Nem todos os países realizam desfiles militares. Em Israel, isso não acontece desde 1973. Nos Estados Unidos, a última parada nas ruas ocorreu logo depois da Guerra do Golfo, em 1991.
Entre as razões para o fim do costume nessas duas nações estão o alto custo envolvido e o desinteresse do público. Para a parada americana de 1991, esperava-se 1 milhão de pessoas. Só compareceram 200 000. O preço foi alto: 12 milhões de dólares.
Ainda assim, alguns governantes sentem, de tempos em tempos, uma comichão para reiniciar a tradição. Depois de assistir à comemoração do Dia da Bastilha, na França, em julho de 2017, o presidente americano Donald Trump disse:
“Ser um grande presidente tem que ver com muita coisa, e uma delas é ser um grande torcedor do seu país. Nós vamos mostrar ao povo como nós investimos nos militares. Vamos expor nossos militares”.
Eis então a primeira explicação para os desfiles militares: a de incentivar o orgulho patriótico.
E neste quesito ninguém bate a França. Lá, todo dia 14 de julho é feriado e os civis juntam-se aos militares para lembrar a Tomada da Bastilha, em 1789. O principal responsável pelo atual gigantismo do evento é o general Charles de Gaulle, que governou a França entre 1959 e 1969.
Como a França tinha sido invadida pela Alemanha nazista na Segunda Guerra Mundial e só foi recuperada com a ajuda dos americanos, De Gaulle cuidou de nutrir a alma ferida do seu povo. Megalomaníaco e narcisista do tipo que fala de si mesmo em terceira pessoa, ele queria mostrar que a França ainda deveria ser considerada como uma potência mundial. Os franceses ficaram encantados.
No afã de semear patriotismo nos corações e mentes, vale até festejar guerras perdidas. O cuidado, nesses casos, é escolher a data que marcou o início dos combates, nunca o final. É assim que o Egito celebra a Guerra do Yom Kippur de 1973, em que o país árabe tentou aniquilar Israel e acabou sendo humilhado. O dia do desfile, 6 de outubro, é quando os soldados egípcios atravessaram o Canal de Suez.
Na Bolívia, comemora-se o Dia do Mar todo 23 de março. Neste dia, em 1879, aconteceu a primeira batalha contra o Chile na Guerra do Pacífico. Após o conflito, a Bolívia perdeu parte de seu território e, com isso, o acesso ao oceano.
Outros países promovem os desfiles de tanques, mísseis, caças e soldados como uma demonstração de força. O recado pode ser tanto para os países vizinhos, que em tese ficariam menos tentados a iniciar um ataque, como para o público interno. A questão então é dissuadir as pessoas a se rebelar contra o governo. Esse expediente é usado principalmente nos países autoritários e totalitários. Não é por acaso que os desfiles mais impressionantes ocorrem na Coreia do Norte, na Rússia, na Venezuela e no Irã.
E no Brasil, qual seria a utilidade do desfile militar de 7 de setembro, que marca a independência do Brasil?
Os desfiles patrióticos ganharam força por aqui com a proclamação da República, em 1889. A partir desse ano, os militares ganharam proeminência na política nacional e passaram a incentivar festas “cívico-militares”.
A palavra “cívico”, nesta expressão, não se refere à população em geral, mas principalmente aos funcionários públicos e aos estudantes, que eram obrigados a comparecer.
Muito tempo se passou desde então. Depois de duas ditaduras militares e de três décadas de democracia, o valor deste tipo de demonstração caiu muito. “Hoje o desfile militar é mais uma liturgia. O que se vê é uma condensação ao mínimo suficiente só para se manter a tradição”, diz o historiador Jaime de Almeida, historiador da Universidade de Brasília e que estuda as festas na América Latina.
Em 2004, o então presidente Lula seguiu a indicação do marqueteiro Duda Mendonça e tentou transformar o 7 de setembro em uma grande festa popular. O desfile foi transferido para a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, e contou com shows de artistas populares. Não empolgou muito. No ano seguinte, seu tamanho já era bem menor, sem shows e sem festa.
“No Brasil, os desfiles são sempre pífios. Não temos uma tradição militar. Os passos dos soldados são descoordenados. É uma coisa caricata. E ainda bem que é assim, porque ninguém leva isso a sério. Como brasileiros, não temos a necessidade de mostrar força para os vizinhos e não temos problemas territoriais. Além disso, nunca nos identificamos com o pessoal da guerra”, diz o historiador Marco Antonio Villa.