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Dias Lopes

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Argentina, pero no mucho

Nossos vizinhos do sul do continente transformaram a empanada em seu monumento gastronômico, mas ela tem origem hispano-árabe

Por J.A. Dias Lopes
Atualizado em 30 jul 2020, 20h47 - Publicado em 21 ago 2017, 17h59
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  • Podemos encontrar argentinos que não sabem dançar tango e já cansaram de ouvir Carlos Gardel, que condenam o culto a Eva Perón, que nunca leram Jorge Luís Borges, nem consideram Diego Maradona um modelo de virtudes e acham que Lionel Messi não joga bem na sua seleção nacional. Mas é difícil achar um que despreze a empanada. Como paixão nacional, perde apenas para o “asado”, nome que dão ao churrasco. Todos os países americanos de colonização espanhola preparam algum tipo de empada, pastel assado ou frito, em cujo recheio habitualmente predomina a carne bovina.

    A empanada se tornou popular na Bolívia, Chile, Equador, Peru e Venezuela. Mas foi a Argentina que lhe conferiu o status de monumento gastronômico. Instituiu até ritual para saboreá-la. Um pôster vendido nas bancas de jornal do país ensina o passo a passo. Pega-se a empanada com a mão, sacode-se antes da primeira dentada. É para o suco se espalhar no recheio. Se o apreciador não estiver à mesa, convém traçar a empanada sentado em uma cadeira ou banco, para não sujar a roupa. A mulher deve puxar a saia acima dos joelhos, o homem precisa abrir as pernas.

    Vera, ma non troppo
    Hugo Ibarzábal: difundiu a especialidade em São Paulo, a partir de 1980 ()

    A empanada foi difundida no Brasil a partir de 1980, por Hugo Ibarzábal, sua mulher Alejandra Isasmendi e a sócia Ana Massochi. O trio de argentinos, que fugiu da ditadura encarapitada na Casa Rosada, de Buenos Aires, abriu o Martín Fierro, na Vila Madalena, em São Paulo. Informal e aconchegante, o bar atraiu uma clientela formadora de opinião: publicitários, jornalistas, intelectuais, artistas, estudantes etc. O sucesso veio logo. Ir ao Martín Fierro no final de tarde ou começo da noite virou cult.

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    Hugo faleceu no início da semana passada, aos 76 anos, entristecendo a coleção de fregueses e amigos – havia saído em 2005 da sociedade e aberto o Restaurante Buenos Aires Latino América, na cidade de Embu das Artes, a 27 quilômetros de São Paulo. Continuava a fazer empanadas imperdíveis. Também preparava grelhados à moda portenha, como o bife de chorizo, o ojo de bife e as mollejas. Em São Paulo, atualmente se consegue encontrar a empanada nos couverts de churrascarias e nas delikatessens, bares e lanchonetes, onde é consumida como lanche e disputa as preferências da clientela com o pão de queijo, a coxinha, o quibe, a empada e o pastel de bacalhau.

    Os argentinos se orgulham de uma coleção da especialidade. Chamam-se criollas, típicas da região de Buenos Aires, fritas, saltenãs, rosarianas, cordobesas, mendocinas, tucumanas e aí por diante. Certas mudanças diferenciam a receita de cada lugar. Há empanadas com os repulgues (bordas) torcidos para cima ou para baixo, para a direita ou esquerda; pinceladas ou não com ovo antes de assarem ao forno; apimentadas ou não; com mais ou menos cominho; com ou sem tomate; com azeitona ou uvas passas e desprovidas desses complementos.

    Queijo, queijo e presunto, queijo e cebola, queijo e choclo (milho verde), roquefort e frango são alternativas para o recheio de carne. Em casa, alguns argentinos às vezes aproveitam sobras de comida. Quando predomina a carne, eles geralmente escolhem o contrafilé, embora não seja obrigatório. Cortam a peça em bifes, a seguir em finas tiras e, no final, picam com a faca. Evitam usar a moída, pois seca rapidamente, requer mais gordura no cozimento e um dos requisitos da empanada, como se sabe, é justamente ter recheio úmido.

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    A empanada argentina e latino-americana em geral tem origem espanhola. Veio da região da Galícia. Segundo Vera Giaconi e Stella Fernández, autoras do livro “Cocina Argentina – Clásica y Moderna” (Emecé Editores, Buenos Aires, 2003), a preparação cruzou o Atlântico e aportou na América nos farnéis dos imigrantes espanhóis. Foi imortalizada no Pórtico da Glória, do século 12, uma das atrações artísticas da catedral de Santiago de Compostela, na capital da Galícia. Ali, entre as figuras entalhadas em pedra, há um guloso a comer eternamente uma empanada.

