A obesidade costuma ser considerada apenas uma condição relacionada ao peso do indivíduo. Porém, diversos estudos comprovaram que a obesidade é uma doença, que junto com outras condições associadas, como o diabetes do tipo 2, traz diversas consequências para a saúde e é a principal causa de mortalidade por eventos cardiovasculares, como infartos e derrames. Ainda recentemente, a pandemia do binômio obesidade/diabetes mostrou ser a principal causa de casos graves ou mortalidade secundárias da Covid-19.
O tratamento da obesidade e do diabetes é inicialmente clínico, com medicações e orientações sobre mudanças do estilo de vida. Entretanto, um número significante de pessoas não consegue a perda ponderal e o controle das doenças associadas. A cirurgia para perda de peso, também chamada de cirurgia bariátrica, é um tratamento seguro e eficaz para a obesidade. Quando temos o objetivo primário de tratar o diabetes do tipo 2, aí está indicada a cirurgia metabólica.
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Existem vários mitos e equívocos sobre seus resultados. Aqui, serão desmascarados alguns dos mais comuns sobre a cirurgia bariátrica e metabólica, das quais as técnicas indicadas são semelhantes.
Mito 1: As cirurgias são extremamente perigosas
Qualquer tratamento médico, seja ele medicamentoso ou não, tem eventos adversos. Embora seja verdade que toda cirurgia tem riscos, os avanços recentes nas técnicas usadas nos procedimentos cirúrgicos reduziram muito as chances de complicações. Estudos demonstraram que o risco da cirurgia bariátrica/metabólica é quase o mesmo de uma cirurgia rotineira da vesícula biliar.
Mito 2: É tudo sobre dieta e exercícios. A cirurgia é desnecessária
Dieta e exercícios são certamente importantes, mas podem não ser suficientes para muitos pacientes portadores de obesidade. Estudos demonstraram que mudanças na dieta e nos exercícios podem resultar na perda de peso, mas mais da metade dessas pessoas recuperará o peso. Quando falamos sobre o diabetes, alguns pacientes não conseguem controlar a doença, mesmo com as medicações mais modernas. Pesquisas com tempo longo de seguimento comprovaram que as cirurgias metabólicas podem controlar o diabetes. E ainda mais, é possível a poderosa combinação de drogas antidiabéticas no pós operatório, visando os melhores resultados para os pacientes.
Mito 3: A maioria das pessoas recuperará o peso e o diabetes voltará
Após a cirurgia bariátrica, os pacientes podem perder até 30% a 35% do peso total em até dois anos de pós operatório. Em estudos com mais de 20 anos de acompanhamento, mais pacientes mantiveram o peso reduzido quando comparados com pacientes que perderam peso sem cirurgia. Isso mostra que a perda de peso a longo prazo pode ser alcançada por meio de cirurgia bariátrica. Em relação ao controle do diabetes, é a mesma coisa. Muitas publicações, com acompanhamento longo, mostraram que aqueles que foram operados têm melhores resultados do que aqueles que mantiveram-se apenas no tratamento clinico.
Mito 4: A cirurgia pode afetar a forma como o corpo absorve vitaminas e minerais
Existem diferentes técnicas de cirurgias bariátricas e metabólicas. Algumas delas podem alterar a maneira como o corpo absorve vitaminas e minerais, e podem ocorrer deficiências. Mas isso não é comum nas duas principais técnicas indicadas no Brasil e no mundo: gastroplastia em Y de Roux e gastrectomia vertical. Esse efeito colateral pode ser evitado com o uso de suplementos após a cirurgia. Os cuidados de acompanhamento para os pacientes após a cirurgia devem incluir testes regulares de seus níveis de vitaminas e minerais, para que qualquer deficiência possa ser tratada. A grande maioria das deficiências são corrigidas com suplementação oral e orientação nutricional.
