Tóquio 40 graus
Quando me perguntam qual é a melhor época para vir ao Japão, a primeira coisa que costumo dizer é qual a época a evitar: o verão
Os termômetros marcam 32, 33 graus. “Não é tanto assim”, vocês podem pensar. Mas com uma umidade do ar sem oponentes e digna de medalha de ouro, prata e bronze, somem aí alguns bons graus para se ter uma ideia da sensação térmica nas ruas de Tóquio. O verão japonês é cruel — e foi morando aqui que deixei de exaltá-lo como estação favorita. Quando me perguntam qual é a melhor época para vir ao Japão, a primeira coisa que costumo dizer é qual a época a evitar: os meses de julho e agosto.
Não à toa, os Jogos Olímpicos de Verão de 1964, em Tóquio, aconteceram em outubro, em pleno outono. O calor, já naquela época, não dava trégua. Imaginem então agora, passados quase 60 anos de aquecimento global. Em 2021, o verão japonês tem deixado suas marcas nos Jogos — que o diga Kristian Blummenfelt. Na última segunda-feira, o triatleta norueguês passou mal (mesmo) depois de cruzar a linha de chegada em primeiro lugar e teve que ser retirado da arena numa cadeira de rodas.
Quem endossa as queixas contra o calor é o número 1 do tênis. Mesmo vencendo com folga em seu jogo de estreia, Novak Djokovic fez um apelo para que as partidas sejam transferidas para o final da tarde por causa das temperaturas extremas. Pela programação atual, os tenistas são colocados para cozinhar lentamente a partir das 11 horas da manhã, o ideal para pegarem bem o auge do calor do dia.
Numa tentativa de amenizar a situação, os organizadores dos Jogos oferecem um mimo para os jogadores se refrescarem nos intervalos, num gesto de omotenashi. O termo, que pode ser entendido como o espírito japonês de hospitalidade, se traduz no cotidiano no cuidado primoroso com embalagens ou na forma de entregar um cartão de visitas, sempre com o texto voltado a quem o recebe. Aos atletas condenados pelo calor, o omotenashi aparece em toalhas geladas, sacos de gelo e em tubos de ar refrigerado, segurados gentilmente por voluntários visivelmente abatidos.
No dia a dia, contamos com apetrechos mais discretos. Das clássicas sombrinhas a ventiladores portáteis, recorremos a diversos aparatos para ajudar a aliviar o calor. O meu preferido são os lenços umedecidos que saem geladinhos do pacote, um must-have da estação que forra as prateleiras das perfumarias. Com efeito similar, os sprays de gotículas resfriadas prometem baixar a temperatura da pele, ainda que momentaneamente.
Há também opções mais engenhosas, que surpreendem visitantes de primeira viagem. Coletes e jaquetas turbinados com ventiladores são uma realidade por aqui, que acabam sendo adotados, principalmente, por trabalhadores que passam longas jornadas nas ruas. Uma inspiração, quem sabe, para o design dos uniformes da Copa no Qatar.
Piti Koshimura mora em Tóquio, é autora do blog e podcast Peach no Japão e curadora da Momonoki, plataforma de cursos sobre o universo japonês. Amante de arquitetura e exploradora de becos escondidos, encontra suas inspirações nos elementos mundanos. (@peachnojapao | @momonoki_jp)