Diretor de ‘Batman’ fala a VEJA: “Pattinson é um ator tremendo”
Matt Reeves conta que fez roteiro pensando no ator de 'Crepúsculo' como herói e diz que se inspirou em serial killer real para compor vilão Charada
Depois de reconceituar Planeta dos Macacos em dois filmes contundentes, o diretor Matt Reeves aplica todo seu comprometimento e convicção para fazer do novo Batman uma experiência visceral. A seguir, ele explica a VEJA como concebeu o filme que estreia nesta quinta-feira, 3, nos cinemas brasileiros:
Entre as adaptações de quadrinhos, um filme de Batman é possivelmente o que mais expectativas desperta, e ao qual mais exigência a a plateia aplica. Que conceitos você usou para materializar, como cinema, esta nova incursão? O tipo de cinema que mais me atrai é o que dá relevo à subjetividade e ao ponto de vista, seja na linguagem clássica de Alfred Hitchcock, seja no trabalho de um inovador como Martin Scorsese. Lembro que, quando eu era criança, meu pai me levou para ver os filmes de Scorsese e eu fui apoderado pela consciência de que havia uma pessoa por trás da câmera – uma sensação tão forte que pensei, “É isso que quero fazer da vida!”. A outra coisa a que reajo emocionalmente é a luz. Ela me afeta e afeta o que sinto a respeito do que estou vendo. De forma que sempre preferi a cinematografia que é impulsionada pela luz suave, a luz refletida ou a sensação de luz real, coisas com que o diretor de fotografia Greig Fraser, com quem eu já havia colaborado em Deixe-me Entrar, trabalha muito bem. Ele realmente se conecta à luz. Muito de Batman se passa à noite, e em Deixe-me Entrar já havíamos falado sobre o que é o escuro em um filme, e qual o efeito de um personagem se materializar da sombra. Exploramos muito isso em Batman, inclusive para que o filme honre a linguagem visual da graphic novel – razão pela qual nos preocupamos também em criar tableaux, ou momentos em que a composição dos quadros fica em evidência, e restringimos muito a variedade de cores. A predominância do vermelho foi decidida já quando Robert Pattinson fez o teste para o filme. Eu queria ver o que aconteceria se ele colocasse maquiagem nos olhos ainda como Bruce Wayne, de terno e não de capuz, e o banhássemos em luz vermelha durante a transformação, enquanto ele se olhava no espelho. Acho que tirei isso de David Lynch, da cena de A Estrada Perdida em que Bill Pullman se materializa da escuridão envolto em luz vermelha. Como qualquer pessoa, eu me inspiro nas coisas que amo – e amo David Lynch, Hitchcock e Scorsese.
Qual foi a primeira ideia que lhe ocorreu, a faísca que deu origem a este Batman? Em tudo o que faço, tento encontrar algo que ressoe comigo pessoalmente. Adoro o Batman, mas a esta altura está fora de cogitação contar uma história genérica sobre o personagem. Quando comecei a pensar em como fundamentar o filme em algo com que eu pudesse me relacionar, uma das primeiras imagens que peguei foi o desenho policial do Assassino do Zodíaco, porque eu estava tentando entender o que seria uma versão real de usar uma fantasia. Da maneira mais sombria, o Zodíaco meio que era como o Batman: ele criou uma roupa, tinha um emblema no peito e usava um capuz. Essa sensação de terror que se pode criar através do anonimato é exatamente o que Batman quer fazer, mas projetando esse terror não para vítimas potenciais, e sim para os criminosos. Deixa de parecer tão fantasioso que, nesse mundo do filme, as pessoas usem máscaras e capas. O Zodíaco me levou também a escolher o Charada como vilão. Eu precisava de um personagem que levasse o Batman nessa jornada noir, e uma das coisas que o Assassino do Zodíaco fazia era deixar códigos e mensagens cifradas, com o intuito de provocar e insultar a polícia e os repórteres que estavam atrás dele. Era parte de seu poder – e esse é o Charada. Não uma versão do Charada que já vimos, mas uma versão possível no mundo real.
A certa altura, você começou a escrever o roteiro com Robert Pattinson em mente, sem saber se seria possível convidá-lo para o papel. Por que ele? Eu li muito sobre o efeito psicológico das máscaras. Quando as pessoas não veem seu rosto, isso traz à tona diferentes aspectos da sua natureza. Em certos contextos, as máscaras podem torná-lo mais altruísta; em outros contextos elas desinibem, e você se permite fazer coisas que de outra forma não faria. Na concepção deste filme, Batman é o sujeito que escreve até quase fora da margem, digamos assim, porque ter a identidade oculta dá a ele um senso de invencibilidade e de poder – e também o divorcia do senso de responsabilidade, o que é muito perigoso. Tinha que haver algo fora de controle nele. Mas estamos nos primeiros dias da carreira de Bruce Wayne como justiceiro, e é preciso não apenas ver a raiva e a periculosidade, mas também sentir o desespero dele e entender que às vezes ele está em queda livre. Comecei então a assistir a filmes com atores nessa faixa etária. Eu já era fã de Rob, porque ele fez um trabalho incrível depois de Crepúsculo. Em vez de fazer outro grande filme comercial, ele escolheu trabalhar com cineastas realmente interessantes e se empenhou em tornar-se um ator tremendo. Um dos filmes com que deparei foi Bom Comportamento, dos irmãos Safdie, em que Rob é de uma volatilidade intensa – um sujeito vulcânico e em guerra consigo mesmo, e que também suscita uma enorme empatia. Pensei, se esse cara pode fazer isso e pode fazer um coadjuvante que eu nem reconheci mas me impressionou pelo carisma em Z – A Cidade Perdida, bem, então esse é o cara. Mesmo antes de terminar o roteiro, comecei a escrevê-lo para Rob. Felizmente, ele se interessou pelo papel.