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O câncer está crescendo entre os jovens. O que precisamos fazer?

Estudo robusto alerta para o aumento da prevalência de tumores entre pessoas da geração X e os millennials. Especialista clama por medidas de reação

Por Carlos Gil Ferreira*
Atualizado em 7 ago 2024, 08h48 - Publicado em 7 ago 2024, 08h02
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  • Cada vez mais jovens são diagnosticados com câncer em todo o mundo. É o que revela um estudo recém-publicado pela revista científica The Lancet Public Health Journal, que mostra um aumento significativo na incidência de casos entre a geração X (1965 a 1980) e os millennials (1981 a 1996). Liderado por pesquisadores da American Cancer Society (ACS), a análise apresentou dados de mais de 23 milhões de pacientes diagnosticados com 34 formas de câncer ao longo de 20 anos, considerando indivíduos nascidos entre 1920 e 1990.

    Os resultados indicaram, entre outros aspectos, que pessoas na faixa etária atual entre 28 e 59 anos têm até três vezes mais probabilidade de desenvolver tumores, incluindo os de intestino delgado, pâncreas, rins e pélvis, em comparação aos chamados baby boomers, aqueles acima dos 60 anos (nascidos entre 1946 e 1964).

    As taxas de mortalidade por tumores de fígado, colo de útero, colorretal e testículos também tiveram elevação entre os X e millennials. Dessa forma, a análise avalia que enquanto as taxas de câncer diminuíram entre as gerações mais velhas, houve uma progressão entre os mais jovens, refletindo as consequências de fatores de risco como obesidade e consumo de álcool.

    Esse aumento é especialmente preocupante entre adultos com menos de 50 anos, escancarando um cenário que ameaça reverter décadas de progresso na luta contra o câncer e projetando um crescimento significativo nos diagnósticos nas próximas três décadas.

    E mais do que isso: a pesquisa traz um alerta relevante para as implicações econômicas e de saúde pública, enfatizando a necessidade de intervenções eficazes para mitigar esses riscos e evitar um ciclo vicioso de saúde precária e dificuldades econômicas.

    Vale lembrar que, de acordo com os números mais recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS), a incidência global de tumores malignos deve saltar de 20 milhões de novos casos (2022) para 35 milhões em 2050, um aumento que equivale a 77%. Além disso, cerca 53,5 milhões de pessoas atualmente estão vivendo com câncer, considerando o período de prevalência da doença no período de cinco anos.

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    Já de acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), só no Brasil são esperados 704 mil novos diagnósticos de câncer em 2024, estando o câncer de pele do tipo não melanoma, mama, próstata, pulmão e colorretal no topo do ranking de mais comuns entre a nossa população.

    Alerta para o Brasil

    A somatória dessa equação serve como um alerta em especial aos países em desenvolvimento, como o nosso, que vêem seus casos de câncer aumentarem exponencialmente ao longo dos últimos anos. Diante disso, as medidas-chave estão nas políticas de conscientização sobre a fatores de risco evitáveis, incluindo melhora no estilo de vida, incluindo combate ao sedentarismo, incentivo ao consumo de alimentos saudáveis e promoção de conhecimento para detecção precoce do câncer.

    Elas são a solução para diminuição dos impactos gerados pela doença em aspectos que extrapolam o debate epidemiológico, devendo ser considerado ainda o impacto dessa realidade nos custos, tanto do ponto de vista financeiro quanto humano.

    E é preciso ir além: o estímulo à conscientização da população em geral sobre como é feita a detecção precoce de tumores, garantindo a disponibilidade dos serviços necessários, que incluem médicos, exames e tecnologias, são pilares que asseguram a descoberta da doença em fase inicial, o que melhora o prognóstico do paciente, com resultados positivos às terapias e maiores chances de cura.

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    Componentes socioeconômicos não podem ser ignorados

    Os dados apresentados pelo Lancet servem como mais um elemento de atenção sobre os impactos dos hábitos de vida da população global nos riscos de surgimento de tumores. Uma outra análise, publicada no início de 2024 pela revista britânica BMJ Oncology, já havia acendido o sinal de alerta sobre o aumento de nos novos casos de câncer entre pessoas com menos de 50 anos, mostrando um crescimento de 79% em um período de três décadas (1990-2019).

    Para entender melhor o panorama, a pesquisa europeia se baseou em dados do Estudo Global Burden of Disease 2019, que avaliou 29 tipos de câncer em 204 regiões de diferentes países. Foram contemplados mais de 1,8 milhões de diagnósticos, tendo sido o tumor de mama o mais incidente, embora os tipos de traqueia e da próstata tenham aumentado mais rapidamente desde 1990.

    Os cânceres que causaram o maior número de mortes e que mais comprometeram a saúde entre os adultos mais jovens foram os de mama, traqueia, pulmão, intestino e estômago.

    Mais de 1 milhão de pessoas com menos de 50 anos morreram em decorrência de tumores em 2019, um aumento de pouco menos de 28% em relação aos números de 1990. Com base nas tendências observadas nas últimas três décadas, os investigadores estimam que o número global de novos casos de início precoce e de mortes aumentará mais de 31% e 21%, respectivamente, em 2030. E, embora o câncer venha sendo progressivamente diagnosticado em pessoas mais jovens, poucos estudos focaram nas importantes distinções regionais e nacionais.

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    Além dos fatores genéticos e hábitos de vida, a doença tem um componente socioeconômico, e o olhar para as diferenças regionais é crítico para sabermos onde precisamos melhorar e para onde precisamos ir. Em muitos locais, a sobrevida de alguém pode ser influenciada por acesso a uma vaga em um hospital, um simples transporte, vacinação ou mesmo uma renda que dê para um suporte necessário em tratamentos mais agressivos, como uma nutrição adequada.

    As estatísticas da OMS ressaltam que, em países de renda baixa a média, como o Brasil, o câncer precoce teve um impacto muito maior nas mulheres do que nos homens, tanto em termos de mortes como de problemas de saúde subsequentes. Isso pode estar conectado, por exemplo, às dificuldades de acesso de exames diagnósticos e conhecimento sobre medidas preventivas simples, como a vacina contra o HPV – a alternativa mais eficaz quando falamos em prevenção ao câncer de colo de útero e que está disponível na rede pública brasileira para meninos e meninas de 9 a 14 anos.

    A mensagem central que deve ser repetida é que o caminho para que possamos frear os riscos de letalidade em decorrência do câncer, invariavelmente, deve passar pelo incentivo à disseminação de informações consistentes e investimentos para garantir a equidade no acesso ao diagnóstico rápido e preciso da doença, assegurando assim o melhor prognóstico para cada caso, com resultados que se refletem em respostas mais positivas às terapias e maiores chances de cura.

    * Carlos Gil Ferreira é oncologista clínico, diretor médico da Oncoclínicas&Co e presidente do Instituto Oncoclínicas

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