Sergio Moro ensaiou entrar em campo e Jair Bolsonaro e Ciro Gomes se apressaram em atestar o incômodo que representa a eventual participação do ex-juiz da Lava Jato na disputa presidencial.
“Não aprendeu nada, não aprendeu nada”, atirou Bolsonaro. “Um ano e quatro meses ali [no Ministério da Justiça], e não sabe o que é ser presidente nem ser ministro.”
Ciro Gomes jogou ácido: “Quer usar a campanha eleitoral como divã de psiquiatria para sua crise de identidade: se é um juiz-político ou um político-juiz.Lula escolheu o silêncio e foi à Alemanha agradecer Martin Schulz — “companheiro das horas mais difíceis, a quem sou grato por ter feito questão de ir até o Brasil me visitar quando estava preso em Curitiba”.
Quando Schulz esteve na cela de Lula, em agosto de 2018, Bolsonaro despontava como catalisador do antipetismo e Ciro Gomes se queixava do boicote do PT.
Desde então, Schulz trocou a presidência do Parlamento Europeu pelo comando da Fundação Friedrich Ebert, do partido social-democrata alemão (SPD), que há tempos financia projetos da Fundação Perseu Abramo, núcleo de estudos do PT.
Moro condenou Lula, depois aceitou e 16 meses mais tarde abandonou o Ministério da Justiça de Bolsonaro (“nenhum cargo vale sua alma”, justifica).
Entrou na pista das eleições gerais de 2022 se apresentando no plural (“nós, da classe política”). Em discurso, citou 25 vezes seu projeto mal delineado para “o país”. E mostrou que ainda não desencarnou da toga e da alma de juiz da Lava Jato, ao evocar “a corrupção” 18 vezes e propor “uma corte nacional” de julgamento, ideia cuja ambiguidade ecoa o risco das nefandas comissões de investigação da última ditadura.
Moro é um fenômeno eleitoral, informam as pesquisas. Atravessou silente a tempestade de críticas dos últimos oito meses, só proporcional aos elogios que recebia quando liderava a Lava Jato. Conseguiu, porém, manter fiel a preferência de uma fração do eleitorado ao redor de 9%.
Não é pouco para um estreante. Equivale à posição ocupada, nas mesmas pesquisas, por Ciro Gomes cuja biografia tem quatro décadas na política, e avança na quarta tentativa de chegar à Presidência da República com fragilidades no próprio partido, o PDT.
Moro foi recebido com pompa no Podemos, dono de bancadas de 11 deputados federais e 9 senadores, e enfrenta sua primeira batalha: provar internamente que é um candidato presidencial competitivo, como sugerem as pesquisas. Reflexos disso se espraiam por sua agenda das próximas duas semanas, intensa em entrevistas e presença em reuniões como as promovidas pelo Movimento Brasil Livre e no Fórum Global de Economia, em Manaus.
A um ano da eleição, e com Lula e Bolsonaro rejeitados por parte significativa do eleitorado, é previsível o crescimento nas pesquisas de Moro e de Ciro Gomes, entre outros.
Alguns aspirantes ainda nem tiveram chance de se apresentar, por indefinições partidárias. É o caso dos pré-candidatos do PSDB, que disputam eleição prévia. E, também, do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, do Democratas, partido em processo de fusão com outro, o PSL, para o futuro União Brasil.
Mandetta estava na plateia de filiação de Moro ao Podemos, na quarta-feira, em Brasília. Dali saiu para conversas em Belo Horizonte. “Falo com todos os pré-candidatos”, explicou. “Todos têm um bom princípio comum, querem fazer um país diferente do que sinalizam esses dois buracos negros, que são Lula e Bolsonaro. E, toda vez que converso, faço o mesmo apelo: quem quer ser apoiado precisa se dispor a apoiar. Agora, vamos ver se eles vão conseguir ter o altruísmo de se sentar à mesa e compor um bom grupo político.”
É tudo treino, por enquanto. O jogo só começa mesmo depois do verão.