Bem estratégico é todo aquele fundamental para a economia de um país. São os casos de commodities cuja oferta deve ser assegurada. Não se pode correr o risco de ruptura no seu suprimento doméstico, que seria danoso à segurança e ao desenvolvimento. Exemplos são o petróleo e os demais produtos essenciais ao consumo interno e às exportações, como trigo, soja, carne, minério de ferro e outros. Roma invadiu o Egito Antigo para controlar o comércio de trigo, que representava um terço de suas importações do produto. A escassez de trigo geraria fome, tornando o império insustentável.
O problema é como definir o conceito. Nos países ricos, estratégico tem a ver com o suprimento doméstico. Os Estados Unidos mantêm um estoque de petróleo de cerca de 600 milhões de barris, em sessenta cavernas subterrâneas. O Japão atacou a base de Pearl Harbor (1941), no Havaí, para destruir a frota de navios de guerra ali estacionados. Os militares japoneses temiam que os americanos restringissem o acesso vital ao petróleo de ilhas do Pacífico sob o domínio holandês.
Sob outro ângulo, o petróleo é estratégico por suposto papel no desenvolvimento. Isso era aceito até os anos 1970. Daí a criação, nos países menos desenvolvidos, de empresas estatais para exercer o monopólio da exploração e produção da commodity. Até hoje, quase todos os países emergentes produtores possuem estatais de petróleo. No Brasil, a campanha nacionalista “o petróleo é nosso” fez nascer a Petrobras (1953). Seus ecos a mantêm como estatal. Poucos admitem a privatização.
“As economias baseadas no conhecimento são superiores às de países ricos em recursos naturais”
Como afirmei numa coluna anterior, nenhum dos sete países mais ricos controla estatais petrolíferas. Seus setores privados dispõem de capacidade financeira, acesso a crédito e competência gerencial para atuar na área. Mais importante, o petróleo perdeu a relevância que teve como motor do crescimento econômico.
Como disse o historiador israelense Yuval Harari, nas últimas décadas a “economia global se transformou, migrando de um processo baseado em materiais para outro fundado no conhecimento”.
De fato, continua Harari, as origens anteriores de geração de riqueza, “como minas de ouro e poços de petróleo”, deram lugar ao conhecimento. E prossegue: “É possível tomar à força poços de petróleo, mas não se consegue adquirir o conhecimento dessa maneira”. As vantagens da conquista pela guerra praticamente desapareceram.
Estudos indicam que economias baseadas no conhecimento têm desempenho superior às de países ricos em recursos naturais, embora esses possam contribuir para gerar algum nível de riqueza.
O conhecimento tornou-se o elemento essencial para a inovação, hoje a fonte básica dos ganhos de produtividade. Esses ganhos constituem o principal meio para promover o desenvolvimento.
Precisamos, tal como no caso dos Estados Unidos, entender que bens estratégicos são os essenciais para o abastecimento interno. O desafio para quem ainda acha que o petróleo é um bem estratégico para a geração de riqueza é aprender essa simples lição.
Publicado em VEJA de 16 de março de 2022, edição nº 2780