Mito 5: Você não pode ter filhos após a cirurgia
Mulheres submetidas a cirurgias bariátricas e metabólicas são aconselhadas a não engravidar nos primeiros dois anos após a cirurgia. Um dos motivos é que esses procedimentos visam induzir à perda de peso, ao contrário do que é necessário durante a gravidez. A maioria dos pacientes atinge um platô de perda de peso em torno de dois anos após a cirurgia. Também é importante notar que a perda de peso na verdade leva a taxas de fertilidade mais altas. Já nos homens, a cirurgia melhora os níveis de testosterona.
Mito 6: As seguradoras de saúde não cobrem a cirurgia para perda de peso
Existem várias operadoras de seguros e convênios médicos que cobrem esses procedimentos. Normalmente, o paciente precisa atender a certos requisitos, já estabelecidos há décadas para o seguro cobrir a cirurgia. Para o tratamento da obesidade, a Agência Nacional de Saúde, reguladora das operadoras de saúde, segue os critérios de indicação do Conselho Federal de Medicina (CFM), baseados no índice de massa corpórea (IMC). IMC maior do que 35 kg/m2 com doenças associadas ou com IMC maior do que 40 kg/m2, sem resposta ao tratamento, tem cobertura. Em relação à cirurgia metabólica, várias publicações demonstraram que os resultados não têm relação direta com o IMC e que as operações têm efeitos antidiabéticos independentes da perda de peso. Por isso, desde 2017, o CFM reconhece a utilização da cirurgia metabólica em IMCs a partir de 30 kg/m2. Em 2020, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, começou uma campanha junto à ANS para a inclusão da cobertura da cirurgia metabólica no rol dos procedimentos cobertos pelas operadoras de saúde. O resultado será divulgado em março de 2021.
Mito 7: A cirurgia bariátrica leva ao alcoolismo
Vários estudos mostraram que não há nenhuma ligação clara entre a cirurgia bariátrica/metabólica e o uso de álcool. Entretanto, os pacientes são aconselhados a reduzir o consumo de álcool após a cirurgia, pois os efeitos do álcool podem ser maiores após a cirurgia.
Mito 8: A cirurgia bariátrica/metabólica aumenta o suicídio
Existem muitas mudanças que podem ocorrer como resultado da perda de peso após a cirurgia. Essas mudanças podem ser psicológicas ou emocionais, ou podem até mudar a personalidade de alguém. Alguns estudos mostraram um aumento nas taxas de suicídio após procedimentos de perda de peso, mas esses pacientes tendem a ter condições psicológicas não diagnosticadas antes da cirurgia. É por isso que o rastreamento de problemas de saúde mental antes da cirurgia é tão importante.
Mito 9: A cirurgia bariátrica deixa uma grande cicatriz
No passado, a cirurgia “tradicional” deixava cicatrizes. No entanto, como as tecnologias e técnicas têm melhorado, a maioria das cirurgias são realizadas atualmente por laparoscopia. As cirurgias laparoscópicas são menos invasivas, com pequenas incisões (entre 0,5 e 1,2 cm), com tempo de internação curto (24 a 36h) e rápida volta às atividades normais.
Mito 10: As cirurgias bariátrica/metabólica são saídas fáceis
A obesidade e o diabetes são enfermidades crônicas e progressivas. Não são simplesmente escolhas inadequadas de alimentação ou estilo de vida. Mesmo com a evolução das medicações para controle da obesidade e diabetes, alguns pacientes não conseguem sucesso com os tratamentos clínicos. Quando isso acontece, as cirurgias bariátricas e metabólicas estão indicadas e são as opções mais eficazes e seguras para essas condições.
Uma analogia com a oncologia é importante. Um(a) paciente com câncer de intestino grosso tem indicação cirúrgica, que é a melhor opção para o tratamento da doença. Será a ressecção do segmento de intestino “o mais fácil” para tratar o tumor? Obviamente não! A retirada do trecho de intestino comprometido é a melhor opção! Assim é a cirurgia bariátrica e metabólica. Um tratamento que quando indicado traz os melhores resultados para a perda ponderal e controle das doenças associadas.