Fortaleça o jornalismo: Assine a partir de R$5,99

Dora Kramer

Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Coisas da política. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

Lança-chamas

Está faltando clareza, equilíbrio e autocrítica entre os atacantes e os defensores da Lava-Jato

Por Dora Kramer Atualizado em 4 jun 2024, 15h45 - Publicado em 7 ago 2020, 06h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Em português claro, o que o procurador-geral Augusto Aras quer é controlar o Ministério Público. Nisso difere de antecessores apenas quanto à estridência da exposição do propósito. O desejo de controle é inerente à designação de “chefe”. No caso do MP, são muitas as atribuições da chefia, entre as quais, como sabemos, não se inclui a ingerência sobre o trabalho dos procuradores, cuja autonomia está garantida na Constituição.

    Portanto, a menos que Augusto Aras se dispusesse à empreitada de mudar a lei para tornar os procuradores subordinados ao chefe, trata-se de uma aspiração de realização impossível. Talvez hoje uma ideia dessa natureza até encontrasse respaldo no Congresso, mas não passaria pelo crivo da sociedade, em nome de quem o Ministério Público exerce defesa.

    Tanto o procurador-geral tem perfeita noção de quanto os cidadãos já incorporaram esse valor que, a exemplo do homem que pode tornar realidade seu desejo (este, sim, exequível) de vir a integrar o Supremo Tribunal Federal, deu uma baixada no tom da agressividade com que vinha se relacionando com seus pares. Pegou mal a explosão de temperamento numa reunião virtual com procuradores, em contraposição à camaradagem exibida dias antes em situação semelhante, só que com advogados que dela saíram dizendo-se “de alma lavada”.

    Aras amenizou, mas não desligou o lança-chamas com o qual partiu para cima dos colegas, usando como alvo a operação Lava-Jato. Hábil na administração de relações, desde a utilitária com Jair Bolsonaro até a fraternidade de raiz petista com o senador e ex-governador de sua Bahia natal, Jaques Wagner, o procurador certamente notou que, em reação a suas ações, houve um recuo nas críticas à Lava-Jato. Defensores da operação saíram da toca e até detratores mais amenos reivindicaram reconhecimento aos benfeitos originados em Curitiba.

    Passo atrás reforçado pela decisão do ministro Edson Fachin de revogar o compartilhamento de dados permitido por Dias Toffoli durante o plantão do recesso judicial. Embora o clima não favoreça otimismos, o bom senso seria bem atendido se não prevalecesse a lógica de torcidas num caso bastante complexo como esse. Há razões de parte a parte e devem ser vistas sob a óptica fria da parcimônia.

    “Está faltando clareza, equilíbrio e autocrítica entre os atacantes e os defensores da Lava-Jato”

    Continua após a publicidade

    Isso a fim de que não se termine por reduzir Augusto Aras a um agente do ódio petista por Sergio Moro e companhia, a serviço temporário dos interesses de Bolsonaro, nem se caminhe para “cancelar” (nos sentidos judicial e das regras das redes sociais) o extraordinário desmonte do esquema de corrupção na Petrobras e adjacências.

    Gente que conhece bem o MP porque já fez parte dele e até a altura do quarto ano de funcionamento da Lava-Jato era entusiasta “dos meninos” parte do princípio de que o atrito tem um lado positivo: expõe à luz as internas de uma instituição devedora de contas à sociedade. Até mais que outras, por ser sua defensora.

    Isto posto, registre-se a existência indubitável de excessos decorrentes do acúmulo de poder, em larga medida sustentado no apoio praticamente unânime da população. Daí resultaram evidentes vedetismos, a partir dos quais a operação abriu flancos para questionamentos. Dos pontos fracos aproveitaram-se os atingidos pela mudança de meios e modos no trato da corrupção (iniciada lá atrás, no processo do mensalão), mas não só.

    Suscitaram também questões pertinentes relativas à extensão dos trabalhos, aos métodos de investigação, à observância de limites legais e à concentração de todas as atenções no combate à corrupção, como se fosse essa a única atribuição do Ministério Público. Isso tudo leva a um ponto crucial: cometeram-se injustiças, há inocentes condenados? Sofreu grave agressão do estado de direito?

    Augusto Aras não contribui para esses esclarecimentos quando lança suspeição sobre a Lava-Jato sem dizer exatamente a que se refere. É de acreditar que tenha provas, pois sem um trunfo substantivo não se lançaria ao combate com tanta força. Os procuradores tampouco colaboram quando se limitam a reagir como meras vítimas de ofensiva malsã, recusando-se a admitir que possam ter ocorrido impropriedades e até irregularidades.

    Continua após a publicidade

    Se, como diz, o procurador-geral quer “corrigir rumos”, que seja claro ou mantenha reserva se ainda não tem condições de pôr à mesa as cartas que porventura tenha. Agindo como está, atua no mesmo diapasão que condena de aniquilamento de reputações. Além de dar a impressão de que reage, acossado, a uma corporação que não o reconhece como líder e muito menos como chefe.

    Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

    Publicado em VEJA de 12 de agosto de 2020, edição nº 2699

    Publicidade
    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo
    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

    a partir de 39,96/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.