Governo abre o caixa para impulsionar reeleição de Bolsonaro
No Palácio do Planalto, a única conta que importa hoje é a dos votos para a reeleição em outubro
Na manhã da última quinta-feira, o deputado Christino Áureo (PP-RJ) viajava pela estrada que ladeia a cidade de Casimiro de Abreu, no Estado do Rio, quando recebeu uma mensagem do governo. Em minutos, gravou um video e distribuiu por rede social: “Acabei de receber a notícia dada pela ministra Tereza Cristina [da Agricultura], que, mesmo em viagem, fez questão de nos avisar.
“O Pronaf, Programa Nacional de Agricultura Familiar será reaberto” — acrescentou. “Serão R$ 840 milhões de créditos adicionais para a agricultura familiar. Nos próximos dias vai sair uma portaria do Tesouro Nacional.”
Parlamentares aliados do governo, têm sido estimulados na batalha por dupla reeleição — a própria e a de Jair Bolsonaro — por notícias novas, diárias, sobre abertura dos cofres federais.
Áureo, médico veterinário, antigo funcionário do Banco do Brasil, é um político fluminense habituado a ser governo, e pretende continuar assim.
No fim de semana procurou prefeitos da região Norte do Estado do Rio com orientações precisas sobre o acesso a verbas federais durante a temporada eleitoral.
Prefeitos precisam mobilizar pessoal, aconselhou, numa “busca ativa” nos cadastros municipais para localizar pessoas que podem receber benefícios sociais.
No alvo devem estar famílias com renda domiciliar até meio salário mínimo, com idosos, portadores de deficiência física e mulheres vítimas de violência doméstica. Elas funcionam como multiplicadoras das boas notícias governamentais nas áreas pobres das cidades, especialmente nos cultos religiosos, onde não é difícil encontrar evangelizadores do antipetismo.
Pela legislação, essas famílias já têm direito a receber até um salário mínimo mensal. A novidade disseminada por parlamentares é que há previsão de pagamento neste ano eleitoral (na vida real, há dois anos o INSS represa pedidos do gênero, fazendo caixa com o dinheiro pendente de 1,8 milhão de pessoas, quase todos pobre, idosos “em vulnerabilidade” e portadores de deficiência permanente.)
É grande a caixa de surpresas eleitorais que Bolsonaro começou a abrir. Vai além dos R$ 400 mensais do Auxílio Brasil para 18 milhões de famílias sobreviventes na extrema pobreza. Esse dinheiro pode fazer a diferença “entre comer ou não, ser despejado ou conseguir pagar o aluguel”, como diz Guilherme Boulos, aliado de Lula e candidato do Psol ao governo de São Paulo: “Não é pouca coisa em tempos de vacas magras.”
No Palácio do Planalto projeta-se a campanha de reeleição de Bolsonaro com pleno uso do poder, como ocorre nos governos há 24 anos.
Evocar histórias de corrupção e de má gerência nos governos Lula e Dilma Rousseff é parte do cardápio. O complemento é a mobilização de recursos federais em programas sociais, com foco em públicos específicos.
Simultaneamente, vai-se contar ao eleitorado uma história sobre “o maior plano assistencial da história do Brasil”, como define o chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, senador e presidente licenciado do PP. “Aceitem que dói menos”, tem repetido à oposição, “são 15 anos de bolsa família num único ano, o auxílio assistencial”,
Em execução, também, está a ideia de enredar opositores numa “união de esforços para garantir comida na mesa”, nas palavras de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara. Na prática, isso quer dizer provocar um acordo legislativo para redução de tributos sobre gasolina, diesel e gás de cozinha. A negociação já começou, com participação do PT de Lula.
“O barril subiu de menos de US$ 30 para mais US$ 80”, argumentou Lira em redes sociais. “Ou seja, mantendo a alíquota [do ICMS estadual sobre combustíveis, os governadores] arrecadaram quase três vezes mais. É matemática simples.”
Estão previstas, ainda, iniciativas como:
* Subsídio à passagens de ônibus grátis para pessoas com mais de 60 anos;
* Simplificação de contratos de trabalho direcionada a pessoas com até 29 anos de idade, com foco em jovens da periferia urbana que não estudam e estão fora do mercado de trabalho;
* Acenos à classe média no Imposto de Renda do próximo ano, com possibilidade de isenção para 10 milhões de contribuintes, e, também, com novos mecanismos de penhora de bens e garantias. Pretende-se facilitar, por exemplo, o uso de um mesmo imóvel familiar como lastro em diferentes operações de financiamento;
* Renegociação de dívidas de financiamento estudantil, com perdão (92%) e parcelamento do restante (8%) em até 150 meses.
Há uma série de outras medidas delineadas, programadas em coerência com o calendário eleitoral. Não importam os custos, mesmo numa crise econômica, com desequilíbrio fiscal, inflação, juros e dívida pública em alta. No governo Bolsonaro, a única conta que importa hoje é a dos votos para a reeleição em outubro.