Fortaleça o jornalismo: Assine a partir de R$5,99
Imagem Blog

Isabela Boscov

Por Coluna Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Está sendo lançado, saiu faz tempo? É clássico, é curiosidade? Tanto faz: se passa em alguma tela, está valendo comentar. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

Em Três Verões, Regina Casé é vítima acidental de escândalo bem nacional

Com naturalidade cativante, a atriz encarna no filme uma personagem típica da crônica do Brasil — a caseira que se vê no centro de um alvoroço

Por Isabela Boscov Atualizado em 4 jun 2024, 15h29 - Publicado em 4 set 2020, 06h00

Enquanto Madá (Regina Casé) ajuda o velho Lira (Rogério Fróes) a caminhar pela praia, seu patrão pede seu celular emprestado. “Mas é pré-­pago!”, desespera-se ela, pensando nos créditos preciosos que Edgar (Otávio Müller) vai queimar. Se Madá não estivesse tão ocupada com Lira, não seriam os créditos a alarmá-la, mas sim o fato de que o dono da mansão de veraneio guardou o próprio telefone no bolso e preferiu sussurrar sua conversa ao aparelho mixuruca da caseira. Madá, porém, está ocupadíssima, com Lira e com tudo o mais: é véspera de Natal de 2015, e ela como sempre capitaneia a brigada de empregados que vai atender os convidados no feriado. Edgar parece perturbado, mas ainda assim Madá acha uma brecha para pedir a ele um pequeno empréstimo para montar um quiosque na rodovia, em torno do qual ela tece fantasias de prosperidade. Ele topa — mas exige em troca o celular dela. No Natal do ano seguinte, com os preparativos em marcha, os empregados recebem a notícia de que não haverá mais festa; os patrões partiram em viagem repentina para o exterior. Madá nem teve tempo de pensar no que fazer com as encomendas e a Polícia Federal já está em peso à porta. Madá descobre que está implicada até o pescoço: o patrão carimbou seu CPF em tudo quanto é negociata.

A crônica político-policial brasileira é populosa em caseiros, porteiros, secretárias e motoristas que, tomados como invisíveis por seus empregadores, viram testemunhas-chave em investigações de corrupção, até sumirem de novo do noticiário — frequentemente, depois de terem sido achacados ou tratados também eles como suspeitos. É pelo lado deles que, em Três Verões (Brasil, 2020), já em exibição em drive-­ins, no Telecine e para aluguel em plataformas de streaming, a diretora Sandra Kogut aborda a rotina de escândalos do país. Ela não poderia ter escolhido rosto mais cativante para simbolizar esses personagens ignorados que o de Regina Casé: capaz de exprimir ao mesmo tempo vivacidade e têmpera, alegria e desolação, a atriz habita com naturalidade incomparável a pele dessas mulheres que batalham e seguem em frente. Confrontada com a própria decepção e com o pânico na cara dos colegas que, como ela, vão ficar sem os atrasados, Madá se vira: com a casa sob sua custódia, aluga-a a hóspedes, organiza passeios de barco nos quais mostra aos turistas as mansões dos corruptos foragidos, usa o espaço como locação de comerciais.

No meio de toda essa atividade, é com Lira, o pai largado para trás e repugnado com o que o filho se tornou (menção talvez mais do que casual a um ex-governador hoje preso), que ela forja seu vínculo mais forte. O pai e a caseira representam, por procuração, todos os contingentes de cidadãos cuja vida desmorona, vez após vez, sob ação de um outro contingente, este de predadores extraordinariamente tenazes. Rápido e bem-humorado mesmo quando é tocante, Três Verões acerta na mosca na cena em que, por intermédio do advogado, Edgar pede aos empregados deixados sem salário que tenham “compreensão” para com seu “momento difícil”: no entender da saúva, é ela a vítima, não a árvore que ela roeu.

Publicado em VEJA de 9 de setembro de 2020, edição nº 2703

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.