Câncer de colo de útero: tabus e desinformação seguem fazendo vítimas
No Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher, especialista reforça a importância de se vacinar contra o HPV e prevenir um tumor em alta no Brasil
O sistema de saúde brasileiro é modelo na disponibilização de atendimento gratuito aos cidadãos, especialmente em comparação com outros países, nos quais muitas pessoas precisam custear sua assistência, sem a opção de um atendimento público. Mas, definitivamente, existem ainda disparidades regionais e lacunas no acesso a serviços, incluindo a educação em saúde, a prevenção e os tratamentos focados nas mulheres e nas meninas, com o claro objetivo de reduzir o impacto de doenças e da mortalidade entre elas.
O assunto preocupa ainda mais ao levar em conta a incidência de uma doença, o câncer de colo de útero, que continua alta no Brasil, principalmente entre mulheres jovens.
Uma estratégia essencial para a prevenção desse tipo de câncer é a imunização contra o papilomavírus humano (HPV), que protege contra os tipos virais que causam verrugas genitais e são responsáveis por cerca de 70% dos casos de câncer do colo do útero, o terceiro mais incidente entre as mulheres brasileiras.
O HPV é um vírus comum e a maioria das pessoas tem contato com ele ao longo da vida. Quase sempre, o patógeno é eliminado naturalmente. No entanto, se a infecção persistir, podem surgir lesões que, se não tratadas, podem levar à formação de um tumor.
Quando o câncer de colo do útero é detectado em fase inicial, pode ser curado em quase todos os casos. No entanto, é frequente as mulheres descobrirem quando ele já se encontra em estágio avançado, o que dificulta o tratamento e reduz as chances de sucesso.
Isso acontece porque sinais e sintomas como sangramento vaginal, corrimento e dor aparecem somente em fases mais avançadas da doença. Daí a importância não só da vacinação, mas de exames preventivos, caso do papanicolau.
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Além do HPV, existem outros fatores de risco envolvidos na doença, como o tabagismo, a iniciação sexual precoce, a pluralidade de parceiros sexuais, múltiplas gestações e o uso de contraceptivos orais. Felizmente, a maioria das infecções por HPV em mulheres com menos de 30 anos desaparece sem maiores problemas, mas, acima dessa idade, a prevalência de quadros mais sérios aumenta.
Embora haja muitos mitos e dúvidas em torno da vacinação contra o HPV em crianças e adolescentes, é fato que a imunização, o rastreamento e o tratamento das lesões causadas pelo vírus são estratégias comprovadas para a redução dos perigos. A vacina, especialmente, tem o potencial de eliminar o câncer de colo de útero, desde que as metas de imunização sejam atingidas e mantidas, o que lamentavelmente não vem acontecendo nos últimos anos.
Atualmente, ainda que o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibilize a vacina contra o HPV para meninos e meninas de 9 a 14 anos, a cobertura em 2022 alcançou somente 75,81% das meninas e 52,16% dos meninos, ante a meta de 90%.
A imunização dos meninos é uma medida importante para ampliar a proteção às mulheres de amanhã, por meio da interrupção do contágio viral. Por isso, é essencial que as famílias mantenham atualizadas as carteiras de vacinação de seus filhos e de suas filhas, mesmo que eles ainda não sejam sexualmente ativos.
Precisamos aliar a vacinação a campanhas de educação e conscientização sobre a importância da consulta ginecológica e dos exames preventivos, sobretudo nas regiões mais acometidas pelo câncer de colo do útero, o Norte e o Nordeste.
O Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima que, em 2023, mais de 17 mil mulheres serão diagnosticadas com a doença. Neste Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher, junte-se a nós para mudar o cenário, usando os recursos que temos à disposição para evitar a perda desnecessária de vidas. Vamos vacinar!
* Angélica Nogueira-Rodrigues é oncologista clínica e fundadora do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA)