Lula cobra aliados que querem ser oposição sem sair do governo
O problema de Lula é como vencer uma eleição sem ter partidos do centro e da direita numa aliança para governar, que todos sabem, só vale até à posse

Lula converteu uma reunião ministerial em ato típico de campanha eleitoral. Falou da participação na disputa presidencial do ano que vem, foi prolixo em autoelogios na administração e cobrou fidelidade eleitoral dos partidos que hoje integram o governo.
Nesta terça-feira (26/8), 39 ministros e assessores estiveram trancados por quase três horas numa sala de reuniões do Palácio do Planalto. Acompanharam, entre outras coisas, a apresentação de materiais de propaganda, como um novo slogan (“Brasil soberano”) para a publicidade governamental. Se deixaram fotografar usando peças de marketing como bonés azuis com inscrição (“O Brasil é dos brasileiros”) de contraponto publicitário aos ataques de Donald Trump ao país.
Lula se mostrou preocupado com a relutância dos partidos aliados, que integram o grupo parlamentar conhecido como Centrão. Falou sobre fidelidade e cobrou coerência. Lula se elegeu em 2022 a bordo de ampla aliança que, na prática, detonou logo no início do governo.
Partidos de centro e de direita estão no governo, ocupam uma dezena de ministérios e empresas estatais relevantes, como a Caixa Econômica, mas há tempos não votam com o governo no Congresso nem planejam participar de uma aliança eleitoral com Lula. Ao contrário. No bloco União Brasil-Progressistas, por exemplo, líderes falam abertamente em debandada do governo e campanha antiLula em 2026.
O problema desses líderes é a realidade. Em março de 2023, quando Lula ainda não completara três meses de mandato, o Partido Progressistas reuniu sua bancada de 55 parlamentares. Com a naturalidade de quem havia chefiado a Casa Civil de Jair Bolsonaro, o senador piauiense Ciro Nogueira sugeriu aos deputados e senadores que o PP assumisse a vanguarda da oposição ao governo petista.
Nogueira estava propondo reescrever a história de um partido nascido da fusão de grupos da antiga Aliança Renovadora Nacional (Arena), esteio parlamentar da ditadura, e que neste século passou década e meia aliado a Lula e Dilma. Os laços com governos petistas renderam ao PP protagonismo em processos criminais do mensalão e da corrupção na Petrobras — nesse caso, com o maior número (18) de políticos investigados na Lava Jato.
Quando acabou de discursar, foi chamado a um grupo num canto do salão. Ouviu uma bem-humorada provocação no sotaque nordestino:
— Tá tudo muito bom, tudo muito bem, mas, ô Ciro, ensina aí pra gente como é ser oposição…
Ele rebateu com humor: — Vamos cobrar gritando: “Cadê a picanha?” — referência à promessa mais repetida por Lula na campanha de 2022 (“O povo vai voltar a comer um churrasquinho, uma picanha e tomar uma cervejinha.”).
Foi quando Luiz Eduardo, o deputado “Lula” de 22 anos e quatro oligarquias pernambucanas no sobrenome (Queiroz Campos da Fonte Albuquerque), emendou: — É, tio, mas esse negócio de óculos Ray-Ban, sapato branco e oposição só fica bonito nos outros…
O dilema do Progressistas, do União Brasil e outros partidos do centro e da direita é o mesmo há 32 meses: como fazer oposição a Lula sem sair do governo. O problema de Lula é como sair vencedor de uma eleição sem ter partidos do centro e da direita numa aliança para governar, que todos sabem, só vale até à posse.