Em meio a uma pandemia e a outras ameaças que têm abalado o planeta, um vírus menos conhecido ganhou evidência e fez soar um alarme: o vírus Nipah. Embora ele não seja uma novidade no mundo da infectologia, o surto recente na Índia tem despertado preocupações.
O Nipah foi identificado inicialmente na Malásia, em 1999, quando causou um surto de encefalite entre criadores de porcos. Posteriormente, descobriu-se que os morcegos frugívoros (que se alimentam de frutos), do gênero Pteropus, conhecidos como “raposas voadoras”, eram seus hospedeiros naturais, transmitindo-o a porcos, que, por sua vez, passavam o patógeno para seres humanos.
Desde então, ocorreram vários surtos em Bangladesh, na Índia e nas Filipinas. A partir de maio de 2018, quatro eventos desse tipo foram relatados no estado indiano de Kerala, onde o surto atual acontece.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), outros países do Sudeste Asiático e da África também apresentam risco de infecções pelo Nipah, uma vez que esse vírus foi observado em morcegos que habitam esses locais, entre eles Camboja, Gana, Indonésia, Madagascar, Filipinas e Tailândia.
O vírus pode ser transmitido de animais para humanos, principalmente por morcegos ou porcos, mas também de pessoa a pessoa. A transmissão de morcegos pode ocorrer diretamente ou através de um hospedeiro animal intermediário, como porcos ou cavalos.
Já a transmissão entre humanos ocorre principalmente por meio de contato próximo com fluidos corporais, além de alimentos contaminados e gotículas respiratórias. Isso torna o controle desse vírus particularmente desafiador em áreas densamente povoadas, caso da própria Índia.
Os sintomas variam de febre, dor de cabeça, dor muscular, náusea e vômito a sintomas respiratórios e neurológicos graves, incluindo encefalite, convulsões e coma. A taxa de mortalidade varia entre 40% e 75%, tornando o Nipah um dos vírus mais letais conhecidos. O diagnóstico é complexo, frequentemente confundido com outras doenças febris, o que dificulta o controle precoce dos surtos.
Atualmente, não existe um tratamento antiviral específico. Recomendam-se cuidados de suporte, como repouso, hidratação, medicação para os sintomas, e monitoramento em terapia intensiva para casos graves. A maioria das pessoas se recupera totalmente, embora algumas fiquem com sequelas.
O rastreamento de infectados é fundamental para prevenir a disseminação, evitando contato físico próximo e lavando as mãos regularmente após o contato com doentes.Vacinas e anticorpos monoclonais estão em estudos, visando a prevenção e tratamento.
Nesse momento, o risco de o Nipah se espalhar, levando a uma epidemia ou pandemia, é baixo, mas uma vigilância eficaz é necessária.
Não há motivo para pânico no Brasil; afinal, as “raposas voadoras” não existem por aqui e a transmissão entre pessoas não é tão comum. Porém, a pandemia de Covid-19 nos ensinou que estar preparado para ameaças virais emergentes é essencial para a segurança global. Portanto, as autoridades devem manter o alerta contínuo.
* Leonardo Weissmann é infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e professor da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP) – Campus Guarujá