    Até hoje faz parte das provisões de viagem dos peregrinos que enfrentam a pé o longo caminho até Santiago de Compostela e dos espanhóis que se deslocam em outros destinos. Seu nome viria de “en pan”, depois “empan”, o ato de colocar alguma coisa dentro do pão. Acredita-se, porém, ser mais uma contribuição dos árabes. Eles a teriam introduzido na Espanha quando a invadiram no ano 711. Ainda agora, os árabes dispõem de um tipo de empanada: a esfirra fechada.

    Mas os galegos a preferem diferente dos argentinos e latino-americanos. Na maioria das vezes, fazem-na em forma de empadão redondo ou retangular. Cortada em pedaços, é servida quente ou fria, em meio às apetitosas tapas – os tira-gostos típicos em torno dos quais os espanhóis se reúnem para confraternizar. A massa é de pão comum ou folheada. Assa no forno ou frita em óleo.

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    No meio rural, o recheio leva frango, cebola e pimentão; ou carne de porco, chouriço e verduras. Na região costeira, marisco, sardinha, anchova e bacalhau. No norte vão peixes de rio, enguia ou lampreia. Há também a empanada para uma só pessoa, como acontece na Argentina e países latino-americanos, porém menos prestigiada. Recebe o nome de empanadilla.

    O romancista francês Alexandre Dumas, Pai, (1802-1870) autor de “O Conde de Monte Cristo” e “Os Três Mosqueteiros”, visitou a Espanha e se impressionou com a popularidade da empanada. “Um dos prazeres dos espanhóis que, como sabemos, não morrem de fome, é merendar no campo e ao ar livre”, testemunhou. “Este prazer não seria completo se lhe faltasse a empanada”. Pena que Dumas não conheceu a devoção dos argentinos pela especialidade.

    EMPANADAS

    RENDE 36 UNIDADES

    INGREDIENTES

    MASSA
    .1kg de farinha de trigo especial
    .1 colher (sopa) de sal fino
    .200g de manteiga (ou margarina) sem sal, em temperatura ambiente
    .Água morna o quanto baste
    .Farinha de trigo para polvilhar as assadeiras

    RECHEIO
    .1kg de carne limpa e sem muita gordura. Pode ser contrafilé
    .1kg de cebola
    .1/2 maço de cebolinha
    .100g de manteiga (ou margarina ) sem sal
    .1 concha de caldo de carne
    .8 ovos cozidos duros
    .36 azeitonas sem caroço
    .72 uvas passas sem semente
    .Pimenta calabresa moída a gosto
    .Cominho a gosto
    .Páprica a gosto
    .Sal e pimenta-do-reino moída na hora a gosto

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    PREPARO

    MASSA
    1.Disponha a farinha misturada ao sal, em coroa, sobre a mesa. No centro, coloque a manteiga amolecida, mas não líquida.
    2.Misture bem e junte a água morna, aos poucos, misturando, até dar o ponto, obtendo um composto flexível. Trabalhe bem a massa com as mãos, deixando-a lisa e homogênea. Divida-a em bolas.
    3. Estique a massa com um rolo, na espessura de aproximadamente 2 milímetros. Com um molde redondo, corte-a em discos de 10 centímetros de diâmetro. Reserve esses discos de massa.

    RECHEIO E FINALIZAÇÃO
    4. Corte em cubinhos a carne, a cebola e a cebolinha. Doure a cebola na manteiga e junte a carne. Misture e acrescente o caldo, a cebolinha e os outros temperos. Cozinhe, deixe arrefecer e reserve na geladeira. Pique os ovos e misture-os à carne.
    5. Coloque uma colher (sopa) do recheio no centro dos discos e junte uma azeitona e duas uvas passas em cada um deles. Umedeça as bordas com água e feche cada empanada, fazendo pressão com o dedo, para obter o repulgue (ou bainha). Ou feche as bordas usando um garfo ou mesmo um aparelho apropriado.
    6. Leve as empanadas ao forno quente, em assadeiras enfarinhadas, até ficarem douradas.

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    Receita preparada pelo saudoso restaurateur e chef argentino Hugo Ibarzábal, pioneiro das empanadas no Brasil.

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