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Em ‘Um Tiro no Escuro’, cineasta se embrenha entre armamentistas no Brasil

Filme que estreia no Festival do Rio acompanha o processo para se ter posse e porte de arma de fogo – e levanta questões sobre o delicado tema no país

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 7 out 2022, 12h17
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  • Em 2018, sob a ascensão do bolsonarismo – que culminou na eleição de Jair Bolsonaro para a presidência do país –, o cineasta Paulo Ferreira, 43 anos, se embrenhou numa missão peculiar. Para entender a obsessão do político e de seus seguidores por armas de fogo, Ferreira deu início a um processo para conseguir a posse e, depois, o porte de um revólver no Brasil. Sem treinamento, exceto sua bagagem de filmes americanos na memória afetiva e as lembranças de conviver com armas na zona rural paulista onde cresceu, em Itapira, o diretor passou quatro anos mergulhado no tema. O resultado será exibido no Festival do Rio a partir desta sexta-feira, 7, no documentário Um Tiro no Escuro – que, em seguida, participa da Mostra de SP. Ferreira falou a VEJA sobre o processo, que lhe demandou muito tempo e dinheiro – mais de 36.000 reais em quatro anos – e a certeza de que ter uma arma em casa não lhe trouxe mais segurança. 

    Por que optou por pesquisar tão a fundo essa temática armamentista? Eu tive contato com armas de fogo desde meu nascimento. Vivi 18 anos na zona rural de Itapira, interior de São Paulo – hoje moro no Rio de Janeiro. Mesmo assim, eu não tinha muito conhecimento a respeito do tema que começou a crescer entre os brasileiros, antes mesmo de o Bolsonaro chegar ao poder. Então me tornei personagem, um cidadão comum, servindo de lente de aumento para entender como é esse processo de se ter uma arma no Brasil. Queria trazer o espectador comigo e usar dados, ouvir os dois lados, para tirar o assunto da superfície. 

    Ouvir os dois lados é uma dificuldade nos dias de hoje, não? Eu deixei claro para todos os entrevistados que faria isso, e acho que consegui. Esse filme não é para os extremistas, de ambos os lados. Acho que vai falar bem com quem está no meio, ou até tem uma arma em casa. Há um descaso com o tema que nos afeta diretamente, querendo ou não. 

    Cena do filme 'Um Tiro no Escuro', de Paulo Ferreira -
    Cena do filme ‘Um Tiro no Escuro’, de Paulo Ferreira (à dir) – (//Divulgação)

    O que mais o surpreendeu nesse processo? Que está havendo uma corrida armamentista, e tem muita gente participando sem nem saber o que está fazendo ali. Estão comprando armas por comprar. Desde 2017, com o governo Temer, começou essa escalada. O porte (que é quando um indivíduo pode portar armas fora de sua residência) aumentou muito. As pessoas compram armas achando que estão seguras, mas é uma falsa sensação de segurança. 

    Qual sua opinião no final? O filme é feito para as pessoas tirarem suas conclusões. Eu me posiciono dizendo que do jeito que está sendo feito, via decreto, na correria, é errado. Não sou contra a posse na zona rural, por exemplo. Mas, no geral, achei a prova de posse ridícula, qualquer pessoa pode passar. É só uma formalidade que não lhe prepara para nada. Enquanto o porte é inviável no país. Não há treino adequado. Na minha experiência, acho que as provas deveriam ser mais difíceis. Eu investiguei a compra de armas ilegais, me ofereceram armas de 50 anos que ainda estão sendo vendidas. Ou seja, as armas que entram hoje no mercado ilegal estarão por aí até 2072, no mínimo. Então, minha opinião é que devemos falar mais sobre isso. Não tem volta.

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