“Quem governa a Rússia hoje? Estudamos as trajetórias de carreira e biografias das 100 principais famílias que compõem a elite de [Vladimir] Putin. Os resultados são impressionantes. Trinta anos após o colapso da União Soviética, mais da metade (60%) das 100 principais elites de Putin têm laços com a nomenklatura soviética [a casta dirigente do antigo regime comunista] — seja por meio de famílias ou por meio de suas próprias carreiras. Analisamos, também, a variação ao longo do tempo, para 2010 e 2020. Os resultados em ambos os casos foram praticamente os mesmos (…) As atuais elites de Putin são predominantemente do sexo masculino, não mais de 5 a 8% da amostra são do sexo feminino. Nasceram nas décadas de 1950-60, ou seja, têm a mesma idade que Putin. A maioria deles já havia feito carreira na nomenklatura via Komsomol [a organização juvenil do Partido Comunista da União Soviética , o PCUS] ou outras carreiras quando a URSS entrou em colapso [em 1991]. Na maioria das vezes, eles estavam associados às camadas inferiores e médias da nomenklatura soviética, não ao topo — as pessoas dentro e ao redor do Politburo [comitê central do partido comunista]. Mas de onde veio um número tão grande de pessoas com raízes de nomenklatura no topo do atual sistema russo? Os números nos levam à conclusão de que o colapso da URSS não levou a uma mudança das elites (…) Na Rússia do final da década de 1980, diferentemente de muitos países do Leste Europeu, a força motriz para mudanças não era um movimento de massa liberal-democrático vindo de baixo, mas a nomenklatura média e inferior. Esse grupo social estava extremamente insatisfeito com suas perspectivas no final da União Soviética, o sistema ‘gerontocrático’ sem oportunidades de crescimento de carreira e líderes morrendo de velhice (…) A Rússia de hoje é amplamente governada pelas mesmas pessoas que governaram a URSS. Infelizmente, em 20 anos a Rússia não viu o surgimento de motores alternativos de liberalização (…) Nossa análise da composição das elites da Rússia mostra que, em muitos aspectos, voltamos à situação que existia no final da União Soviética, onde ‘gerontocratas’ do partido dirigiam o sistema sem oportunidade de crescimento na carreira e morriam de velhice em seus cargos (..) Isso deixa a esperança de que, devido ao ciclo da vida, as pessoas nascidas nas décadas de 1950 e 1960 serão gradualmente substituídas por um grupo de elite com visões diferentes. E que a atual base da elite de Putin, frustrada pela falta de perspectivas de carreira em meio a uma economia estagnada devido às sanções internacionais, possa relançar processos de liberalização semelhantes aos que ocorreram no final da União Soviética.”
(Maria-Snegovaya, pesquisadora do Centro de Análises da Política Europeia, de Washington, ao The Insider, de Moscou.)