Amanhã, no reinício das atividades do Congresso, vai ficar exposta uma grande confusão na base governista.
Partidos que integram o núcleo do Centrão negociam a composição de uma federação para atuar de forma unificada na campanha eleitoral e durante o próximo governo. Mas é grande a confusão com os recém-chegados bolsonaristas.
A ideia de união partidária é atraente no bloco. Em tese, garantiria disciplina parlamentar em torno de um programa comum, com selo institucional válido até 2027, a essa massa disforme de centro-direita que, hoje, atua como esteio de Jair Bolsonaro e apoia seu projeto de reeleição.
Mas não vai ser fácil, já constataram líderes do Partido Liberal, do Progressistas e do Republicanos.
Eles reúnem 116 deputados federais. Costumam agregar outros 28 abrigados no PTB, no PSC e no Patriota, formando um núcleo de 144 votos no plenário da Câmara. Compõem maioria em votações (o mínimo exigido é de 257 votos) com frações do PSL, DEM e MDB, entre outros partidos.
Paradoxalmente, as dificuldades no avanço do grupo para uma federação partidária de centro-direita são intrínsecas à própria gênese de cada um dos partidos.
O que os une nesta temporada eleitoral não é Bolsonaro, mas a rejeição ao “modelo” de convivência com Lula, favorito nas pesquisas, e com o Partido dos Trabalhadores no ciclo 2002-2016.
A submissão à hegemonia petista deixou marcas na memória de líderes do PP e do PL. Das parcerias em negócios na era petista ficou um legado de prontuários, inquéritos e sentenças condenatórias – o PP, por exemplo, acabou recordista em investigados na Operação Lava Jato.
Em coalizões somente o partido do governo toma decisões, e o PT fez isso melhor que qualquer outro em pouco mais de 12 anos no poder.
Isso não significa que, se Lula vencer a eleição, o Centrão vá se recusar a apoiar o governo — uma das características desse agrupamento partidário é a habilidade na costura de alianças com qualquer que seja o governo, em troca do comando de áreas-chave da administração federal.
Suprapartidário, o Centrão não tem endereço, CNPJ, CPF, placa na porta de de gabinete. Não é de direita, de centro ou de esquerda. É do Orçamento.
O governo Bolsonaro entregou o orçamento ao grupo partidário predominante nos plenários da Câmara e do Senado.
Beneficiário, o Centrão pretende manter isso aí e, se possível, avançar nesse formato de “semi-presidencialismo”. O deputado Arthur Lira (PP-AL) programa uma série de debates sobre o tema, no qual pretende basear sua campanha à reeleição na Presidência da Câmara, em fevereiro do próximo ano.
Essa, no entanto, é outra dificuldade na negociação de uma federação partidária. Há questões em aberto sobre quem e como se decide a partilha dos recursos, sejam do orçamento ou dos fundos públicos (eleitoral partidário) e, no futuro, dos cargos no governo. E, também, quais os critérios para igualar os desiguais — PP e do PL, hoje, têm uma dezena a mais de deputados que o Republicanos e o dobro do PSC e PTB.
Mais difícil ainda é definir bases de um acordo sobre a escolha de candidatos à Câmara, ao Senado e aos governos estaduais e a forma de divisão da dinheirama (cerca de R$ 900 milhões) que os partidos do Centrão devem receber nesta temporada eleitoral.
Em muitos aspectos, são problemas similares aos enfrentados pelos adversários como o PT, o PSB e o PCdoB, na montagem de uma federação partidária.
No Centrão, porém, há um fator adicional de confusão: a migração dos bolsonaristas.
Valdemar Costa Neto, dono do Partido Liberal, abrigou Bolsonaro para a campanha, aceitou parte dos seus seguidores e permitiu-lhe a escolha de candidatos a deputado, senador e governador em alguns Estados.
Agora, enfrenta uma disputa interna. Tem R$ 340 milhões em recursos públicos e precisa bancar a campanha dos candidatos do partido, além financiar Bolsonaro e seus aliados.
Depois da eleição terá o desafio da convivência com o grupo bolsonarista sem perder o poder sobre o PL, coisa da qual não abriu mão nem mesmo quando habitava uma cela no Presídio da Papuda, em Brasília, cumprindo pena do caso Mensalão.
Pior é a situação no PTB, onde aliados de Bolsonaro brigam abertamente pelo poder, com o projeto de transformá-lo no mais conservador dos partidos políticos brasileiros.
O ex-deputado Roberto Jefferson, dono do PTB, está doente e isolado em prisão domiciliar na serra fluminense.
A ala bolsonarista avança no controle, sob orientação do empresário paulista Otavio Fakhoury, financiador de Bolsonaro na eleição de 2018.
Em jogo está um caixa de R$ 130 milhões para eleição.