito a dois representantes. Hoje, de todo o Supremo, apenas um ministro não é natural do Sul ou do Sudeste: Gilmar Mendes, que nasceu em Diamantino (MT).
3) Cotas por funções
Boa parte dos projetos trata da reserva de vagas em listas de indicados e na própria Corte para pessoas oriundas de determinadas funções do sistema de Justiça e até da política. Um exemplo é o projeto do deputado Rubens Bueno (PPS-PR), que defende o rateio das vagas entre ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), advogados indicados pela OAB, membros do Ministério Público escolhidos pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e até dos parlamentares – um indicado pela Câmara e outro pelo Senado.
4) Alternâncias
Vários dos projetos defendem a alternância entre as indicações. Os deputados Antonio Carlos Pannunzio (PSDB-SP) e Nazareno Fonteles (PT-PI) queriam que fosse ora o Executivo, ora o Legislativo. Já Tadeu Alencar (PSB-PE) argumentou que seria positivo incluir o Judiciário, através do próprio STF, que teria uma vez para escolher seus ministros.
5) Listas prévias
Alguns acreditam que a solução passa por manter a escolha com um poder só, o Executivo ou o Legislativo, mas restringir as opções com listas prévias. Elas vão desde formas complexas, como a defendida por Roberto de Lucena (Pode-SP), que sugere que o Supremo faça uma lista com cinco nomes, o Senado vote a relação e o presidente possa escolher entre os três mais votados. Já um conjunto de trinta senadores cogitou, em 2013, a criação de uma lista sêxtupla a partir de indicações de entidades.
6) Mandatos
Muitos deputados se mostraram menos preocupados como os ministros chegaram até lá, desde que não fiquem muito tempo – indicado em 2017, Alexandre de Moraes pode ficar na corte até 2043, quando completa 75 anos. Para Carlos Eduardo Cadoca (SD-PE), Pedro Cunha Lima (PPS-PB) e um grupo de senadores de 2015, esse prazo teria que ser de dez anos.
7) Mais ministros
De todos os projetos, só um tratava de um aumento no número de vagas. Ele foi apresentado em 2014 pelo então deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ), hoje preso no âmbito da Operação Lava Jato. Para Cunha, o Supremo tem que passar a ter 15 ministros, com vagas divididas igualitariamente entre os poderes: cinco decididas pelo presidente, cinco pelo Congresso e cinco pelo STJ.