“Estamos apanhando sem parar. E aí? Qual é a nossa situação e o que fazer?” — desabafou a deputada Carla Zambelli, do PSL de São Paulo, em vídeo divulgado três semanas atrás, quando a CPI do Senado tornou públicas as obscuras transações no Ministério da Saúde sobre compras de vacinas inexistentes no meio da pandemia.
Ela e outros parlamentares aliados de Jair Bolsonaro atravessaram o fim de semana tentando explicar que votaram a favor da triplicação (de R$ 2 bilhões para 5,7 bilhões) do fundo de financiamento de campanhas eleitorais, mas são contra.
Devotos políticos de Bolsonaro estão ameaçados de expulsão do PSL, que já expurgou dois deputados estaduais em São Paulo. Não são vítimas, apenas considerados extremistas. E, por isso, têm sido rejeitados quando procuram outros partidos.
Semana passada, um dos mais entusiasmados seguidores do presidente, o ex-ministro Abraham Weintraub, sondou o PTC. Recebeu um enfático “nunca, jamais” do presidente do partido, Daniel Tourinho, o mesmo que em 1988 abrigou Fernando Collor, na época um candidato à procura de partido para disputar a presidência.
O clima é oposto ao que os bolsonaristas encontraram na preparação da campanha de 2018. Supera suas expectativas mais negativas, porque assistem à crescente cobrança dos respectivos eleitores sobre as consequências do desgoverno na pandemia, o avanço da inflação, a triplicação do fundo eleitoral e até a indução de suspeitas sobre o sistema de votação eletrônica, que sancionou a vitória deles em 2018, e de Bolsonaro nos últimos 25 anos, sem contestações.
É notável que isso esteja ocorrendo com os aliados de um presidente em campanha pela reeleição há dois anos e meio, mas sem partido. Ele tentou vários, ainda não conseguiu e sempre pela mesma razão: pretende ser absoluto no controle do caixa, nas indicações de candidatos e na definição das alianças regionais.
Bolsonaro enfrenta uma contra-corrente na organização política. Os partidos estão preocupados, como nunca, em garantir sua expansão nos plenários do Congresso. É questão de sobrevivência eleitoral e, naturalmente, de caixa— o acesso aos fundos públicos é proporcional ao tamanho da bancada.
A alta rejeição do presidente-candidato, hoje, pode ser revertida adiante, mas esse eventual benefício, se houver, tende a ser exclusivo dele, acham dirigentes de partidos. Com um eleitorado se mostrando enfastiado nas pesquisas, o abrigo à tropa extremista passou a ser percebido como fator de risco.
O poder de sedução do bolsonarismo se esvai no jogo democrático, onde nada é permanente, exceto a “mudança” — talvez, a palavra mais sedutora da política.