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A casa caiu na Colômbia: os grandes partidos estão fora do jogo

Gustavo Petro, pela esquerda, e Rodolfo Hernández, pela direita, fizeram desabar o condomínio colombiano que domina o poder há mais de um século

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 30 Maio 2022, 09h30

Desabou ontem na Colômbia um condomínio político-partidário que se revezava no poder há um século e meio.

Quem pôs abaixo a sesquicentenária construção co-habitada pelos grandes partidos dos conservadores, liberais e da extrema-direita foram os candidatos presidenciais Gustavo Petro, economista, e Rodolfo Hernández, empresário.

Petro, 62 anos, senador, lidera uma coalizão multicolorida (Pacto Histórico) de movimentos cuja peculiaridade é a contestação às organizações tradicionais da esquerda.

É a sua terceira tentativa de chegar ao poder. Antigo guerrilheiro do socialista M-19 transmutado no ativismo ambiental, conseguiu se eleger prefeito de Bogotá em 2014.

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Fez um governo polêmico e acabou destituído vinte meses depois da posse no meio de uma grave crise ambiental: tomou das empresas privadas o serviço de lixo urbano e a cidade ficou semanas sem coleta, com detritos acumulados nas ruas.

Ontem, Petro brilhou nas urnas. Arrebatou 8,5 milhões de eleitores, numa disputa com a menor abstenção (45%) das últimas duas décadas.

Com 40,3% dos votos válidos, realizou uma proeza: pela primeira vez, há uma perspectiva real de poder para o agrupamento de movimentos sociais e políticos de matiz esquerdista que ele começou a reunir na desmobilização das organizações guerrilheiras, e está em ascensão eleitoral desde a Constituinte de 1991.

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Petro surfou na campanha. Com média de 40% nas pesquisas – exatamente o resultado nas urnas —, focou numa agenda de promessas de rígida regulação ambiental, com redução do extrativismo de petróleo e carvão e substituição gradual por energias renováveis, a construção de uma versão colombiana do SUS e mudanças no sistema de previdência social. Era previsível sua presença no segundo turno.

Surpresa mesmo, foi a meteórica ascensão de Rodolfo Hernández, 77 anos, empresário da construção civil.

No segundo semestre do ano passado, ele aparecia com 10% nas pesquisas (CNC, Cuarumo e Ivamer, entre outras). Ficou estacionado nesse patamar até a primeira quinzena de maio e disparou nas últimas duas semanas.

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Foi dormir com 5,9 milhões de votos contados, o equivalente a 28,1% do total de válidos.

Hernández é um legítimo representante daquilo que no Brasil se reconhece como baixo clero da política.

Aos 77 anos, cabelos pintados de amarelo, se apresenta como candidato da antipolítica, embora dispute eleições há mais de três décadas na região de Santander, um dos 32 estados colombianos. Foi vereador em Piedicuesta e, depois, prefeito de Bucaramanga, sede metropolitana, a 400 quilômetros de Bogotá.

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Hernández montou uma coalizão na periferia do conservadorismo. Vai ao segundo turno como candidato da Liga dos Governantes Anticorrupção, apesar de ter sido obrigado a renunciar ao cargo de prefeito por causa do envolvimento de familiares em negócios obscuros de empresas privadas com a prefeitura durante o seu mandato.

Rico, diz possuir patrimônio de US$ 100 milhões (R$ 500 milhões), costuma se referir aos adversários como ladrões, sempre lembrando que se autofinancia na política.

Construtor, promete casa para os pobres. Empresário, acena com a “organização” do Estado colombiano e a expansão da exploração de petróleo a partir da liquidação de parte da legislação ambiental.

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Rodolfo Hernández, segundo colocado: ascensão meteórica em quinze dias terminou com 5,9 milhões de votos contados, 28,1% do total de válidos — (./Reprodução)

Algumas vezes é descrito como uma versão tropical de Donald Trump, outras como variante andina de Jair Bolsonaro.

Fez uma campanha nada convencional, baseada na dinâmica das redes sociais. Escapou de debates, comícios e reuniões sempre dizendo que precisava dormir — repetiu ontem, para não falar em público depois da apuração. Se projetou como personagem folclórico, do tipo ignorante da geografia nacional e capaz de propagar sua admiração por Hitler, para depois dizer que se enganara, queria pronunciar “Einstein”.

Não se conhecem detalhes do projeto de Hernández para a Colômbia, exceto platitudes resumidas na abertura de um folheto: “Onde ninguém rouba, o dinheiro é suficiente”.

Porém, na sua vitória transparece o fim de uma era sesquicentenária de troca de guarda no poder entre os mais tradicionais grupos liberais, conservadores e da extrema-direita colombiana.

Pela primeira vez em vinte anos, por exemplo, não haverá no segundo turno de uma disputa presidencial (19 de junho) um representante do ideário de direita que ajudou o ex-presidente Álvaro Uribe a eleger sucessores e dominar expressiva bancada parlamentar.

Ontem, Hernández “foi o triunfo contra o establishment”, observou a senadora María Fernanda Cabal, de Cáli, expoente da direita na ala comandanda pelo ex-presidente Uribe. Mas a reconstrução já começou e será em torno de Hernández. “O país necessita de mudanças” — ela argumentou. “Não do suicídio que oferece Petro, mas, sim, da autoridade, da ordem e da prosperidade que oferece um empresário.”

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