Um fenômeno ainda não compreendido está alterando a órbita da Lua e fazendo com que ela se aproxime rapidamente da Terra: dentro de dias, a gravidade terrestre deve despedaçar o satélite, que choverá, aos pedaços (e bote-se pedaço nisso), sobre a superfície do planeta, destruindo-o – ou destruindo aquilo que já não estiver destruído pelas marés que começam a atingir dezenas de metros, a intensificação da atividade vulcânica e outros eventos cataclísmicos. Bem que o professor KC Houseman tentou avisar a Nasa do estranho – ou lunático – comportamento lunar. Mas, claro, ninguém deu ouvidos ao nerd rechonchudo e afeito a teorias extravagantes, que o inglês John Bradley, em seu primeiro papel de destaque desde o Samwell Tarly de Game of Thrones, interpreta com ar de quem sabe que se lascou, mas agora é tarde e o jeito é ir em frente.
Não é improvável que parte da plateia, ao menos, se solidarize com os sentimentos de Bradley e do restante do elenco. Filmes-catástrofe são aquele programa que pode ser bom até quando é ruim: o espectador ajusta as expectativas sobre lógica, coerência e rigor científico – e sobre a qualidade da dramaturgia – para se divertir com as cenas espetaculosas de hecatombes variadas ou combinadas, até o desfecho em que, invariavelmente, algum dos protagonistas encontra uma solução para a devastação planetária e todos se cumprimentam, felizes, apesar das escoriações. Mas o Moonfall: Ameaça Lunar do diretor Roland Emmerich, já em cartaz nos cinemas, abusa do direito à bobagem e também de outro direito ainda, o de repetir uma fórmula já muito surrada e, em boa parte, inventada pelo próprio diretor em Independence Day, e lá se vai um quarto de século.
A sequência de abertura, por exemplo, é um decalque descarado (e barateado) do início do Gravidade de Alfonso Cuarón; o truque do astronauta – preencha com a profissão da ocasião – caído em desgraça (Patrick Wilson) que tem de acertar as diferenças com uma ex-colega e ex-amiga (Halle Berry) para salvar a humanidade está rodando por aí desde que o mundo é mundo, ou que a Lua é Lua. Estaria mais do que na hora, também, de declarar moratória ao nerd com sobrepeso como alívio cômico, mas Moonfall não só insiste nele como o combina a outra figura obrigatória, a do cientista que é desacreditado por profetizar uma desgraça que já está em vias de acontecer. E, óbvio, não poderia faltar o draminha familiar preferido de nove entre dez filmes-catástrofe, o do pai divorciado que, graças à tragédia (o “graças” é por conta do roteiro) se reaproxima do filho (Charlie Plummer).
A verdade é que todos esses clichês são facilmente perdoados quando as cenas de ação e destruição impressionam – aqui elas não passam do regular – e quando o filme proporciona alguma diversão de fato, o que Emmerich soube oferecer em boa quantidade em Independence Day e em O Dia Depois de Amanhã, que tinha ótimas sacadas e, surpresa, não se saía mal na ciência (soa contra-intuitivo mas, sim, a elevação da temperatura global pode em tese levar a frios muito mais severos no hemisfério Norte. Assunto para outra hora). Aqui, porém, a explicação para o desabamento da Lua é um vexame que, não se bastando em si mesmo, serve de pretexto para um casamento entre Star Wars – Uma Nova Esperança e 2001 – Uma Odisseia no Espaço. Fãs de um e de outro certamente têm objeções a que essa união se realize – ainda mais assim, com noivos que mal sabem o nome um do outro e vão, bêbados, trocar alianças de plástico em alguma capela de Las Vegas.